(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas ENTREVISTA COM ALEXANDRE KALIL

Kalil sobre a COVID-19: 'Estamos em guerra. Só que não tem bomba. A guerra é invisível'

Ao criticar o uso político da pandemia, prefeito de BH anuncia testes em massa


postado em 02/07/2020 06:00 / atualizado em 02/07/2020 01:29

'Eu tenho que acreditar que Deus me deu essa missão', disse Kalil sobre gestão de BH em ano de tragédias causadas pela chuva e de uma pandemia sem data para acabar(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
'Eu tenho que acreditar que Deus me deu essa missão', disse Kalil sobre gestão de BH em ano de tragédias causadas pela chuva e de uma pandemia sem data para acabar (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
Em um ano que se iniciou com a expectativa de reeleição na Prefeitura de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD) analisa o turbilhão enfrentado na capital em 2020 - tragédias causadas pelas chuvas nos primeiros meses e, desde março, a pandemia do novo coronavírus – como um desafio lhe facultado. “Eu tenho que acreditar que Deus me deu essa missão”, diz. Enérgico ao se recusar a comentar política durante a crise da saúde pública, o chefe do Executivo municipal classifica opositores como “parasitas do vírus”. “Se você pensar em trocar uma vida por um milhão de votos, você não é um rato, você é uma barata”, afirma.

Pressionado pela possibilidade de colapso do sistema de saúde pública, com a crescente taxa de ocupação dos leitos destinados à COVID-19, o prefeito garante que Belo Horizonte vai ampliar sua capacidade de testagem – um dos principais gargalos da administração da Saúde municipal durante a crise. Ao mesmo tempo, critica a postura do governo Bolsonaro (sem partido) durante a pandemia: “Ele errou e errou feio”, avalia. Críticas a Zema (Novo) também não faltam, acusando-o de manter um gabinete do ódio no Executivo estadual. Quanto aos prazos para reabertura do comércio, a possibilidade de lockdown e a volta às aulas, o prefeito é irredutível. “Quando que volta é coisa de astrólogo. Vocês vão repetir a data até quando? Os números é que vão falar”.

Pandemia da COVID-19

Como têm sido os seus dias em 2020? Primeiro, as chuvas de janeiro e fevereiro que arrasaram a cidade. Em março, começou uma pandemia sem previsão de terminar. Já houve um dia mais difícil ou acha que esse dia ainda está por vir na gestão da cidade?



Não sei, sinceramente não sei. Sei que é uma hora que muita gente que tem muito mais fé do que eu, me diz o seguinte: ‘Deus te escolheu para enfrentar isso’. Então, se fui escolhido para enfrentar essa pandemia e a destruição da cidade, que já está reconstruída, graças a Deus - o bom é isso, porque o pessoal até esqueceu que essa cidade foi destruída - isso quer dizer que fui escolhido. Então, eu tenho que acreditar que Deus me deu essa missão. E eu vou me apegar a ele, junto com a medicina, a probabilidade, a estatística, a matemática, para tentar passar da melhor forma possível por esse período muito duro que estou passando.

De um lado, comerciantes que querem a reabertura. A CDL-BH até soltou uma nota contestando tecnicamente o fechamento do comércio. Do outro, boa parte da população defende o isolamento com medo do avanço da doença. Como é conviver com essa pressão dupla, ainda mais num ano de eleição?



Eu estou com 61 anos de idade. Já fiz muita coisa na minha vida, muita coisa certa e muita coisa errada. Agora, se você pensar em trocar uma vida por um milhão de votos, você não é um rato, você é uma barata. Então, o que acontece é o seguinte: esse assunto, tenho dito, que agora apareceram os parasitas do vírus, e da morte, e da tragédia. Então, eu não admito que a minha cabeça pense um negócio desse. Eu acho abominável, acho pior que roubar na saúde. Estamos mexendo com vida. Tem que pensar que vou tomar atitude aqui, e chegar um cara perto de mim e falar assim: ‘Você foi o culpado pela morte da minha mãe’.  Eu nao tenho idade para aguentar mais esse tipo de coisa. Isso eu não vou levar nas minhas costas, definitivamente.

