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Estado de Minas CONJUNTURA ECONÔMICA

Inflação atinge pratos tradicionais da culinária de BH

Nos últimos 20 anos, pratos bem conhecidos da gastronomia da capital mineira, como o kaol do Palhares e o mocotó do Nonô, foram atingidos pela alta dos preços


29/05/2022 04:00 - atualizado 29/05/2022 07:45

Bar Palhares
Kaol do Palhares: mesmo com o impacto da inflação no preço, o prato provoca filas de clientes na calçada da Rua Tupinambás (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A PRESS)
Quem mora ou já visitou as ruas do Centro de Belo Horizonte certamente deve ter experimentado o tradicional kaol do Café Palhares, ou mesmo o cafezinho com pão de queijo do Café Nice, ou tomado o caldo de mocotó no Nonô.

E também experimentado o famoso beirute do Xodó, na Praça da Liberdade, ou o pastel da pastelaria Marília de Dirceu. Você imaginaria que todos esses produtos consumidos há décadas custavam até quatro ou cinco vezes menos no início do século?

crise inflacionária do Brasil em 2022 não só atingiu a cesta básica das famílias, mas interferiu diretamente no lazer e no paladar do belo-horizontino ou dos turistas. Num cenário de incertezas no país, os estabelecimentos da capital trabalham arduamente para tentar segurar ao máximo os preços de seus “queridinhos”, e os consumidores tentam economizar para não deixar de saboreá-los.

           O retrato da disparada da inflação no 'prato feito' brasileiro

Em dias de semana e aos sábados, longas filas se formam na calçada da Rua Tupinambás, 638 para saborear o kaol do Palhares, vencedor do concurso Comida di Buteco deste ano. Em 2002, esse tradicional prato era vendido a R$ 4,90. Hoje, o produto custa R$ 25,90. De acordo com o IBGE, de janeiro de 2002 a abril de 2022, o Índice de Preços ao Consumidor Acumulado (IPCA) chegou a 252%.

Empadas Mercado Central
Empada do Mercado Central: qualidade do salgado continua falando mais alto que os preços e atraindo consumidores (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A PRESS)
 
Fundado em 1938, o Café Palhares tem como história já ter enfrentado os efeitos econômicos da Segunda Guerra Mundial, da ditadura militar, do Plano Cruzado, do Plano Collor e o congelamento de preços, o que ajudou a garantir solidez financeira e sabedoria para encarar as crises.

O aumento no preço dos insumos da cesta básica (arroz, feijão e carnes) é o que mais impacta no preço do prato. “A grande maioria não deixou de comer aqui, mas a inflação impacta na margem de lucro. Não temos como aumentar 40% no preço do kaol”, explica o empresário André Palhares, um dos administradores do restaurante e café, ao lado do pai e do tio, João Lúcio e Luiz Fernando Palhares.

Renato Moura Caldeira, dono do Café Nice
Renato Moura Caldeira, dono do Café Nice, um dos mais tradicionais de BH: em 20 anos, preço do café subiu de R$ 0,80 para R$ 3 (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A PRESS)


Por sua vez, os clientes se mantêm determinados em consumir o kaol. "Conheci o prato através do meu pai. Mas estamos sentindo na pele essa inflação. Em relação à comida, não tem como parar. Todos continuam consumindo. Tem que ser de vez em quando. Não pode ser sempre", afirma a psicóloga Luana Campos, de 37 anos, que visitou o estabelecimento ao lado das colegas de trabalho Cristiana Coutinho, de 37, e Cleissiene Lima, de 31.

Qualidade Não é preciso ser belo-horizontino para conhecer o caldo de mocotó do Nonô, desde 1964 em atividade. Nos últimos 20 anos, o produto teve alta de 650%, passando de R$ 2 para R$ 15. Apesar disso, não deixou de ser um dos preferidos dos consumidores. "O caldo do Nonô é tradição de vários anos. Se eu vier no Centro e não tomar o caldo, é a mesma coisa de não ter vindo. O preço aumentou, mas não nos impede de vir aqui”, conta a florista Alessandra Souza, de 44.

