Ginecologista Ana Valadares

Ginecologista Ana Valadares Ana Valadares é especialista em climatério há mais de 20 anos, com pós-doutorado

Gladystone Rodrigues/EM/D.A Press

A  saúde da mulher ainda é um labirinto permeado por desinformação que não poupa profissionais e, por consequência, as principais interessadas. O desconhecimento abrange em especial o climatério, envolto também em preconceitos, tabus e vergonhas diversas. A ignorância é tanta que climatério e menopausa sequer são diferenciados em suas singularidades e, portanto, tratados em suas individualidades.

As conclusões são de uma das principais pesquisadoras brasileiras em climatério, Ana Valadares, ginecologista e pós-doutora pela Universidade de Campinas (Unicamp), que acaba de voltar de um congresso nos Estados Unidos, onde especialistas em saúde da mulher se reuniram para debater e trocar experiências relacionadas ao climatério.


Ana também é professora de pós-graduação em climatério pela Universidade de Campinas (Unicamp), em São Paulo, e coordenadora do Serviço de Climatério dos Ambulatórios Especializados da Santa Casa BH.


A unidade hospitalar abriga um dos dois únicos ambulatórios voltados para a saúde da mulher, em Belo Horizonte, com atendimento exclusivo pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O outro ambulatório, ligado ao Hospital das Clínicas, vinculado à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), está em seus primeiros passos para o atendimento das pacientes.


Você sabe a diferença entre climatério e menopausa?

O climatério, que ocorre em torno dos 45/50 anos, é o momento em que a mulher sente sinais clássicos, como calor, enjoo, ganho de peso, suor e mudanças de humor. Depois de 12 meses ininterruptos sem menstruação, a mulher inicial a menopausa, o que significa dizer que é o fim de sua vida reprodutiva. 



Ana esclarece que a abordagem médica durante o climatério tem que envolver a saúde da mulher de forma global. "Hábitos de vida, a questão das doenças que aparecem nessa fase, os medicamentos que ela usa e, por último, a indicação ou não da terapia de reposição hormonal. Não tratamos o climatério só com a reposição de hormônios", explica a médica.

Ela recomenda que esse procedimento deveria ser a conduta de médicos em geral e adotada como regra para garantir a qualidade de vida da mulher.

A médica detalha a chamada 'falência ovariana', ou seja, o início do climatério com os sintomas iniciais, consequentes da queda de produção hormonal: inicialmente ocorrem os ciclos menstruais irregulares, ondas de calor, distúrbios do sono, nevoeiro cerebral e irritabilidade.

"As principais consequências a longo prazo são a osteoporose (perda progressiva de massa óssea) e a síndrome geniturinária (resposta à perda de estrogênio da menopausa), que pode provocar coceira, ardor, infecção urinária recorrente, dor na hora de fazer xixi, secura vaginal e dor na relação sexual", diz.

Segundo a médica, em casos em que há apenas sintomas geniturinarios, é possível tratar os sintomas com hormônio local, por meio de cremes de uso vaginal de estrogênio e hidratantes vaginais. O uso dessa medicação pode ser indicada até para as  pacientes com mais de 60 anos, tendo em vista que o hormônio não é reabsorvido pelo organismo.

A prescrição, ensina a especialista, da reposição hormonal via sistêmica (oral, com gel ou adesivos) tem contraindicação para pacientes maiores de 60 anos ou, então, com mais de 10 anos de pós-menopausa.

A data limite é explicada em função do envelhecimento natural das artérias com o passar dos anos."Sem o hormônio, esse envelhecimento ocorre mais rápido. Assim, uma mulher que nunca usou hormônio (depois dos 60 anos) e na hora que começa (a reposição), o que vai acontecer com essa placa?  Pode desestabilizar e provocar um infarto ou um AVC (acidente vascular cerebral)", ensina.
 
A médica disse também que uma mulher em tratamento antes da data limite não deve, necessariamente, parar a terapia hormonal após os 60 anos. "Sempre vamos colocar na balança os benefícios e os riscos", comenta.

'Janela de oportunidade'


Ana também enfatiza que feita a avaliação global da saúde da mulher, com um profissional especializado em climatério, é importante a paciente ser informada que há uma 'janela de oportunidade' para a reposição hormonal.

Em sua maioria, esse período ocorre entre os 50 e 60 anos. Ou então, em caso de menopausa prematura (antes dos 40 anos), a terapia sistêmica deve ser iniciada o mais rápido possível. E, de acordo com a médica, deverá ser mantida pelo menos até os 52 anos, se não houver contraindicação. "Isso ajudará na saúde cardiovascular, saúde óssea, função cognitiva e saúde genitourinaria", acrescenta a médica.

Reposição hormonal até quando?


Ana responde que "até a próxima consulta". A resposta serve de deixa para outra observação da médica: toda mulher precisa sempre ser avaliada clinicamente e também por meio de exames periódicos, indicando que a avaliação clínica deve ter periodicidade anual, caso não haja nenhuma intercorrência antes da próxima consulta.

Além disso, para uma vida saudável, a prescrição médica para qualquer fase da vida e independentemente de gênero: "se a mulher chega no climatério e não está com hábitos de vida saudáveis, acende-se um sinal amarelo para que comece a prestar atenção em ter um vida boa".

A recomendação inclui exercício físico, largar vícios prejudiciais à saúde, com ênfase no tabagismo, passando pela alimentação balanceada, controle da pressão arterial  (principalmente para aquelas que têm histórico de hipertensão arterial na família) e monitoramento da glicemia e do colesterol.

A atenção para essa prescrição da médica, ela reforça,  evita principalmente infartos fulminantes nessa fase da vida. "A principal causa de morte da mulher no Brasil e no mundo, não é câncer de mama, mas doença cardiovascular", disse.

Sequelas e saúde mental


A especialista em climatério destaca que a falta de atendimento adequado à saúde da mulher traz também 'sequelas emocionais e psicológicas'. Ela explica que profissionais minimamente formados podem levar pacientes a círculos viciosos cheios de patologias, muitas vez tornando-se doenças crônicas.

"Por que muitas vezes quando a mulher está nessa fase da diminuição da produção hormonal, os vários distúrbios já mencionados podem ser um gatilho para a depressão. O que acontece? Geralmente, a mulher  vai ao posto e o que alguns médicos fazem? Prescrevem  antidepressivo", afirma. "O uso do antidepressivo pode até ser indicado, mas não é a primeira escolha. É que, muitas vezes, ele não trata a causa e, além disso, pode piorar o desejo sexual (um dos sintomas no climatério), que é também um dos efeitos colaterais do medicamento para depressão, piorando assim a já delicada condição emocional da paciente."
 

Longevidade


Com o aumento da expectativa de vida da população,  a médica alerta que o temor de muitas mulheres com o climatério deveria ser suplantado pela "oportunidade para cuidar da saúde na segunda metade da vida".

"A longevidade está aí e o climatério começa por volta dos 40 anos. Então, se a mulher se cuida durante toda a vida, vai ter um envelhecimento muito melhor", avalia.

Ana aproveita para reiterar que em pleno século XXI  e com o avanço da ciência, está na hora de mudar essa realidade. "As pessoas acham que sabem (sobre climatério e menopausa) mas, na verdade, sabem pouco. Principalmente, as mais interessadas." Muitos homens acham que a mulher na menopausa deixou de ser interessante. Ao contrário, nessa fase da maturidade, a mulher pode viver melhor e plenamente", garante a especialista.