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MOBILIDADE URBANA

Sucateados, articulados do Move viram problemas para passageiros e empresas

Veículos quebram constantemente, prejudicando passageiros e empresas. Concessionárias estudam substituição por ônibus novos, mas com capacidade 44% menor

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Princípio de incêndio em um ônibus articulado do sistema Move de Belo Horizonte no primeiro dia de abril expôs, mais uma vez, o sucateamento desses veículos, em operação por mais tempo do que o previsto quando comprados em 2014. É corriqueiro esses ônibus quebrarem nos corredores das avenidas Antônio Carlos e Cristiano Machado, paralisando viagens. Empresas estudam substituir os articulados por ônibus novos, mas com capacidade até 44% menor – o que ameaça causar ainda mais transtornos para os passageiros, que já enfrentam veículos lotados nos horários de pico.

A situação está tão crítica que alguns dos articulados em pior estado foram encostados nas garagens e transformados em doadores de peças para consertar outros veículos, menos piores, e mantê-los em operação. Diariamente, cerca de 30 articulados do Move deixam de rodar, seja para passarem por manutenção, seja por não terem condições de ir para a rua, aponta levantamento feito pela reportagem. Isso representa um em cada seis ônibus, entre os 189 articulados da capital. O levantamento do EM considerou dados do site da Superintendência de Mobilidade (Sumob), acessados por meio de ferramentas que registram a frota empenhada em cada linha, acompanhadas pela reportagem por dois dias consecutivos.

A diarista Vânia Soares, de 48 anos, usuária frequente da linha 66 (Estação Vilarinho/Centro/Hospitais), é uma das passageiras prejudicadas por essa insuficiência da frota. Isto porque entre os horários diretos da linha, a viagem prevista para as 18h20, em pleno horário de pico, costuma não ser feita, relata a diarista. “O pessoal fica aqui e o ônibus não passa, morre o horário. Então, (os usuários) precisam esperar até as 19h15, que é o próximo horário”, diz.

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Vivenciando este transtorno diariamente, Vânia acredita que a troca dos articulados da linha por ônibus menores pode piorar, ainda mais, a rotina enfrentada pelos passageiros. “Essa ideia é horrível. Porque os ônibus grandes, articulados, já vão sempre cheios, imagine então com pequenos”, avalia.

O fato de a frota de articulados não estar completa tem tornado a operação problemática, com escalas apertadas e viagens que deixam de ser cumpridas. Fontes ouvidas pela reportagem contam que os articulados têm quebrado com tanta frequência que as empresas estão tendo prejuízos por deixar de receber os valores das passagens quando as viagens não são realizadas e com os consertos, bem mais caros neste tipo de veículo.

coletivos em empresa de bh: Diariamente, cerca de 30 articulados deixam de rodar por estarem em manutenção ou sem condições de sair à rua
coletivos em empresa de bh: Diariamente, cerca de 30 articulados deixam de rodar por estarem em manutenção ou sem condições de sair à rua Marcos Vieira/EM/D.A Press


Alta capacidade

Os ônibus articulados entraram em operação em 2014, durante a implantação do sistema Move. A adoção do modelo foi pensada para comportar o alto volume de passageiros das regiões de Venda Nova, Pampulha, Norte e Nordeste que, até então, seguiam em ônibus diretos para o Centro, e, a partir daquele momento, passaram a fazer baldeação nas estações de integração antes de seguir viagem. A princípio, esses veículos poderiam rodar por até 10 anos, mas um decreto da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), publicado em 2023, permitiu que a vida útil dos ônibus da cidade fosse estendida para até 12 anos.

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Enquanto um articulado de 18 metros carrega em torno de 125 passageiros, os ônibus menores do sistema, chamados de BRT Misto, com 13 metros, transportam até 70 pessoas – são 55 a menos. Em outra comparação, para transportar a mesma quantidade de passageiros que 10 ônibus articulados, são necessários 17 veículos do modelo menor.

A utilização de ônibus de menor capacidade em um sistema BRT, especialmente em linhas de maior demanda, afeta o usuário para além da quantidade de passageiros por veículo, explica o professor André Leite Guerra, do Departamento de Engenharia de Transporte do Cefet-MG. “Isso pode resultar em tempos de espera maiores nas estações, já que menos passageiros conseguiriam embarcar por viagem, gerando filas mais longas e impactando negativamente a experiência dos usuários”, detalha.

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O professor explica que para um sistema de transporte coletivo ser eficiente é necessário que sejam utilizados veículos de maior capacidade nos corredores de alta demanda, como é o caso das avenidas Antônio Carlos e Cristiano Machado. “O veículo empregado em uma linha de ônibus deve ser compatível com a geometria das vias por onde trafega. E em BH, as vias por onde os ônibus articulados circulam são compatíveis com esses veículos. Sem veículos de grande porte, a eficiência e a qualidade do serviço podem ser comprometidas”, defende.


Ainda sem solução

O fim dos ônibus articulados no transporte coletivo de Belo Horizonte é uma tendência entre as empresas, e que começou no sistema BRT metropolitano, onde os empresários donos de quase toda a frota também são muito influentes no Move da capital. Tanto que parte dos novos ônibus metropolitanos adquiridos com recursos do governo estadual são justamente modelos comprados para substituir os articulados. A justificativa dada pelo governo na época da chegada desses veículos é de que os articulados têm dificuldades para fazer manobras como curvas fechadas e conversões, especialmente fora dos corredores do Move, onde os ônibus dividem espaço com motos e carros de passeio.

No caso da capital, essa mesma alegação é levantada, junto a outras. Como vai haver uma nova licitação do transporte coletivo de Belo Horizonte em 2028, os empresários têm medo de adquirir articulados novos faltando tão pouco tempo até o fim do atual contrato. E, diferentemente dos ônibus comuns, que contam com um grande mercado de revenda, articulados usados são, em sua maioria, vendidos para desmanche por valores irrisórios – o que impacta diretamente na depreciação, um dos fatores do cálculo da tarifa.

De acordo com o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (SetraBH), a substituição dos articulados representa um desafio, devido ao alto custo de aquisição e a proximidade do término dos contratos. “Está sendo discutido, com base em estudos técnicos e em conjunto com a Prefeitura, como será feita a substituição dos articulados, especialmente nas linhas com maior impacto viário, considerando inclusive a adoção de veículos menores, mais adequados e eficientes para essas rotas”, informou o sindicato.

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Recentemente, os empresários desativaram alguns articulados e colocaram ônibus menores para circular nas respectivas escalas, o que foi logo proibido pela Superintendência de Mobilidade Urbana (Sumob). Ainda assim, foi feita a retirada dos articulados que reforçavam a operação das linhas 5250, 64, 67 e 6350 – hoje, esses veículos estão restritos às linhas de maior demanda.

Adicionalmente, outra questão que está na mesa é sobre o que será feito entre o fim do período que os articulados podem rodar, em dezembro do ano que vem, e o início do novo contrato de concessão. Para implementar a alternativa de substituir os atuais 189 articulados por veículos menores seriam necessários 321 ônibus comuns. O consumo de combustível dessa nova frota seria tal que a economia de emissões dos 100 ônibus elétricos anunciados pela Prefeitura de Belo Horizonte para 2025, e que não têm prazo para chegar, seria insuficiente para compensar a poluição gerada pela frota a diesel maior.

A reportagem perguntou à PBH se há previsão para renovação ou substituição dos articulados, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.

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