Eu acho, sinceramente, como eu não gosto de placa, nunca pus uma placa no Atlético, nunca pus uma placa em nada aqui na prefeitura, inaugurei um monte de coisa aqui, mandava abrir viaduto que eu construí, mandava abrir posto de saúde que eu construí, nunca fui nem visitar o posto de saúde pronto. O próprio Hospital Odilon Behrens, que teve aquela ampliação, o Cabana, eu nunca fui lá para ver. Acho que nós estamos perdendo… E por isso que eu disse que não acredito numa humanidade melhor, sabe? Acho que infelizmente isso tudo que está passando não vai adiantar.

Em geral, para se constatar mais claramente os efeitos da abertura de uma cidade o prazo é de 14 dias. Então, em tese, o mesmo se aplicaria para o fechamento da cidade? Ou seja: BH vai ficar pelo menos 14 dias fechada (até 12/7)?



Cravar, não. Porque o índice, o R0, que eles chamam, que é o índice de contaminação, ele é muito importante nesse número. Nós temos aí três pilares para abrir: a contaminação, ocupação de leitos de UTI e as enfermarias. Então, se esse velocímetro baixar muito...porque é desconhecido.

Eu vou dar um dado para vocês. Quando fechamos a cidade, nós tínhamos 82 UTI’s. Hoje, temos 301 e mais 14 que colocamos hoje, e vamos ter 327 depois de amanhã (quarta). Nós tínhamos 114 enfermarias. E hoje nós temos 1.009. Em julho, nós vamos abrir mais 209 leitos de UTI e 263 de enfermaria. Então, prestem atenção. Nós não estamos mexendo com crescimento geométrico, estamos mexendo com crescimento exponencial. Essa matemática é que ninguém está entendendo.

Porque temos problema que ninguém notou que se chama ‘gente’. Ser humano, atendente, enfermeira, fisiologista, fisioterapeuta. Respirador não salva ninguém não, o que salva é médico, enfermeira, atendente. Falaram em respirador, respirador, respirador. E o médico? Eu tenho um filho e duas noras médicos. Quer dizer, só dos seis casados lá em casa, a metade é médico. Um médico que tem mestrado, estudou nos Estados Unidos, meu filho, que é ortopedista, eu não tenho nada com isso, fez, aconteceu, só para ele ser intensivista ele tem que fazer um curso de três anos. O anestesista, que é especialista em intensivismo, normalmente ele tem o seu entubador. Então, esqueceram que falta gente.

O hospital está fechado não é porque eles querem que fique fechado não, é porque não tem material humano, não tem gente. E nós preparamos a rede e debatemos muito o hospital de campanha de Belo Horizonte, porque o grupo que gere os hospitais de Belo Horizonte nos avisou o seguinte: ‘Não vai ter gente (para trabalhar lá)’. Nós temos que contar com a nossa rede e já temos em negociação redes particulares, porque lá tem recheio.

O número é o seguinte: quanto custa construir o Hospital do Barreiro? R$ 120 milhões. A cada cinco meses de funcionamento do Hospital do Barreiro você pode construir um. Então, esqueceram só de um detalhe: do recheio (profissionais da saúde). ‘Ah, te dou um hospital’. Muito obrigado. Hospital eu construo, hospital deixa comigo. Quer me dar uma escola? A construção é minha, que é a merreca. Recheia ele (de profissionais da educação) pra mim. Põe gente lá dentro, põe professora, põe diretora, põe servente, põe quem limpa, põe porteiro, aí eu quero a escola.

A postura de prefeitos, que estão na luta direta contra a doença, é muito diferente da postura do presidente Jair Bolsonaro. Como o senhor avalia o comportamento do presidente nessa pandemia, sem usar máscara, sem dar o exemplo?



Ele errou e errou feio. E agora está gastando uma fábula. Se ele assumisse a liderança firme no país, talvez ele tivesse gasto a metade do que gastou, que está gastando e que vai gastar. É um erro duplo. Quer dizer, está fazendo agora um trabalho enorme, e tem que ser reconhecido como uma despesa gigantesca que o país está tendo, e negou. De repente, se calou porque, diante de 60 mil mortes, nao tem argumento que aguente.

Então, o que eu acho que o presidente errou é que ele teve compromisso com o erro. E como Juscelino Kubitschek dizia: 'A gente não tem compromisso com o erro. Errou, volta atrás'. E eu entendo porque eu estudei, eu entendo porque participei (das reuniões), porque eu aprendi. Nunca passou pela minha cabeça, e eu não acredito que vocês saibam disso, que não existe virologia sem matemática. Eu aprendi - até porque o almoço da minha casa, de seis, três são médicos, e meu filho é cirurgião ortopédico - você chega e fala assim: ‘Ô pai, um leito pós-operatório, um leito intensivo, precisa de seis profissionais. Na verdade, são 13 para cada dois leitos. São seis por cada leito. ‘Ah, porque não abre o hospital’. Não abro hospital porque nao vai abrir. Porque não há mão de obra. Não há mão de obra.

