Jovem relata estupros e ameaças de montador de móveis em BH
Suposta vítima denuncia que o segundo abuso sexual ocorreu meses depois do primeiro. Ela afirma que foi perseguida pelo suspeito
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Siga noPaula* (nome fictício), de 24 anos, denuncia ter sido vítima de estupros, perseguição e ameaças de morte por um homem que contratou para montar móveis. A primeira violência sexual teria ocorrido em 31 de março, quando a jovem recebeu o suspeito em casa, na Região Nordeste de Belo Horizonte, para a realização do serviço. Dois meses depois, após ameaças por mensagens e com boletim de ocorrência já registrado, Paula* teria sido estuprada novamente pelo mesmo homem. “[Sinto] que estou perdendo tudo na minha vida e que ele está vivendo a vida dele”, disse a jovem ao Estado de Minas nesta terça-feira (17/6), um dia depois de ir à polícia para periciar o celular.
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À reportagem, Paula* disse ter a sensação de que nada está sendo feito para protegê-la e que continua com medo. Ela afirma que o homem não foi preso preventivamente e que nenhuma medida protetiva foi instaurada, assim como não aconteceu após a primeira denúncia. “Estou com muita raiva. Eu esperava um certo posicionamento (...) Sinto que não vai acontecer nada com ele”, disse a jovem.
Paula* disse ter informado à polícia o nome e o perfil do Facebook do suspeito, além do endereço para onde ele a teria levado no segundo estupro.
Sobre o caso, a Polícia Civil de Minas Gerais afirmou que as “investigações encontram-se em andamento na Delegacia Especializada de Combate à Violência Sexual em Belo Horizonte e as informações serão divulgadas assim que concluídos os trabalhos policiais.” A corporação não se posicionou sobre a realização de prisão preventiva ou instauração de medida protetiva.
Primeiro estupro
Paula* conta que encontrou no Facebook o anúncio de um suposto prestador de serviços e o recebeu em casa, onde morava sozinha, no dia 31 de março, para montar um guarda-roupa. Na ocasião, o suspeito, identificado como Vinícius no perfil, teria pegado uma faca na cozinha, a ameaçado e a estuprado. Paula* relata que ficou paralisada e com muito medo.
Nos dois dias seguintes ao crime, Paula* disse que não conseguiu sair de casa nem se alimentar. Sobre o motivo de não ter ido à polícia logo após o ocorrido, ela diz que sentiu vergonha pelo julgamento das pessoas por ter recebido o homem sozinha em casa. “Foi a vergonha de pensar: como eu fui burra de trazer uma pessoa desconhecida para minha casa, como eu não pensei nisso”, relata a jovem.
Na quinta-feira (3/4), três dias após o crime, Ana* (nome fictício), uma pessoa do círculo social da jovem, percebeu que ela estava passando mal e a acolheu. Foi então que Paula* contou o ocorrido. Acompanhada, ela foi levada ao Hospital das Clínicas da UFMG, onde teve atendimento com um psiquiatra, realizou exames que indicaram ruptura recente do hímen e colheu material genético, conforme registros acessados pela reportagem. Também foi prescrito tratamento para prevenção de gravidez e doenças sexualmente transmissíveis.
Juntas, elas teriam conseguido encontrar o perfil verdadeiro do suposto montador de móveis, onde descobriram que o nome Vinícius era falso. Paula* teria o reconhecido pelas fotos postadas.
Perseguição
Depois do crime, o suspeito teria continuado a perseguir Paula* e a ameaçá-la por mensagens. “Após o fato, ele passou a enviar mensagens de cunho íntimo e a procurar a vítima em diferentes locais, inclusive em sua residência e próximo ao curso que ela frequenta, gerando nela sentimento de temor e insegurança”, consta no boletim de ocorrência registrado pela vítima em 15 de abril.

