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Estado de Minas A CRISE QUE NÃO ACABA

Inflação histórica e medo de violência afetam brasileiro que volta ao trabalho presencial

Cerca de 1 a cada 5 brasileiros trabalhou de forma remota, segundo FGV. Com o fim do home office, enfrentam altas de preço históricas e medo da violência


05/05/2022 10:27 - atualizado 05/05/2022 11:15


Mulher colocando combustível no carro
(foto: Getty Images)

A volta ao trabalho presencial para brasileiros que faziam home office até o início de 2022 pode ser considerada uma notícia boa - afinal, o que levou funcionários a ficarem em casa durante quase dois anos, a pandemia de coronavírus, demonstra uma melhora gradual. No mês de abril, o Brasil registrou o menor número de mortes por covid-19 desde março de 2020, de acordo com dados do Ministério da Saúde.

No entanto, para o grupo que pôde realizar as atividades profissionais remotamente - cerca de 1 a cada 5 brasileiros, segundo o Instituto Brasileiro de Economia da FGV -, a hora é de enfrentar altas de preço históricas e, para alguns, sentir-se mais vulnerável à criminalidade, especialmente nas grandes metrópoles.

Para a advogada Debora Moreira, de 27 anos, moradora da capital paulista, o retorno ao escritório onde trabalha quatro vezes por semana significa que ela terá uma parte menor de sua renda disponível no fim do mês.

"Agora gasto três vezes mais do que antes com gasolina, pelo trajeto e preço mais alto, e como trabalho em uma região cara, no bairro da Vila Olímpia, meu vale-alimentação não é suficiente para comer todos os dias fora. Enquanto estava em casa, cozinhava e ainda sobrava para o dia seguinte, então era bem mais econômico", diz.

"Por ficar parada no trânsito de grandes avenidas e em faróis, tenho medo de ser assaltada e perder não só meus bens, mas o notebook da empresa com todo o meu trabalho nele. De sofrer violência, então, mais ainda. Evito assistir televisão para que os crimes não me causem ansiedade".

Medo da violência

O psicólogo André Vilela Komatsu, pesquisador do NEV-USP (Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo), aponta que tem acompanhado muitos relatos de trabalhadores que, assim como Debora, se sentem mais ansiosos por precisar transitar em distâncias maiores nas cidades.

Na avaliação dele, é esperado, assim como toda mudança de rotina, que as pessoas sintam algum nível de estresse. "Passando mais tempo em casa, reparamos na cadeira que está ruim, no espaço não tão agradável... E, com o tempo, a gente vai acostumando. E agora é a mesma coisa. Voltamos a reparar em problemas sociais que sempre estiveram aí, mas muita gente não viu as transformações do espaço público por ficarem restritos a seus bairros durante a pandemia."

Entre as mudanças, ele cita a intensificação de problemas sociais, com maior degradação dos espaços públicos, mais pessoas morando nas ruas e o aumento de crimes. "Houve uma redução de assaltos durante a pandemia, justamente por ter menos gente na rua, e agora já estamos chegando em níveis semelhantes aos de antes."

Para o pesquisador, a sensação de medo é natural e, embora não seja o ideal, é esperado que as pessoas consigam se acostumar ao menos parcialmente.

"(Para) a maior parte dos trabalhadores, não é nem uma questão a ser discutida. Infelizmente, o medo de ser demitido ou de não ter onde trabalhar às vezes é maior do que o medo de sofrer violência, e certamente isso causa muita ansiedade."

Alta histórica da inflação

A prévia da inflação oficial, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - 15 (IPCA-15), chegou em abril a 1,73%, a maior taxa desde 1995, resultado que é consequência de uma série de fatores ocorridos nos últimos dois anos no Brasil e mais recentemente, internacionalmente.

Em março, o IPCA teve o maior avanço para o mês em 28 anos, com alta de 1,62%.

"Há dois fatores que agiram juntos para jogar inflação para cima durante a pandemia: estímulo muito forte por meio da transferência direta de renda do governo para as famílias e taxas de juro em uma mínima histórica - a Selic chegou a 2% ao ano e hoje já está em 11,75%. Isso ajudou a manter o poder de compra das famílias estável por algum tempo, mas com maior demanda e circulação de dinheiro, elevou a inflação", explica a economista Tatiana Vieira, da XP Investimentos.