Se você falar comigo assim: o que faria? Trago os cubanos de volta. Se você falar isso com médicos brasileiros, os médicos dão um ataque. Inclusive meu filho e minhas noras. Eles dão um ataque. Mas é melhor que nada, é melhor que nada.

(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)


O senhor falou em possível convênio com a rede particular. Poderia detalhar essa possível parceria durante a pandemia?

Não, não posso detalhar porque estamos negociando. Até esta quinta-feira (dia 2/7), nós vamos...E outra coisa: é dinheiro público. Nós vamos usar na saturação, porque, se der tempo de a gente abrir esses 209 leitos que estão programados (na rede pública), com recheio (profissionais da saúde), nós não precisaremos (da rede particular). Com fechamento da cidade, deve cair a taxa de ocupação (dos leitos). Isso é probabilidade estatística, matemática. 

Então, a contratação de mais profissionais de saúde também está programada?

Nós contratamos em três anos 13.500 profissionais da saúde de ponta. E esse ano, para esperar a doença, 852 médicos, 900. É só conferir com a secretaria de Saúde. Fizemos um sistema robusto. A prefeitura de Belo Horizonte gastou em 2019, que teria que gastar por lei 15% na Saúde, nós gastamos 27,7% do orçamento da prefeitura.

Você não ouviu, em três anos e meio, faltar um remédio. Você não viu um escândalo, não ouviu nada em três anos e meio. Então, temos uma equipe, nós fazendo uma reunião quinzenal, só para tratar do gasto da saúde. Participa Planejamento, o secretário de Saúde, o prefeito, item por item, parafuso por parafuso que vai comprar. O que aconteceu com isso? O diabético foi medicado, o cardiopata foi medicado, o hipertenso foi medicado. São fatores que aconteceram na cidade para que esse número não chegasse ao que chegou em Rio e São Paulo.

Nós não estamos falando de uma cidade do tamanho de Uberlândia, não, estamos falando de uma cidade de 3 milhões de habitantes. Ah, e na hora de ajudar, nós tínhamos aqui em Belo Horizonte o cadastro da pobreza. Nós sabíamos onde é que eles (pobres) estavam, graças ao cadastro único nosso. Inclusive em ocupação. Nao é vila, favela e aglomerado, não, é ocupação. Foram quase 800 mil cestas básicas distribuída, gente. São 150 mil kits de higiene, mais de um milhão de marmitex em restaurante popular. Houve um preparo da cidade. Não quero protocolo, protocolo não vai resolver meu assunto, não. Protocolo não mata a fome do aluno que vai à escola só para merendar não. Ele tem que receber uma cesta básica, ué?

O senhor abriu a cidade em 25 de maio porque disse que “os indicadores deram uma janela, foi dada essa oportunidade para que BH reabrisse”. A culpa é realmente das pessoas? Um estudo da UFMG mostra que transporte público é o pior lugar para se estar durante a pandemia, o mais fácil de ter contato com o vírus. Mas, com 92% dos empregos ativos, como era o caso de BH até semana passada, é natural que o transporte público encha, que a população obrigatoriamente esteja ali. A culpa não seria mais do sistema do que das pessoas?

Existem dois transporte público. Um é largado, que é o intermunicipal. Esses vieram abarrotados de gente.

A culpa, então, é das pessoas?

Não, a culpa é do vírus. Nós temos que parar de achar culpado. A culpa é do vírus. Agora, se não há um entendimento que nós estamos em guerra, e guerra acontece. Você muda a estratégia. Quando nós abrirmos a cidade, nós aumentamos os ônibus. Imediatamente. O problema é que nós estamos em guerra. Só que não tem bomba, a guerra é invisível. Não tem tiro. Você está na sala da sua casa - um virologista falou isso pra mim -, você mora em uma casa, tá? Lá em frente ao Banco Mercantil. E o tiro está comendo, está tendo um assalto. E está na hora de você ir trabalhar. Você sai? Claro que não.



Falta uma articulação para melhorar o transporte intermunicipal?