Décio dos Santos, proprietário do Mocotó do Nonô
Décio dos Santos, proprietário do Mocotó do Nonô: nem a alta de 650% no preço espanta os fiéis consumidores da iguaria (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A PRESS)
César Viana
No Xodó, o gerente César Viana faz estoques maiores e embalagens menores para tentar reduzir custos e preços do beirute e outros produtos (foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS)
 
Um dos proprietários do local, Décio dos Santos diz que o clima atual incentiva mais vendas. “Tentamos novos fornecedores, mas temos que optar pela qualidade e o preço. Deixamos o valor mais abaixo mesmo. Não temos como acompanhar a inflação. Mas, no frio, as vendas certamente aumentam, o que nos motiva a continuar.”
 
Na Praça da Liberdade, o beirute do Xodó, que comemora 60 anos em 2022, é o queridinho dos turistas que admiram um dos cartões-postais da cidade. Esse sanduíche, presente há décadas na vida do belo-horizontino, teve alta superior a 200% de 2002 até hoje – o principal produto custava R$ 9 há 20 anos, hoje o preço é R$ 30.

Como os demais, o estabelecimento não repassou a maioria dos aumentos dos insumos para o consumidor nos últimos anos e traçou estratégias para lidar com os períodos de crise.

“Estamos comprando estoques maiores, diminuímos algumas embalagens e conversamos com os fornecedores para obter melhores preços. Além disso, nosso cardápio mudou em 2017, pois saímos das carnes industrializadas para as artesanais, o que deixou o produto mais atrativo”, afirma o gerente-geral César Gonçalves Viana.

 
Juliana Bahia
A gerente da pastelaria Marília de Dirceu, Juliana Bahia, com a página do EM de 20 anos atrás, quando o pastel custava R$ 0,60 (foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS)

Preço da farinha encarece o pastel

Um dos produtos mais amados pelos belo-horizontinos, o pastel também não fugiu da crise inflacionária, muito em função dos recentes aumentos da carne, do óleo de soja, do queijo, do leite e da farinha, esta uma das vilãs por causa da guerra entre Rússia e Ucrânia.

A tradicional pastelaria Marília de Dirceu, fundada em 1992 por cinco irmãs, tentou abdicar ao máximo dos reajustes para não prejudicar as vendas e os clientes. Uma reportagem do Estado de Minas no início dos anos 2000, emoldurada nas paredes do estabelecimento, mostrava que um pastel custava, em média, R$ 0,60. Hoje, o salgado custa entre R$ 5 e R$ 6.

“A tradição nos ajudou a manter o volume de vendas. Sabemos que o consumidor também está numa situação complicada. Os insumos aumentaram 30% na média, mas repassamos pouco esse valor. Além disso, procuramos variar o serviço, servindo festas e eventos para aumentar o orçamento”, afirma a gerente-geral Juliana Bahia.

Os frequentadores do Café Nice, localizado no coração de BH e ponto de encontro de políticos e celebridades, também sentiram no bolso o preço do cafezinho.

Desde o ano passado, o café teve aumento de 25% em função da valorização do produto e das variações climáticas. Em 2002, um simples cafezinho custava R$ 0,80, de acordo com o proprietário, Renato Moura Caldeira.

Hoje, o cliente paga R$ 3 pelo café; com o pão de queijo, R$ 7. “Tenho dificuldade para dar aumento. Muita gente não saiu de casa e continua trabalhando em home office, o que reduz as vendas. Se o empresário não tiver perseverança, não prospera”, afirma Caldeira.
 
Da mesma forma, a empada do Mercado Central também conviveu com sério aumento no preço dos insumos. Em 20 anos, ela passou de R$ 1,90 para R$ 5,50.

“A tradição, o recheio, a massa, qualidade e atendimento ajudam a ter o nome que ela tem nesses muitos anos de trabalho. O pessoal nos procura, mesmo com a mudança dos preços”, diz Rosângela Gomes Evangelista, de 55, responsável pela confecção das massas.


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