Conforme print apresentado pela jovem, o suspeito teria enviado uma mensagem para ela no dia 4 de abril, com os dizeres: “Hoje ‘tô’ de bobeira, precisando montar mais algum móvel aí na sua residência? ‘Tô’ perto de você.” Ele também teria dito que estaria esperando Paula* na porta e que gostou muito dela. “Você não contou para ninguém, não, né?”, escreveu ainda. O suspeito teria tentando convencer a vítima de que ela teria consentido o ato, afirmando: “Você lembra que eu te perguntei se você ‘tava’ afim. E você disse que ‘tava’. Só por isso ficamos.”
À 0h46 do dia 13 de maio, por meio de outro número de celular, o suspeito teria enviado um SMS ameaçando Paula*, dizendo que ela tinha 24 horas para retirar a queixa. No final do dia, às 23h52, a jovem recebeu outras mensagens: “Seu tempo acabou. Você retirou a queixa? Espero que toda essa andança sua hoje tenha sido para ir à delegacia desmentir tudo isso.” Conforme os prints, Paula* não respondeu.
Na noite do dia 14, o homem enviou mensagens afirmando que a jovem não havia retirado a queixa, que aquela seria a “última chance dela” e sugerindo que ela tomasse cuidado daqui para frente. No dia 15, enviou outro SMS: “Você não me escutou, então sofra as consequências.”
Ao Estado de Minas, Ana*, que tem prestado apoio a Paula*, afirma que o homem teria aparecido na porta do cursinho da jovem algumas vezes. Elas suspeitam que ele tenha descoberto o local de estudo dela quando esteve na casa de Paula*, onde materiais escolares com o nome do cursinho estavam sobre a escrivaninha.
Segundo estupro
Com as ameaças, Paula* conta que trocou de cursinho, mudou de casa e alterou sua rotina. No dia 2 de junho, ela teria sido surpreendida na Região Central de Belo Horizonte pelo mesmo homem, que descia a rua onde funcionava o cursinho antigo, nas proximidades da nova instituição. “Provavelmente foi o pior dos acasos”, pondera Ana*.
No segundo boletim de ocorrência, registrado em 3 de junho, consta que a vítima teria sido “coagida a entrar em um veículo de aplicativo e levada até um imóvel onde foi mantida sob ameaça, sofrendo nova violência sexual”. Paula* relata que tentou pedir ajuda às pessoas próximas, mas ninguém interveio.
“Quando ele me encontrou da segunda vez, eu achei que ele ia me matar. Me estuprar de novo e me matar”, disse a jovem. Ela afirma que, após sofrer a violência sexual, o homem a fez prometer que retiraria a denúncia. Em seguida, sob a alegação de que outras pessoas estariam chegando ao local, o suspeito teria colocado Paula* em um carro de aplicativo com destino à casa onde ela morava — local do primeiro estupro. Conforme registro médico, Paula* fez exames no hospital poucas horas após a ocorrência.
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“Todo o processo de hospital, delegacia e depoimento se repete, e nossa esperança era que ele fosse pego em flagrante. Mesmo com o estado de completo choque da vítima, conseguimos localizar o endereço por meio de nossa investigação no Google Maps (Street View), mapeando rua por rua até encontrar a casa com o número exato — informação que foi repassada à Polícia Civil (ainda dentro do prazo de 24 horas). Porém, nada foi feito”, afirma Ana.*
Medida protetiva
O advogado criminalista André Vartuli esclarece que qualquer mulher pode solicitar medida protetiva sempre que estiver em situação de vulnerabilidade ou exposta a algum tipo de risco causado por outra pessoa. “A pessoa que solicita (medida protetiva) precisa explicar por que está com medo ou por que entende que está em perigo”, diz o advogado.
Para que a medida seja implementada, é necessário apresentar um mínimo de indício probatório, como, por exemplo, registros de mensagens e ligações recebidas em casos de perseguição (stalking). “A medida protetiva, em si, não é uma resposta do Judiciário. Ela é algo emergencial, um recurso para que o Judiciário possa se movimentar, para que possa ouvir o agressor depois da concessão da medida”, afirma Vartuli.
*Estagiária sob supervisão da subeditora Fernanda Borges