Outros acontecimentos recentes no cenário internacional também contribuíram para a alta da inflação no Brasil. "A guerra da Rússia contra a Ucrânia fechou portos, criou embargos importantes para Rússia e paralisou produção em ambos os países, exportadores de milho, trigo, sementes - o que influencia, inclusive, no preço da carne, já que esses alimentos servem como ração", afirma Vieira, lembrando que a Rússia também é o maior exportador de gás para Europa e que a situação de instabilidade afeta o preço dos combustíveis.


Mão de mulher aproximando um cartão de crédito de uma máquina de pagamentos
O número de brasileiros endividados bateu novo recorde em abril, chegando a 77,7% (foto: Tim Robberts/Getty Images)

Na China, o lockdown restritivo a qualquer caso de covid-19 faz com que fábricas e portos fechem por alguns dias, deixando a comunidade global sem acesso a insumos muito importantes para produção. "Com isso, bens manufaturados devem subir, especialmente os industrializados."

Em 2022, funcionário paga muito mais caro para ir trabalhar

De todas as altas, a de combustível foi a maior - no último ano, o preço da gasolina aumentou 47%, o diesel, 50% e o etanol, 60%. Os automóveis também ficaram muito mais caros, com aumento de 20% para carros novos e 15% para modelos usados, de acordo com o IPCA.

"Transporte por aplicativo tinha sido uma alternativa muito usada. Até por conta da pandemia, muitos reavaliaram o uso de alguns bens, 'abriram mão' de ter o carro. Mas os preços já subiram um pouco, principalmente pelo combustível", comenta a economista.

Para quem usa o transporte público, também houve aumento. O aumento da passagem de ônibus municipais foi de 1,2%, e para os intermunicipais e interestaduais, entre 1,5 e 2,5%.


Homem falando no telefone enquanto espera transporte
(foto: Getty Images)

"Durante a pandemia, os prefeitos decidiram não dar reajuste. O caixa dos municípios e estados estava muito bem, arrecadação por ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) surpreendeu positivamente, evitando que repassassem a alta do diesel via aumento de tarifas. Mas não sabemos até quando vão conseguir segurar", aponta Vieira.

Os serviços, em geral, desde a contratação de funcionários para limpeza, mensalidade de escolas e creches, e outros que se tornaram ainda mais necessários para muitas famílias ao deixarem o home office, sofrem reajustes ligados à inflação do ano anterior.

Para comer, mesmo dentro de casa, o preço dos alimentos também aumentou, e a conta fica ainda mais cara em restaurantes. "O primeiro motivo é doméstico, crise hídrica, fatores climáticos que impactaram a produção. Fretes e transporte das mercadorias ficaram muito mais caros. E a expectativa é que a gente continue vendo", conclui.

Preferências dos funcionários e tendências das empresas brasileiras

A volta parcial ao escritório com equipes reunidas até duas vezes por semana é a opção preferida pela maioria dos profissionais de grandes empresas brasileiras, de acordo com o estudo "Modelos de trabalho pós-pandemia", realizado pela empresa de consultoria e auditoria PwC Brasil em parceria com o PageGroup.

Entre os mil profissionais ouvidos, 67% preferem regime integral de home office ou modelo híbrido com uma, ou duas idas ao escritório na semana.

"Com a pandemia, fomos convidados a refletir sobre qual modelo de trabalho queremos. Algumas barreiras já foram quebradas e as pessoas começam a pensar 'Bom, talvez eu não precise me deslocar - por horas, às vezes - para trabalhar. Além disso, pessoas localizadas remotamente em diferentes partes do Brasil trazem a equipe, pela minha experiência profissional, ideias diferentes e originais", Stephanie Crispino, CEO da Tribo, consultoria do grupo Anga que tem como foco a humanização de culturas empresariais.

A mistura de home office e trabalho presencial é realidade na rotina das pequenas e médias empresas brasileiras. Segundo a pesquisa "Impacto da covid-19 na cultura e operação das PMEs brasileiras", 47% das PMEs estão trabalhando de forma híbrida. O trabalho 100% presencial vem em segundo lugar, com 38% das companhias, seguido do trabalho totalmente remoto, com 15%.

Ter conhecido a possibilidade de trabalhar em sistema híbrido ou remoto, aponta Stephanie, não significa que as empresas necessariamente continuarão adotando o modelo - mas, em sua opinião, para os tipos de trabalho que permitem, é um passo nessa direção.

"Essa flexibilidade fez as lideranças e trabalhadores entenderem que a produtividade fora do escritório é possível, e nesse ponto, não há como voltar. Essa alternativa pode, inclusive, fazer a diferença quando o profissional for escolher a empresa na qual quer trabalhar", conclui Crispino.

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