Nós não temos o poder no intermunicipal. Quem toma conta é o DER, é o estado. Eles encolheram (o volume), e nós adiantamos a compra de ônibus, foi a única solução. O transporte público tem uma coisa. Me dá uma solução? Eu não tenho subsídio, me dá uma ideia do que fazer. Me dá uma ideia, se alguém quiser me dar uma ideia, eu quero essa ideia, eu preciso dessa ideia (do que fazer em relação ao transporte). Com muita humildade.

Um pesquisador da UFMG sugeriu mexer na gestão do transporte público em Belo Horizonte.

Está sendo mexido. Nós temos diariamente quantas pessoas andam de ônibus em Belo Horizonte. Essa gestão é feita, mas para essa gestão ser feita numa pandemia dessa, é uma hora esperando no ponto. Então, ó, eu quero uma ideia. Gestão não é ideia.

Está tendo alguma gestão com o governo do estado para melhorar o transporte intermunicipal?

Não, está tendo é uma barreira sanitária feita pela prefeitura de Belo Horizonte. Que para todos os ônibus e tira a temperatura de todo mundo. Isso é que está havendo, é a única coisa que consegui fazer porque isso eu tenho autoridade para fazer. 

Em maio, quando BH reabriu, a cidade tinha números bons em relação à COVID-19 e permitiu a flexibilização. Passado um mês, com 92% dos empregos ativos, a cidade voltou a encher o seu transporte público. Isso jogou por terra todo o esforço da cidade até então? Qualquer esforço está sujeito a fracassar daqui a um mês por causa do sistema de transporte?

Não, porque nós tiramos o pessoal da rua (a população). Então, você descarrega, você diminui. E o sistema de transporte público tem que ser revisado mesmo. Porque surgiu o Uber, que atrapalhou o táxi, que bagunçou o sistema todo.

Olha, tem funcionárias no meu prédio que vêm três, quatro num Uber, é mais barato que pegar um ônibus. A queda no transporte público não é medida por empresário de ônibus não, ela é medida pela BHTrans. Nós temos cada ser humano que entra num ônibus, em que linha está, e vai ter que ter uma reestruturação de linha. Já quebraram no meu mandato, faliram, duas empresas. Então, não pode negar o fato de que eles não vivem um bom momento. Precisa de uma nova gestão. São duas palavras: nova e gestão. E aí? 

A prefeitura tem algum estudo em andamento para melhorar o transporte já na pandemia?

Está sendo feito o estudo de ônibus menores, que gastem menos, um monte de história que está sendo feita junto com a BHTrans. Agora, ‘ah, preciso de uma nova gestão’. Exatamente. Então, eu preciso dessa gestão: deve ser um caderno desse tamanho para a gente estudar ela aqui. Nós estamos abertos.

Dá para fazer algo, no sentido de prevenção em relação ao transporte, para quando a cidade encher de novo, quando estiver com 92% ou mais dos empregos ativos? 

Mas quando a cidade encher de novo o transporte público é um pequeno problema que nós temos. Nunca foi um grande problema. Nós trocamos os ônibus, nós não emplacamos os ônibus de Belo Horizonte desde que eu sou prefeito sem ar-condicionado, sem suspensão a ar. Neguei o aumento para eles (empresas de transporte) e teve uma hora que tive que socorrer o transporte público. Isso é guerra. Menos mal. Imagina se tivesse dado o aumento e ainda tivesse que socorrer. Menos mal.

Críticas pelo carnaval

O senhor se arrepende de ter ajudado a bancar o carnaval de BH? Essa é uma das críticas mais recorrentes à sua gestão quando se fala da pandemia. Essa crítica tem fundamento?



Nós estamos com 192 mortos em Belo Horizonte (até 30 de junho, data dessa entrevista). A onda do coronavírus é de 15 dias, certo? O primeiro caso em BH foi em 16 de março. Então, está aí, a explicação é matemática.

Mas e a subnotificação, e o aumento das mortes por SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) em Belo Horizonte?

Onde?

Este ano teve mais mortes com essa causa do que na média dos últimos três anos.

Não, senhor. Isso é dado, é só pegar lá na Zoobotânica. Em abril deste ano houve menos enterros em Belo Horizonte do que no ano passado (abril de 2019). Então, é muito importante ir atrás dos dados. Em abril do ano passado morreu mais gente (houve mais enterros, na verdade) do que em abril deste ano nos cemitérios municipais.

