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DESASTRE DE BRUMADINHO

Seis anos após rompimento de barragem, avanço das indenizações é o desafio

Vale cumpre 75% do acordo de reparação e espera chegar à reta final das compensações diretas às vítimas ao longo de 2025

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Amanhã, dia 25 de janeiro, o rompimento da Barragem I (B1) da Vale S.A em Brumadinho, na Região Metropolitana de BH, completa seis anos. O desastre tirou a vida de 272 pessoas – três ainda não encontradas – e mudou a realidade de 26 municípios atingidos pelos aproximadamente 12 milhões de metros cúbicos (Mm³) de rejeitos que contaminaram as águas do Rio Paraopeba até a Usina Hidrelétrica (UHE) de Retiro Baixo, entre Curvelo e Pompéu, na Região Central do estado. Pelos danos causados, a Vale pagou 8,9 mil acordos de indenização entre cíveis e trabalhistas, no valor total de R$ 3,8 bilhões, que contemplaram 17 mil pessoas incluindo atingidos e evacuados de Brumadinho. Neste ano, a mineradora espera avançar substancialmente nos pagamentos e chegando próximo a um desfecho.

“Estamos chegando à reta final. Não porque acabou, porque existem pessoas que preferem continuar as discussões judicialmente. Entendemos e respeitamos esse desejo. Para quem está disponível e disposto a fazer um acordo, eu acredito que neste ano de 2025 vamos ter um avanço extremamente importante”, afirmou Gleusa Josué, diretora de Reparação da Vale.

Para além das indenizações, em 4 de fevereiro de 2021 foi assinado o Acordo Judicial de Reparação entre a Vale, o governo de Minas, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG). Ficou estipulado o valor de R$ 37,7 milhões divididos entre “Obrigações de Fazer” (quando a empresa paga e executa) e “Obrigação de Pagar”, com ações previstas até o ano de 2030.

Segundo a Vale, um percentual de 75% do acordo já foi concluído, sendo que a maior parte foi executada dentro das “Obrigações de Pagar”. Nessa rubrica, foram alcançados 91% dos R$ 19,9 bilhões a serem pagos. Nas “Obrigações de Fazer”, apenas 39% dos R$ 11,4 bilhões acordados foram executados. R$6,3 bilhões foram pagos antes do acordo ser assinado.


DANOS IRREPARÁVEIS


Tamanho impacto fez com que a comunidade de Córrego do Feijão, a mais afetada, tivesse que se reinventar em meio à dor e à saudade. Muitos moradores deixaram suas casas por perder a fonte de renda ou para se afastar das dolorosas lembranças. Apesar dos acordos e esforços para reparar o dano feito a Brumadinho, há perdas que são irremediáveis. Por isso, o tema deste ano das homenagens da Associação dos Familiares das Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem em Brumadinho (Avabrum) será “Memória irreparável”.

“Muito se fala em reparação, mas tem aquilo que é irreparável. Para nós, familiares, não existe reparação, porque vidas não se reparam. Costumamos dizer que a gente ainda vive no dia 25, que aquele dia não vai acabar enquanto não houver justiça”, afirma Nayara Cristina Dias Porto Ferreira, presidente da Avabrum, que perdeu o marido, o cunhado e vários amigos no desastre.

Nayara apoia as ações de reparação, mas reconhece que a vida não voltará a ser como antes. Ela explica que a vida em Brumadinho antes do rompimento da barragem era pacata e simples. Hoje, a cidade se transformou: está vazia e com o custos de vida mais alto, como aluguel e comida.

Segundo Ferreira, a comunidade que antes era composta por cerca de 800 famílias, hoje não chega a 200. Ela teme pelo futuro de Brumadinho e espera que não se completem sete anos sem que a Justiça puna os responsáveis pelo rompimento da barragem. “Já foram seis anos sem justiça, eu acho que está ficando feio para o Brasil. Será que o Judiciário vai esperar isso acontecer de novo para prender os responsáveis? Porque a gente sabe que tem réus no processo que estão trabalhando em outras mineradoras. Enquanto houver impunidade, o risco pode se tornar recorrente”, argumenta.


BUSCAS CONTINUAM 

Até o momento, 267 vítimas foram encontradas e identificadas. O Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais segue nas buscas pelas três pessoas que continuam desaparecidas para, com isso, trazer o mínimo de paz para as famílias que ainda não conseguiram se despedir de seus parentes. A essas 270 pessoas se somam dois nascituros, que se chamariam Maria Elisa e Lorenzo ao vir ao mundo.

