SURTO

Hepatite A explode em Minas e atinge maior patamar dos últimos dez anos

Minas já ultrapassou em 70% o total de casos de hepatite A registrados no ano passado; essa é a maior incidência da doença no estado desde 2014

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Minas Gerais vive, em 2025, o maior surto de hepatite A —doença que causa uma inflamação aguda no fígado— dos últimos dez anos. De janeiro até 2 de julho, o estado já registrou 373 casos da doença, um salto de quase 70% em relação ao total de notificações de todo o ano passado, que somaram 221 ocorrências, conforme dados da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG). Esse é o maior registro de incidência da doença desde 2014.

Transmitida principalmente pela ingestão de água ou alimentos contaminados por fezes de pessoas infectadas, a doença vem registrando, desde o ano passado, um aumento expressivo no estado. Em 2023, foram 44 casos confirmados, número que saltou mais de 400% no ano seguinte, conforme os dados da SES-MG. Só neste ano, duas pessoas morreram por complicações da doença em território mineiro.
 
A incidência do vírus da hepatite A atingiu o maior patamar dos últimos dez anos em Minas no ano passado e agora já supera esse último recorde, segundo dados do Boletim Epidemiológico de Hepatites Virais, divulgado pelo Ministério da Saúde, na quinta-feira (9/7). O documento apresenta um panorama nacional das hepatites virais, e aponta que, em uma década, Minas saltou de 159 casos da doença em 2014 para 262 em 2024, disparada de 64,7%.
 
 
 
As autoridades de saúde ainda não têm um diagnóstico sobre o que motivou a escalada das infecções no estado. Em Belo Horizonte, onde foi registrado um salto de mais de 2.000% entre 2023 e 2024, um relatório estava previsto para ser apresentado até a segunda quinzena de junho, mas, até o momento, não foi finalizado. A investigação da causa, adiantada pela Secretaria Municipal de Saúde à reportagem em maio, é realizada em conjunto ao Ministério da Saúde.
 
A reportagem cobrou a pasta municipal nesta sexta-feira (18/7) sobre o parecer, mas não houve resposta. O Ministério da Saúde também foi questionado e não respondeu.

De janeiro até 29 de maio deste ano, o município contabilizou 122 casos da doença, conforme dados repassados pela Secretaria Municipal de Saúde. O número ainda é menor do que o registrado no ano passado, quando foram contabilizadas 175 ocorrências. Dados da pasta mostram ainda que entre o primeiro e o segundo semestre de 2024, os diagnósticos da doença ainda saltaram 260,5%. Em uma década, o avanço foi de 372,9%: eram 37 casos em 2014.
 

Perfil alterado

 
Tradicionalmente associada à infância e a regiões com saneamento precário, a hepatite A tem apresentado mudanças no seu perfil epidemiológico. A Organização Mundial da Saúde (OMS) já havia identificado, em 2016, um aumento global de casos relacionados à transmissão por práticas sexuais. No Brasil, o primeiro alerta veio em 2017, quando São Paulo registrou 786 casos e dois óbitos confirmados.

É isso que na avaliação da médica infectologista Janaína Teixeira, da Uniptan Afya, pode estar causando a explosão de casos no estado. “A hepatite A é aquela que a gente está acostumada a ver na infância. Mas, a gente sabe que tem existido alguns surtos, principalmente em pacientes jovens por práticas sexuais de contato anal. Então, por exemplo, o sexo anal ou oral anal, por conta da transmissão da doença ser fecal-oral, aumenta muito o risco. Talvez esse aumento de casos possa refletir essa população”, disse.

Na capital, os dados reforçam essa hipótese, já que a maior parte dos infectados está na faixa etária de 20 a 39 anos, com predomínio entre os homens. No entanto, as autoridades reforçam que ainda não identificaram um fator específico que explique o aumento tão expressivo dos casos.
 
“Não temos nenhum dado preliminar em relação à provável causa ou fator associado a esse aumento do número de casos. Continuamos monitorando, mas somente após a análise do Ministério da Saúde é que nós poderemos realmente atualizar as maiores informações”, disse o gerente da vigilância epidemiológica da Secretaria Municipal de Saúde, Hoberdan de Oliveira, em entrevista ao Estado de Minas, em maio.

Em nível nacional, o Ministério da Saúde ampliou, no início de maio, a vacinação contra hepatite A para pessoas que utilizam a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP), uma medicação preventiva contra o HIV. A medida foi motivada pelo reconhecimento de que, embora a transmissão fecal-oral seja a via predominante do vírus, práticas sexuais também podem aumentar o risco de infecção. A meta é imunizar 80% dos mais de 120,7 mil usuários da PrEP atendidos atualmente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

A introdução da vacina contra hepatite A no Sistema Único de Saúde (SUS), em 2014, foi um divisor de águas no combate à doença no Brasil. Direcionada a crianças de 12 meses a menores de 5 anos, a imunização provocou uma redução expressiva nos casos: de 6.261 registros em 2013 para apenas 437 em 2021, uma queda de 93%. Entre menores de 5 anos, a redução foi ainda mais drástica: 97,3% em uma década. Na faixa etária de 5 a 9 anos, o decréscimo chegou a 99,1%.
 

A doença

 
Um dos maiores problemas das hepatites virais é que são doenças cujos sintomas muitas vezes passam despercebidos, só se manifestando quando a doença já está na forma crônica ou até que haja alguma complicação relacionada. A hepatite A, segundo a infectologista Janaína Teixeira, é a menos agressiva das infecções hepáticas.
 
“Os sintomas, quando elas causam, são muito parecidos. São os olhos amarelos, dor no corpo, febre, dor de cabeça e urina escura. Geralmente a hepatite A é mais sintomática. É uma doença desagradável, mas, ao contrário das outras hepatites virais, ela não evolui para a forma crônica, que é quando o vírus permanece no organismo causando complicações. Por mais que tenha esse aumento do número de casos, a gente sabe que ela é curável, não vai perpetuar a transmissão para outras pessoas”, aponta.

Apesar de ter evolução geralmente benigna, a hepatite A ainda pode levar a complicações severas, principalmente em idosos, portadores de doenças crônicas ou pessoas imunossuprimidas, como as que vivem com HIV. Nessas populações, a resposta imunológica mais intensa pode provocar quadros de inflamação fulminante e até levar à morte.

“O problema da hepatite A é que ela não fica crônica, mas ela pode ser fulminante ou levar a falência aguda do fígado. É raro, mas pode acontecer. Ela pode evoluir para casos em que há comprometimento do fígado e o paciente pode precisar de um transplante”, adverte o infectologista Leandro Curi. De acordo com o Ministério da Saúde, estima-se que apenas 1% dos casos representa risco de morte, quando evolui para hepatite fulminante.
 
 
Sem tratamento antiviral específico, o manejo da hepatite A baseia-se no suporte clínico — hidratação, repouso e alívio dos sintomas. “Por isso, a vacinação e as medidas preventivas são fundamentais”, reforça Curi. A vacina, disponível no Sistema Único de Saúde, é administrada em dose única para crianças de 15 meses até 4 anos de idade. Além da imunização, recomenda-se ferver água, higienizar alimentos e manter práticas adequadas de saneamento e higiene.

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