Então, jogar a culpa...Peraí. Então, o Rio teve carnaval? São Paulo teve carnaval? Então, se não tivesse carnaval em Belo Horizonte, não teríamos nem um caso? Florianópolis teve carnaval? Isso é de uma estupidez absoluta. E outra coisa: eu ia proibir o carnaval porque tinha um vírus que ninguém sabia? Que nao tinha nem chegado à Europa? Isso é a chamada, no futebol, de engenharia de obra pronta. E se fosse o carnaval? Que não é. Foi uma doença trazida de fora. Então, se o primeiro caso foi no dia 16 de março, ele (vírus) chegou aqui no dia 1º de março. Já tinha acabado o carnaval (22, 23, 24 e 25 de fevereiro).

Ora, eu não ia imaginar que ia cair aquela chuva que caiu naquele dia não, ué. Eu não sou adivinho não, ué. E se alguém soubesse disso, o prefeito do Rio, de São Paulo, de Belo Horizonte, de Florianópolis, o prefeito de todo lugar que teve carnaval, cancelava o carnaval, ué. É simples assim. Agora, engenharia de obra pronta é astrologia, eu não sou astrólogo. Agora, matematicamente se prova que se a onda é de 14 dias, para a primeira morte, o primeiro caso, o vírus chegou aqui provavelmente dia 1º e o carnaval já tinha acabado. 

A doença foi trazida de fora. Se me perguntarem por que Manaus e Fortaleza foram brutalmente afetados e tiveram carnaval também, são grandes hubs do transporte aéreo. Essa foi uma das causas principais. Foram os hubs. Falar que foi carnaval é uma birutice.

Mas eu volto a falar, hein? A culpa não é do carnaval não, a culpa é do vírus.

Testagem

Uma das principais críticas de pesquisadores sobre o tratamento de BH à pandemia diz respeito à falta de testagem. Por que BH testou tão pouco e abriu laboratório de testagem só no mês de junho?



Deixa te falar: Belo Horizonte vai testar o dobro da Coreia do Sul. Já tem 48 mil testes, estão acontecendo, só que o resultado demora. Vamos testar o dobro da Coreia. O outro teste, o que enfia o negócio no nariz, o molecular. Então, no negócio de teste, nós vamos chegar rápido, nós estamos fazendo, estamos nos esforçando. E o laboratório não foi feito para a pandemia não. Nós precisávamos ter um laboratório em Belo Horizonte. Era um plano da secretaria de Saúde ter. Nós apressamos por causa da pandemia, mas era projeto da secretaria de Saúde.

UPA's lotadas

(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)


Circulam nas redes sociais vídeos da situação de superlotação de pacientes na UPA do Barreiro e de Venda Nova. Qual a realidade das UPAs de BH e como resolver os problemas?

Três casos que foram parar numa UPA que não está preparada, que não é centro de COVID-19, fizeram virar esse carnaval. Venda Nova tem, tanto que o respirador veio da UPA Venda Nova. Se três casos, sem nenhum óbito, viraram esse carnaval da oposição, da imprensa, imagina na hora que faltar mil (respiradores)?

Aqui, mineiro é assim. Vamos abrir tudo. Três casos, sem nenhum óbito. Não morreu ninguém (na UPA), porque nós tínhamos gente, intensivistas, foram, botaram (respirador), colocaram. Imagina você se estivesse matando 500 por dia. Se fizeram esse carnaval na internet, os adversários fizeram por causa de três? É isso. É exponencial, gente. Não é projeção geométrica não. Não estou nem falando de aritmética. É exponencial. Chegaram três casos e pá, na UPA Diamante. Tum, tum, tum. Ambulância, faltou ambulância, já fizemos um aditivo de ambulância. Se for esse carnaval por causa de três doentes, sem morte, então imagina se nós estivéssemos com dez mil mortes aqui.

Quais ensinamentos a pandemia vai deixar ao SUS de BH? A teleconsulta e os atendimentos remotos tendem a crescer? 

Nós trabalhamos muito aqui, né? Aqui não houve brincadeira. Fizemos a teleconsulta, fizemos diversas ações. Agora, não acho que uma tragédia dessa...até porque se tragédia fosse exemplo de bondade humana, nós só íamos ter a Primeira Guerra Mundial, não iríamos ter a segunda. Então, a pandemia não deixa legado nenhum, ninguém vai ficar melhor, ninguém vai ficar com o coração melhor. O que estou vendo aí é negativismo, negativismo branco, interesse, é todo tipo de barbaridade que não poderia acontecer quando você perde a sua mãe, o seu tio, a sua prima, o seu irmão. Estão tratando isso daí (pandemia) como um problema, como a chuva, e aqui isso não é um problema como a chuva, esse é um problema que não tem volta. 