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Segundo a Vale, 88% dos rejeitos já foram manejados. De um mirante instalado na área de buscas, é possível ver o local onde a barragem se rompeu e a área onde o mar de lama atingiu as instalações da mineradora. Hoje se encontram no local 150 caminhões, 40 escavadeiras e 800 funcionários da Vale, atuando em cinco estações de busca que funcionam todos os dias da semana durante 12 horas.

Os rejeitos são recolhidos por caminhões e levados para as estações, onde são coletados pelas escavadeiras e depositados em esteiras. Um bombeiro vistoria todo o material que passa por ali e, a qualquer sinal de material orgânico, documento ou outros objetos, a esteira é parada e o material coletado em envelopes plásticos para serem encaminhados para a perícia. Uma vez que o trabalho exige atenção extrema, cada bombeiro trabalha em turnos de apenas duas horas.

Em caso de chuva, o ritmo das buscas diminui, pois o material passa por uma estação de desidratação, para garantir a qualidade da análise do bombeiro. Depois de passada a triagem, os rejeitos são depositados na cava da mina, de onde originalmente o material foi retirado para mineração. Outros materiais, como ferragens ou concreto, são levados a uma outra instalação para separação e destinação correta. De acordo com a Vale, a mineradora continuará dando apoio nas buscas enquanto o Corpo de Bombeiros permanecer no local.


IMPACTO AMBIENTAL

Área de recuperação ambiental e restabelecimento da biodiversidade,  uma das linhas de atuação da empresa na área afetada pelos rejeitos

Área de recuperação ambiental e restabelecimento da biodiversidade, uma das linhas de atuação da empresa na área afetada pelos rejeitos


Além das mortes, o rejeito deixou um rastro de destruição por onde passou. Cerca de 269,84 hectares de vegetação foram devastados, sendo 133,27 hectares de vegetação nativa de Mata Atlântica e 70,65 hectares de Áreas de Preservação Permanente (APP). Em 2024 foram concluídas as primeiras ações de recuperação ambiental, com 3,69 hectares recuperados, o que equivale a 1,36% de todo o território atingido. O acordo prevê também a compensação ambiental em territórios próximos, devido ao prejuízo provocado. O processo completo de reflorestamento pode levar cerca de 10 anos, e a Vale tem intervenções planejadas até 2030.

A presidente da Avabrum, Nayara, defende que a área deveria se tornar um bosque com passarelas e pontos de homenagem. Uma vez que nem todos os corpos foram encontrados e muitos estavam incompletos, alguns familiares ainda veem o local como ponto referência para se conectar com o ente querido.


BIOENGENHARIA


O processo de recuperação da área atingida se inicia com o término das buscas pelas vítimas e a retirada do rejeito e tem utilizado bioengenharia em parceria com diversas instituições, entre elas a Universidade Federal de Viçosa (UFV), que utiliza a técnica inovadora de indução de florescimento precoce. A partir da coleta de DNA, a iniciativa permite criar cópias das plantas da região de modo a permitir que mudas que levariam mais de oito anos para florescer iniciem esse processo entre seis e 12 meses.

O Remanso 1B, visitado pela reportagem, fica a menos de dois quilômetros do local do rompimento e foi a primeira área recuperada após a liberação do Corpo de Bombeiros. O plano de recuperação foi aprovado no segundo semestre do ano passado, com início em setembro e finalização da primeira fase em dezembro.

Devido à força do impacto da onda de rejeitos, foi também necessária a reconformação do terreno, ou seja, que o pequeno vale onde se encontra o Remanso 1B fosse “reconstruído”. Ali já é possível ver plantas de pequeno porte, gramíneas, girassóis, e um pequeno curso d’água – afluente do Córrego Samambaia. Inicialmente, foram plantadas 35 espécies nativas na região na primeira fase, de recobrimento. A segunda fase, prevista para daqui a 3 anos, contará com a introdução de mais 45 espécies a fim de alcançar a plena recuperação da área.

“A gente já observa o retorno de alguns animais para essa localidade, como peixes, alguns anfíbios e répteis. Então vemos realmente que o processo de recuperação está funcionando e atingindo os seus objetivos”, diz Gustavo Moraes, Gerente Meio Biótico da Reparação da Vale.


