(none) || (none)
Publicidade

Estado de Minas EM MINAS

A hora do espanto, o mercado de plasma humano no Brasil

Até meados da década de 1980, o Brasil se debatia na completa desregulação do sistema de sangue, com centros privados predominando na coleta remunerada


15/10/2023 04:00 - atualizado 17/10/2023 09:48
709

Arte Paulo Miranda


A compra e a venda de plasma sanguíneo, como propõe a Proposta de Emenda à Constituição 10/2022, pronta para ser apreciada no plenário do Senado Federal, se aprovada, tem todos os ingredientes para instituir um mercado predatório e de pouca segurança para receptores no país.

Já foi assim no passado. Até meados da década de 1980, o Brasil se debatia na completa desregulação do sistema de sangue, com centros privados predominando na coleta remunerada. Os alvos eram, sobretudo, pessoas de baixa renda, recrutadas aleatoriamente.

Pela transfusão de sangue, havia a propagação de sífilis, hepatite B, C, depois Aids. “O movimento sanitarista demonstrava, naquele momento, que uma política de sangue para o país era fundamental e se integrava ao âmbito da segurança nacional, sendo uma questão estratégica, uma vez que perpassa todas as áreas da medicina”, explica o hematologista e hemoterapeuta João Paulo Baccara Araújo, que foi o primeiro presidente da Hemobrás e, entre outras funções, já coordenou a política nacional do sangue do Ministério da Saúde.

A Constituição de 1988 consagrou este entendimento, prevendo, em seu inciso 4º, artigo 199, a vedação da comercialização de órgãos, tecidos e substâncias humanas, assim como coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados.


E foi em 2001 que o Congresso Nacional aprovou a chamada “Lei do Sangue; Lei Betinho (Lei 10.205), regulamentando coleta, processamento, estocagem, distribuição e aplicação do sangue, seus componentes e derivados. “Nosso sangue hoje é totalmente seguro e comparado aos melhores centros do mundo”, assinala Baccara. Entretanto, se aprovada a PEC, a mercantilização do plasma humano trará consequências danosas para a saúde pública e para o país.

Em primeiro lugar, comprometerá a segurança dos estoques: como em toda relação comercial, quem vende não terá interesse em informar as suas reais condições de saúde. Em segundo lugar, quem doa plasma, não pode, em seguida, doar o sangue. “Há uma quarentena. Se for coleta remunerada, haverá uma competição, com a vantagem para a venda do plasma, que pode ser feita mensalmente, diferentemente do que ocorre com o sangue”, acrescenta.

E por fim, mas não menos importante, a mercantilização do plasma também colocará em risco todo o investimento público realizado para transformar o Brasil, autossuficiente em hemoderivados, já a partir de 2025, com a conclusão da nova planta da Hemobrás, que terá capacidade e tecnologia para fracionar entre 500 mil e 600 mil litros de plasma por ano.

Quem se beneficiaria com a aprovação desta PEC? Os centros privados, que passariam a captar o plasma, enviariam ao exterior para o fracionamento – que é o que a Hemobrás faz hoje. Com a diferença de que a Hemobrás, ao receber os hemoderivados, os disponibiliza para SUS e hospitais conveniados. Diferente é o propósito dos centros privados, que os distribuiriam na praça, de acordo com os melhores preços. Há algo nesta PEC que assombra até vampiros experientes.

Leia também na coluna de hoje da Bertha

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)