Medicamentos

Uma das preocupações recentes diz respeito ao estoque  de anestésicos e relaxantes, usados em cirurgias e em pacientes que precisam de usar o respirador. O que BH tem feito para evitar um desabastecimento? 

A capital já resolveu para alguns meses, resolvemos. Emprestamos para alguns hospitais da cidade, mas nós recebemos da Feluma (Fundação Lucas Machado) 20 mil ampolas. Isso nos dá uma certa tranquilidade a respeito disso. Nós já tínhamos para dois, três meses. Tivemos que emprestar algumas, mas isso vai ser resolvido, vai chegar, vão nos pagar. É outro problema. Quando você escuta a médica responsável por todo o sistema de Santas Casas, parece que são mais de 40 no estado, falar que colapsou...É isso, é anestésico que está faltando, é gente, é entubador...

Se entubar na hora errada, mata. Sei entubar, mas não sei a hora de entubar, mata o paciente. Então, o caso é grave, gente. Isso não é uma tempestade, não. A tempestade nós matamos com o pé nas costas. O principal nós passamos e com dinheiro em caixa. Agora, o problema não é financeiro.

Protestos contra o fechamento do comércio

O que o senhor tem a dizer das pessoas que protestaram em frente à prefeitura, com camisa amarela, na segunda-feira, contra o fechamento do comércio?



Primeiro, é um samba do crioulo doido, né? É fora STF, é viva o Bolsonaro, queremos trabalhar, é fora kalil. Você tem que interpretar o que eles estão falando. Nós temos eleição. Não interessa se ela vai ser agora, daqui a um mês ou dois. Eleição, chega lá e vota. Vota em outro. Que no grito, eu já disse: quem tem medo de buzina é cachorro distraído e 200 pessoas gritando aqui é para quem nunca foi presidente do Atlético. Quando saía do Mineirão tinha era 50 mil te esperando lá fora. E o resultado era ruim. Então, buzina e grito, o jeito de mudar, o meu jeito, é no voto.

Relação com Zema

O governador Zema falou que, se a pandemia fosse uma partida de futebol, Minas Gerais ainda teria 60 minutos de jogo. Como estaria BH se essa lógica fosse trazida para a capital?

(Risos) Ninguém sabe o tempo desse jogo, tá?. Ninguém sabe. isso aí os números vão falar. A única capital que não explodiu no Brasil foi BH. Foi a única que não explodiu no Brasil, foi BH. Então, acho que nós podemos estar no primeiro minuto do primeiro tempo, como podemos estar nos 45 do segundo tempo. Mas eu não sou astrólogo, então eu preciso dos números na mão.

Como avalia a postura do governo do estado? O estado demorou a reagir? 

Desceram aí no avião, no Aero Lula, com pompa e circunstância, anunciaram R$ 1 bilhão, e Belo Horizonte recebeu R$ 17 milhões. E nós gastamos R$ 200 milhões. Eu não critico não, tá? É só esclarecendo que Belo Horizonte não teve nada, a não ser do governo federal, e do recurso próprio que tinha.

O senhor acha que questões políticas estão atrapalhando essas questões de repasses do governo estadual para a prefeitura de Belo Horizonte?

Não, não. O governo de Minas está quebrado, está falido, está liquidado. Nós (eu e Zema) poderíamos sair para beber cerveja todo dia junto que o governo de Minas ia continuar a ficar sem dar um tostão para Belo Horizonte porque não tem mesmo. Não tem. Então, isso (relação) não afeta em nada. O que as prefeituras precisam? Dinheiro. Não estou falando só Belo Horizonte não. Estou falando (Ribeirão das) Neves, Matozinhos, eles precisam de dinheiro. Ninguém precisa ser amiguinho não. O Bolsonaro chegou lá, toma a primeira parcela aqui, põe mais uma parcela na Saúde de Belo Horizonte, pronto e acabou. Ninguém precisa ser amigo não, ué. O que eu quero (dinheiro), ele (Zema) não tem para me dar. Então, ele não me atrapalhou em absolutamente nada e apesar de ele ter criado aquele gabinete do ódio lá. Eu não tenho o menor problema com o governo do estado, não tenho o menor problema.

Tem o gabinete do ódio no governo Zema?



