Lipo de papada: pacientes de dentista denunciada temem impunidade
Profissional segue com registro ativo e realizando cirurgias. Processo ficou parado seis meses na Justiça enquanto era digitalizado
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Siga noPacientes que adquiriram infecções num surto de micobactérias na clínica da cirurgiã-dentista Camila Groppo, que atendia na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, temem que a situação seja esquecida enquanto o processo contra a profissional segue a passos lentos na Justiça.
As infecções teriam sido causadas no final de 2023 por má esterilização de equipamentos durante procedimentos de lipo de papada - na época, o estabelecimento chegou a ser interditado pela Vigilância Sanitária por irregularidades que traziam risco à saúde dos pacientes. Camila segue atendendo e realizando as cirurgias, ao passo que o Conselho Regional de Odontologia (CRO-MG) diz que uma apuração das denúncias está em andamento.
O indiciamento da cirurgiã-dentista foi concluído pela Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) no final de julho, após a investigação apontar que Camila praticou lesão corporal leve e grave contra 21 pacientes em cirurgias ocorridas no final de 2023 e começo de 2024.
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Na época, as vítimas foram submetidas a um procedimento chamado popularmente de “lipo de papada”, no qual são utilizadas cânulas para aspirar a gordura da região abaixo do queixo. A má esterilização do material teria sido a causa das infecções nas vítimas.
Algumas das pacientes infectadas continuam em tratamento com o uso de antibióticos, mais de um ano depois de terem feito os procedimentos. É o caso da cuidadora de idosos Jéssica Fernanda da Cruz, de 32 anos, que precisou passar por uma cirurgia no mês passado para tentar retirar a bactéria do seu corpo, definida pelos médicos como super resistente.
Agora, ela espera o resultado de uma biópsia para saber se vai precisar voltar a fazer tratamento três vezes na semana no Hospital Eduardo de Menezes, no Barreiro. “Estou tomando antibiótico desde abril e não está resolvendo nada”, conta.
Quando o caso de Jéssica e de outras dezenas de pacientes vieram à tona, as autoridades de saúde abriram investigação para apurar as denúncias de irregularidades nos procedimentos da clínica. Tanto que em 11 de março do ano passado a Vigilância Sanitária fechou o estabelecimento após identificar irregularidades que colocavam em risco a saúde dos pacientes.
No final do mesmo mês, a Secretária de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) e a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) confirmaram surto de micobactéria não tuberculosa de crescimento rápido (MCR) na clínica, sendo identificado ao menos duas bactérias diferentes que teriam infectado as pacientes.
Desde então, a cirurgiã-dentista Camila Groppo deixou de atender na clínica que carregava seu nome, mas isso não impediu que ela se afastasse das salas de cirurgia. Em seu perfil no Instagram, a profissional posta vídeos e fotos de pacientes após a realização dos procedimentos estéticos e convida os seguidores a fazerem também. Entre as cirurgias ofertadas estão lipo de papada, que segue como carro-chefe da dentista, bichectomia e preenchimento facial, mas sem quaisquer referências de em qual clínica são feitas. O silêncio segue nas postagens, onde os comentários são fechados.
Impunidade
Além de lesão corporal, Camila Groppo também foi indiciada pela Polícia Civil pelo uso de documento falso. A dentista, inclusive, chegou a ter a sua habilitação no CRO-MG suspensa na época das denúncias, pois havia passado o prazo de dois anos para a entrega do diploma de conclusão de curso e, portanto, o registro estava fora da validade. A situação foi resolvida semanas depois, quando a profissional apresentou ao conselho o diploma válido.
Camilla segue com o registro ativo no CRO-MG, conforme explicou o órgão à reportagem. Ainda segundo o conselho, “em razão dos fatos denunciados, há processos éticos em andamento para apuração da conduta profissional da cirurgiã-dentista. Os processos correm sob sigilo”.
No âmbito criminal, as investigações foram concluídas e a denúncia foi aceita pela Justiça em julho do ano passado. Porém, em agosto, a tramitação foi paralisada para que o processo fosse digitalizado, o que só foi concluído seis meses depois. A movimentação mais recente data de 14 de março.
A demora para o andamento do processo e realização das audiências tem provocado apreensão nas pacientes que foram vítimas do surto. As vítimas, inclusive, ainda não receberam qualquer tipo de indenização pelos danos causados. Nas palavras de Jéssica Fernanda da Cruz, a sensação do momento é de impunidade. “A gente está colhendo os frutos até hoje. Ela (Camila) está agindo normalmente, trabalhando, como se nada tivesse acontecido, e a gente sofrendo aqui do outro lado”, desabafa.
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A reportagem tentou contato com a defesa de Camila Groppo, mas não conseguiu localizar o responsável. O espaço segue aberto para posicionamento dos envolvidos.