Raio-x da violência: quais crimes mais preocupam a Região Central de Minas?
Mapeamento sobre ocorrências de 2024 mostra que crack e homicídios trazem apreensão a cidades históricas de Minas. Já municípios maiores sofrem com ladrões
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Siga noAo desacelerar o caminhão perto da saída de um posto de combustíveis, por volta de 6h, Rogério Aleixo, de 49 anos, de Curvelo, município da Região Central de Minas, procurou pelo ajudante de carga e descarga que chegaria de ônibus. Naquele momento, um Volkswagen Gol que passava lento pela rua deu ré. Dois passageiros desceram e apontaram revólveres para o caminhoneiro. “Fiquei apavorado. Pensei que qualquer coisa poderia dar errado e eu acabar morto por causa de uma carga de tecido hospitalar, que depois os bandidos nem quiseram”, conta o motorista, que levou tempo para superar o trauma.
Momentos de pânico como o que ele enfrentou acompanharam outras vítimas de crimes violentos em 2024 na extensa Região Central mineira, como mostra reportagem do Estado de Minas, revelando diferentes aspectos da violência que amedronta populações em grandes cidades. Para esse raio-x da criminalidade , o levantamento contou com a ajuda de especialistas para extrair de ocorrências policiais os motivos, meios e alvos de criminosos nas várias regiões administrativas do estado.
No caso da Região Central, enquanto cidades históricas como Mariana, São João del-Rei, Congonhas e Ouro Preto têm no crack e nos homicídios a principal fonte de preocupação, municípios como Barbacena, Conselheiro Lafaiete, Curvelo e Sete Lagoas, cortados por importantes rodovias como a BR-040, mantêm fluxo de mercadorias e estruturas que atraem bandidos e impulsionam crimes violentos como roubos.
É o que observa em Sete Lagoas a administradora de um posto de abastecimento no interior da cidade, que tem forte produção industrial e grande volume de tráfego de cargas. “No posto da rotatória, no ano passado, chegaram a roubar dinheiro dos frentistas até três noites por semana. As ruas e estradas são longas, escuras e falta, sim, maior efetivo policial para dar segurança”, reclama ela, que pede anonimato, por medo.
Ao considerar os números agregados dos 12 municípios com mais de 50 mil habitantes na região (Barbacena, Congonhas, Conselheiro Lafaiete, Curvelo, Itabira, Itabirito, João Monlevade, Mariana, Ouro Preto, Pará de Minas, São João del-Rei e Sete Lagoas), observa-se que os crimes violentos de forma geral preocupam. Segundo estatística da Sejusp, são ocorrências que envolvem as modalidades tentadas ou consumadas de estupro, extorsão, homicídio (baseado em ocorrências, não em quantitativo de vítimas), roubo, além de sequestro e cárcere privado.
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“Dentro da cidade, os momentos mais perigosos são de manhã e na madrugada”, afirma o caminhoneiro Rogério Aleixo, referindo-se à área urbana de municípios como Curvelo, onde foi assaltado, e Sete Lagoas, entre outros. “É preciso chegar por volta das 5h, para ter local para estacionar e não ficar muito retido no trânsito procurando vaga. É nesse momento de menos luz, de menos movimento e de pouco policiamento, que os bandidos atacam. Mesmo em locais com câmeras, depois que pegam o caminhão, já era. Já dentro dos postos, furtam mais peças da carreta”, conta.
“Em 2023, três bandidos de Betim e um de Nova Serrana esperaram o posto fechar para nos roubar. Trancaram dentro do banheiro o frentista, uma atendente e um motorista de Uber que estava parado. Arrombaram o cofre e tentaram fugir, mas a polícia os perseguiu, trocou tiros com eles e prendeu dois. Foi um pavor, principalmente para quem ficou trancado depois de ter armas apontadas para a cabeça”, conta a administradora de posto em Sete Lagoas.
Entre os 12 municípios da região Central que integram a relação dos mais violentos de 2024, destaca,-se Mariana, com 61.387 habitantes e uma taxa projetada de 27,6 homicídios por grupo de 100 mil pessoas, e Curvelo, de 80.665 habitantes, com 195,8 crimes violentos por 100 mil. No ranking geral, Mariana aparece como o 10º pior município em número de assassinatos e Curvelo como o 11º colocado na soma de crimes violentos.
O diagnóstico
Especialista em inteligência de Estado e segurança pública, o coronel Carlos Júnior consultou pessoal da ativa e ex-chefes ou comandantes de forças de segurança locais para auxiliar na análise da reportagem sobre as dinâmicas do crime. “Municípios como Ouro Preto e São João del-Rei são cidades universitárias, onde as ocorrências mostram haver mercado para o tráfico de drogas. Ao mesmo tempo, há uma vida cultural intensa, também em locais turísticos como Mariana e Congonhas, que demanda policiamento específico para eventos. Sem reforço, ocorre sobrecarga nesses momentos”, afirma.
No caso de Mariana e de Congonhas, o especialista cita, ainda, o grande atrativo de mão de obra externa para a mineração, que faz das periferias dormitórios, muitas vezes sem estruturas sociais e policiamento adequados. “Também nessas condições, o que se vê é um aumento do consumo de entorpecentes e a maior liberdade para o crime se instalar. A disseminação do uso de crack nas cidades históricas também tem impacto direto sobre os índices de criminalidade”, avalia o estudioso.
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A origem
Os índices da reportagem foram gerados a partir de levantamento com recortes regionais, feito pela equipe do Estado de Minas com consultoria de analistas de segurança pública. Foram usados dados de 2024 da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) sobre crimes, correlacionados com a demografia dos 72 municípios mineiros com mais de 50 mil habitantes, conforme o censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).