Tem, eles querem briga, querem brigar, querem agredir. Uma hora é a secretária, uma hora é a subsecretária, outra hora é o secretário. Então, eles criaram lá um gabinete que eu nunca vi um negócio desse. Aqui não, aqui nós estamos trabalhando. Aqui não é escrever protocolo. Você imagina se esse hospital que está aí (Hospital de Campanha, no Expominas) fosse meu? O pau que eu estava levando. E passa ó (sinal com as mãos de que ninguém cobra do governador Zema). Isso é para fazer partida de vôlei lá, porra.

Volta às aulas

Prefeito, mães e pais aguardam a volta dos filhos às escolas. O que o senhor pode dizer a eles? 



O meu filho não iria para a escola. Quando que volta é coisa de astrólogo. Vocês vão repetir a data até quando? Os números é que vão falar quando volta a escola. É a matemática, a ciência é que vai falar quando volta.

Pode ser que não volte este ano?

Pode ser que não volte em julho do ano que vem (citou apenas como exemplo). O pior não está por vir? Alguém ouviu o presidente da OMS (Organização Mundial de Saúde) falando? O pior está por vir. É simples assim. Então, o que nós estamos fazendo? Socorrendo com cesta básica, kit de higiene, alimentação, acolhendo gente da rua, fazendo o que temos que fazer. Atendendo, ampliando leitos, é o que temos que fazer.

O senhor acha que a educação a distância é a solução?

Isso é uma piada, isso é uma piada de péssimo gosto. Isso é só quem não tem noção da pobreza dessa cidade, que não conhece a miséria, é que pode falar uma bobagem dessa. Nós não estamos falando nem é de (falta) internet não, é falta de televisão, de luz elétrica. De luz elétrica. Temos ocupações com mais de quatro mil residências que não têm luz e não têm água e não tem esgoto.

Mais sobre Bolsonaro

O senhor acha que a postura do presidente Bolsonaro, que foi crítico ao isolamento, que desqualificou a doença, que deu exemplo para andar sem máscara, promovendo aglomerações, isso afetou o comportamento de parcela da população?

Muito, muito. O presidente Bolsonaro fez muita falta à população do Brasil. Aos prefeitos, aos governadores, fez muita falta. A liderança nacional fez muita falta, entendeu? Isso fez muita falta para todos nós. Era uma postura única no mundo, que todos os setores foram...Tanto que essa decisão do Supremo, de cada um por si, Deus por todos, ela veio por esse negativismo. Fez muita falta. O distanciamento seria mais sério (se ele desse o exemplo), porque aí estaria o presidente, o governador, o prefeito falando a mesma coisa. Numa linha só, no Brasil inteiro, e nós já teríamos passado por isso. Então, o negativismo foi um desastre para o Brasil, um desastre. E é aquilo que eu volto a dizer: é dicotômico, né? Agora, está derramando trilhões no país por causa de uma gripezinha, que não é uma gripezinha. Se fosse, não tinha essa despesa toda que está tendo.

Eleição municipal

Como tem recebido as críticas dos possíveis adversários na próxima eleição?

Olha, governar não é agradar, infelizmente governar não é agradar. Não fui eleito aqui para agradar ninguém. Sou responsável por proteger, cuidar da população de Belo Horizonte. Então, a crítica é muito oportunista, eleitoral. Então, o que vem é tão baixo, é tão oportunista que não me incomoda. Eu acredito muito no que foi feito em Belo Horizonte em três anos e meio. Eles confundem pobreza com burrice. Eu ganhei a última eleição porque eu não confundi pobre com burro. Pobre é pobre, mas ele não é burro.

O senhor identifica na cidade algum segmento de empresários que vai fazer mais oposição ao senhor na eleição? 

Eu ainda não parei para pensar nisso, mas nós temos trabalho feito. Pobre não é burro, é só pobre.

Como está o seu leque de alianças para a eleição?

Ah, grande, grande, grande, muito. Eu vou ter muitos partidos (na aliança).

Pela extrema direita, o Bolsonaro deve apoiar um deputado estadual. O governador deve apoiar o candidato do Novo. Temos o PSDB com uma candidatura também. Temos um deputado estadual também, que é candidato, com apoio do senador Rodrigo Pacheco. O seu leque de alianças vem do centro para a esquerda. Como está o seu diálogo com os partidos de esquerda?

