Em meio às discussões sobre o novo contrato do transporte público de Belo Horizonte, tendo em vista que a atual concessão vence em 2028, o movimento em defesa da tarifa zero nos ônibus da capital mineira acredita que o sonho está mais perto do que nunca.

O projeto de lei que tramita na Câmara Municipal e estabelece a gratuidade para todos os passageiros recebeu parecer favorável pela Comissão de Mobilidade Urbana. Agora, vai ser analisado pelas comissões de Administração Pública e de Orçamento, antes de ir ao plenário.

Na última terça-feira (3/6), um seminário realizado na Escola de Arquitetura da UFMG recebeu pesquisadores e gestores de transporte em um debate acerca dos impactos que o fim da cobrança de tarifas nos ônibus pode trazer para a cidade. O principal exemplo aventado na reunião foi o de São Caetano do Sul, na Região Metropolitana de São Paulo, onde o sistema de transporte público vivenciou um aumento expressivo na demanda após zerar as tarifas, em novembro de 2023.

O gestor de mobilidade no município, Marcelo Pante, conta que a expectativa durante a implantação do sistema era de que o número de passageiros transportados na época, 22 mil por dia útil, aumentasse em 50% com as catracas liberadas. Contudo, a demanda quase quadruplicou, e hoje são transportados cerca de 80 mil passageiros por dia útil.

O gestor elenca ainda outros resultados visíveis pela cidade, como o aumento da lotação dos parques aos fins de semana e o monitoramento do trânsito na cidade, onde os congestionamentos, que vinham numa crescente, estabilizaram a partir do momento que a passagem deixou de ser cobrada nos ônibus. “O aumento da demanda mostra que pessoas que não tinham acesso ao transporte que começam a utilizar. Na economia, a gente percebeu um aumento da atividade econômica e na arrecadação dos impostos”.

Quem paga a conta

O seminário foi mediado pela vereadora Iza Lourença (Psol), autora do Projeto de Lei (PL) 60/2025 que visa instituir a Tarifa Zero em Belo Horizonte, assinado por outros 21 parlamentares. O número ainda é insuficiente para a aprovação do texto no plenário, pois é necessário dois terços dos votos dos vereadores, ou seja, 28. O principal impasse para a aprovação, no momento, é sobre como financiar o sistema com o fim das cobranças diretamente aos passageiros.

As centenas de cidades pelo país que zeraram tarifas escolheram formas diferentes de custear o sistema. O modelo apresentado no PL levado à Câmara estabelece um fundo municipal com recursos do Poder Público e de uma nova Taxa do Transporte Público (TTP), paga por empresas sediadas em Belo Horizonte com mais de dez colaboradores.

A instituição desta taxa substituiria o vale-transporte e traria economia para pequenas empresas, justificam seus defensores. Para empresas maiores, o custo seria de R$ 168,82 mensais por empregado. A “mágica” para zerar a tarifa é que essa taxa para o transporte público seria cobrada também dos empregados que não utilizam os ônibus para trabalhar.

A arquiteta e urbanista Heloant Abreu, também pesquisadora dos impactos da tarifa zero em cidades pelo país, explica que o transporte público gratuito traz benefícios em diversas esferas, como na saúde, com pessoas mais pobres podendo usar o transporte público para chegar hospitais e postos de saúde; e no meio ambiente, com a diminuição de deslocamentos por carro particular. “O custo de investir no transporte público vai ser tão maior do que todos os outros custos que são investidos em benefício do automóvel, como alargamento de ruas e viadutos”.

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Outro exemplo citado no seminário foi o de Kansas City, nos Estados Unidos, que passou a financiar o transporte público inteiramente com recursos municipais, estaduais e federais, além de impostos criados especificamente para custear a mobilidade urbana. “Foi muito fácil convencer as pessoas. Quem usa [o transporte público] não precisa pagar e quem não usa gosta que seja de graça, porque isso retira carros das ruas e reduz o trânsito”.

Na capital

O diretor de planejamento e economia dos transportes da Superintendência de Mobilidade de Belo Horizonte (Sumob), Gustavo Fonseca de Oliveira, explica que o aumento de demanda, experimentado pelas cidades que implantaram a tarifa zero, pode exigir maior aporte no orçamento. “A gente não consegue saber de fato o real impacto que isso traria para o município em termos de precisar de mais viagens, de mais ônibus ou mais motoristas. Hoje, a gente não consegue ter nenhuma ‘gordura’ para investir mais no transporte. O dinheiro que vem da tarifa e o que vem do Executivo foi previsto ano passado”.

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O urbanista Roberto Andrés, organizador do seminário, defende que a questão orçamentária seja discutida e superada, tendo em vista os impactos já demonstrados nas 135 cidades brasileiras que implantaram a tarifa zero. “Todas essas melhorias apontam que é uma política possível e que pode trazer benefícios para a população. E acho que a população de Belo Horizonte quer a gratuidade, pela grande mobilização em torno dessa pauta”.

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