ÁGUAS

Construída em maio de 2019, Estação de Tratamento de Águas Fluviais atua na limpeza do Ribeirão Ferro-Carvão: líquido tratado passa por testes antes  de ser devolvido ao manancial

Construída em maio de 2019, Estação de Tratamento de Águas Fluviais atua na limpeza do Ribeirão Ferro-Carvão: líquido tratado passa por testes antes de ser devolvido ao manancial

Fotos: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press


Com o rompimento da barragem, todo o volume de rejeitos seguiu o curso do Ribeirão Ferro-Carvão, onde ficaram depositados 7,8Mm³ de resíduos, até sua confluência com o Rio Paraopeba, atingido por outros 2,2Mm³. A contaminação propagou-se até o remanso da Usina Hidrelétrica de Retiro Baixo. Com isso, o abastecimento de água da população da região foi impactado. A Vale realiza, até hoje, o fornecimento de água potável por meio de caminhão-pipa, a distribuição de água mineral e a perfuração de poços artesianos.

A fim de recuperar também os cursos d’água afetados, a Vale construiu a Estação de Tratamento de Águas Fluviais (Etaf) em maio de 2019. A água do Ribeirão Ferro-Carvão é bombeada para um reservatório, onde recebe a adição de floculantes e coagulantes para que os resíduos sólidos sejam depositados no fundo do tanque. A água ainda passa por um filtro, antes de retornar para o ribeirão que deságua no Rio Paraopeba.

O material sólido é dragado do fundo e depositado em imensas bolsas chamadas geobags, que fazem um processo de desidratação dos rejeitos que, posteriormente, é levado para a cava da mina Córrego do Feijão. O projeto leva em conta a vazão média do rio, de modo que na cheia não tem a capacidade de tratar todo o volume de água nesses momentos. Segundo Vitor Pimenta, gerente de Meio Físico da Reparação, mesmo nesses momentos a qualidade da água fica dentro do padrão de qualidade estabelecido pela legislação. Caso seja detectado que o rio está com uma qualidade fora desse padrão, as autoridades são contactadas.

“Temos monitoramento e fazemos relatórios trimestrais aos órgãos. Contudo, a gente também tem dois equipamentos: um mede a vazão da água e o outro a turbidez, oxigênio dissolvido, quantidade de elétrons, temperatura e pH, de três em três minutos. Essa leitura é enviada para nossa base de dados, então, se tiver alteração ficamos sabendo quase instantâneamente”, explica Pimenta.

Até o momento, a Etaf devolveu mais de 68 bilhões de litros de água limpa e mantém o monitoramento de 80 pontos de controle ao longo do Rio Paraopeba. Todo o processo é acompanhado pelos órgãos fiscalizadores do governo de Minas e Auditoria Socioambiental (Aecom).


RECUPERAÇÃO SOCIAL


Com a tragédia, criou-se um clima de receio entre a comunidade de Brumadinho e a mineração. Por isso, o acordo firmado em 2021 prevê também a diversificação econômica do município e região para diminuir a dependência da atividade minerária. Assim, foram propostos programas de fomento do turismo que valorizassem a natureza, artesanato e culinária local. A iniciativa prevê a criação do catálogo “Céu de Montanhas” – que conta com 39 empreendimentos participantes –, assessoria técnica e capacitação.

Já foram construídos e entregues a Praça 25 de Janeiro, o Mercado Central Ipê-Amarelo, o Centro de Cultura e Artesanato Laudelina Marcondes e duas cozinhas comunitárias. Também há previsão de construção de um novo distrito industrial, em uma área de cerca de 1,2 milhão de m². O projeto está em fase de terraplanagem. O investimento previsto é de R$ 170 milhões.

“Fizemos estudos bem específicos focados em atividades econômicas e pilares importantes que poderiam ser utilizados para essa reestruturação econômica do município. O turismo foi uma atividade muito forte e o distrito industrial é um pilar de atividade econômica que vai ajudar no restabelecimento de arrecadação de impostos”, afirma a diretora.

Nayara, presidente da Avabrum, espera que as ações realmente beneficiem a cidade, uma vez que acredita que a Vale irá encerrar as atividades no município no futuro. “O investimento no turismo precisa ser positivo. O forte da cidade, infelizmente, era a Vale, e acredito que ela não fique aqui. Então, o que a gente vai ter para sobreviver é o turismo. Precisamos fomentar essa atividade porque senão, sinceramente, não sei o que que vai ser de Brumadinho”, analisa Nayara.

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