Olha, não começamos ainda. É óbvio que qualquer apoio é bem-vindo, mas não houve essa conversa porque eu não consigo conversar esse assunto, eu não consigo. Eu não posso conversar um assunto desse à base de Lexotan (6mg). Então, não consigo conversar sobre esse assunto, não tem a data da eleição, nós fizemos o diretório municipal do PSD, eu nem conheço, nem fui lá ainda. Quer dizer, não dá para falar de política agora, o meu espírito não dá. E na hora que for para falar, vou falar, eu sei brigar, eu sei ir para o campo de batalha. Isso não me preocupa, porque eu sei fazer. Eu não sei é como que segura essa pandemia, e acho que isso ninguém sabe. E isso me desespera.

Em nível nacional existe essa polarização, do Bolsonaro com o PT, a esquerda. O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta tem sido crítico a isso, à falta do debate mais amplo. E ele até surge como potencial candidato, juntamente com o também ex-ministro Sérgio Moro. Aqui, no município, a tendência é de uma eleição de nível também baixo?



O que eles tinham para falar de mim, que eu devia IPTU, eu continuo devendo. E na prefeitura, tem três anos e meio que nunca ninguém piou de um escândalo aqui dentro. Então, eu levo também para o nível que eles quiserem. Se quiserem debater em bom tom, eu sou muito educado. Se quiserem ir lá para o esgoto, eu vou também.

Com quais partidos o senhor tem conversado mais ao centro? MDB sai com o senhor? Quem mais?

MDB sai, o próprio PP sai, o PSD, que é o meu partido, o PDT deve sair, porque eu apoiei o Ciro (Gomes) aqui em Belo Horizonte. Então, ele declarou, não conversei com ele sobre isso. Então, há um leque de partidos que vem junto.

Como é que está o seu relacionamento com o vice Paulo Lamac?

Ótimo. 

Voltam a compor a chapa?

Não, isso nós ainda estamos estudando. Ainda não está nada resolvido. Mas o Paulo vai fazer parte da minha campanha.

O senhor repetiria essa aliança, essa composição, ou há tendência de chamar alguém do MDB?

Eu não negocio o meu vice. Mesmo que isso custe a minha eleição.

O Fuad Noman, ex-secretário da Fazenda de BH, está em pauta?

Todos estão em pauta. Todos estão. O Paulo Lamac está em pauta, o Fuad está em pauta. Vários estão em pauta. Qualquer secretário meu está em pauta. Então, eu não negocio vice. Vou escolher e ponto final.

Finanças da PBH e retomada da economia

Qual o tamanho da perda de arrecadação de Belo Horizonte?

R$ 1 bilhão. 

Qual é o planejamento?

Está sendo feito pelo secretário André Reis (secretário municipal de Planejamento, Orçamento e Gestão), uma recomposição, gradativa, lenta. Nós já cortamos 30% do orçamento, já demos ordem de cortar. Aqui, a única coisa que a gente faz é economizar no meio e gastar na ponta. A ponta não vai ser mexida, mas o meio vamos mexer muito.

Há perspectiva de faltar dinheiro para pagar salários do funcionalismo?



Não temos o menor perigo de faltar salário para funcionalismo público. Nem salário nem 13º salário, nem nada disso.

E sobre a retomada econômica da cidade após a pandemia. A sua equipe de Fazenda, Planejamento, já trabalha para recuperar a economia da cidade?

Sim, já há um grupo trabalhando. Essa é a segunda etapa importantíssima, porque tem que ter a mesma responsabilidade para fechar (a cidade) e para abrir, recuperar e para ajudar esse povo.

Inclusive para os negócios que não abriram em momento algum?

Não, esses negócios já fomos no decreto. Nós já suspendemos no decreto. Foi decretado antes.

O que a população pode esperar desses últimos meses de mandato do senhor: administrar essa crise da COVID-19?

O mesmo Alexandre Kalil que sentou aqui no dia 1º de janeiro de 2017, é o mesmo que vai sair, ele vai ser amado, derrotado ou execrado. Mas vai botar essa cabeça grande no travesseiro e vai dormir. 

A entrevista

O prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, concedeu entrevista exclusiva ao Estado de Minas. Na conversa, ele falou sobre a pandemia da COVID-19 e as providências da PBH para reduzir casos, mortes e o impacto da doença no sistema de saúde da capital mineira. Kalil ainda foi questionado sobre ações para a retomada da economia da cidade, eleições municipais, política estadual e nacional. 

Leia o que já publicamos: 


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)