Ana Paula no interior do quarto do filho, juntando o que eram os brinquedos da criança -  (crédito: Edesio Ferreira/EM/D.A Press)

Ana Paula no interior do quarto do filho, juntando o que eram os brinquedos da criança

crédito: Edesio Ferreira/EM/D.A Press

Desde o acidente envolvendo o caminhão-tanque que tombou e explodiu no Bairro Goiânia, Região Nordeste de Belo Horizonte, na madrugada da quinta-feira, 14/3, os dias da comerciante Ana Paula Garcia, de 38 anos, estão diferentes. A rotina de vendas em sua loja foi substituída pelo trabalho de tentar salvar o que não foi consumido pelas chamas no dia do acidente e pela ansiedade sobre o que está por vir.

 

Eram quase três horas da manhã, e Ana estava finalizando questões do trabalho com o marido, Said, quando foi surpreendida pelo barulho da explosão. Da janela da sala, ela viu as chamas descendo e invadindo a rua rapidamente. Em poucos minutos, sua casa já estava pegando fogo. Para se proteger, o casal e os dois filhos se esconderam no banheiro. “Como meu marido trabalha até mais tarde, a gente estava acordado. Ele estava no quarto e eu na sala. Ouvi a batida, corri para a janela e vi a explosão. Meus filhos acordaram e a gente tentou sair, mas o fogo empurrou a gente. Tentamos sair pelo terraço e lá já estava tomado pelo fogo. Descemos e nos escondemos no banheiro”, contou.

 

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O Estado de Minas voltou ao local do acidente na manhã desta quinta-feira (21) e encontrou uma comunidade unida, tentando retomar a normalidade. As obras de reparo dos imóveis já foram iniciadas, algumas delas financiadas pela empresa Jbretas, proprietária do caminhão que explodiu. Alguns dos moradores ainda estão morando em hotéis fornecidos pela empresa.

 

O imóvel da família de Ana Paula foi totalmente consumido pelas chamas. Televisão, camas, computadores, sofás e até mesmo placas solares foram perdidas. Desde então, eles estão em um quarto de um hotel no Centro da capital, e passam o dia na casa onde moravam tentando recolher alguns itens que não foram queimados. “Conversamos com a empresa que, até então, disse que ia dar todo o suporte para a gente. Estamos desde o dia 15 no hotel. Temos um suporte com a alimentação lá, mas está inviável. Temos que ficar aqui em casa o dia todo”, explicou.

 

 

“Estamos buscando casa para alugar. A empresa de início disse que poderíamos buscar um imóvel compatível com a nossa casa, mas o aluguel está muito caro e não sei como vai ser, se estão dispostos a pagar pelo menos algo parecido com a nossa casa. Mas não podemos ficar no hotel, os quartos são pequenos, não cabem mais que duas pessoas”, completou Ana.

 

Reclamações

 

Os moradores reclamam da falta de assistência da Jbretas com algumas questões, sendo a segurança do local também uma das preocupações. Ana conta que a região é considerada perigosa pela vizinhança e, com as casas abertas, ainda que queimadas, poderiam servir como atrativo para criminosos.

 

Ela teve que comprar um portão novo de entrada para proteger o que restou dentro do imóvel. “Aqui tem muito trânsito de pessoas que usam drogas, estávamos vigiando mesmo. Chegaram a tentar entrar aqui em casa. Precisamos pagar um segurança. Estamos vindo aqui todo dia para retirar o que restou. Ainda salvou alguma coisa na cozinha. Ficamos com medo porque é o que ainda temos”, disse.

Medo compartilhado por Nicolas Viegas. O perito veicular morava no lote mais abaixo e que também ficou bastante destruído, mas, por sorte, a casa do rapaz foi a menos atingida.

 

Em um senso de cooperação, ele passa o dia ajudando nas obras dos vizinhos e, à noite, trabalhando quase que como um segurança. “Eu estou dando essa atenção aqui, mas estou deixando de trabalhar para isso. Não queria estar fazendo isso, mas sobrou para mim. A empresa não está dando a atenção devida. Corremos atrás do nosso direito e eles não estão fazendo a obrigação deles. Tinha que ter umas 40 pessoas trabalhando aqui dentro”, contou para a reportagem.

 

“Ajudei a limpar, mexer nas coisas e agora é vigiar”, desabafou Nicolas.

 

Vítimas

 

Dois dos sobreviventes seguem internados. Catia Lúcia teve 40% do corpo queimado e se recupera no Hospital João XXIII. Segundo sua filha, Angélica Viana, apesar de não ter previsão de alta, ela está bem. “Ela vai passar as próximas semanas hospitalizada, mas já saiu do CTI e está no quarto. Muito bem tratada, em uma ala só para queimaduras. Ela só sente muita dor, o que é normal. Agora é esperar ela se recuperar mesmo”, disse.

 


Cátia estava sozinha em casa no momento do acidente. Para fugir do fogo ela pulou do segundo andar sobre um carro em chamas e teve queimaduras de 2º grau do lado direito do corpo, principalmente nos braços, barriga e pernas.

 

 Moradores ainda somam os prejuizos do acidente

Moradores ainda somam os prejuizos do acidente

Edesio Ferreira/EM/D.A Press

 

A situação mais grave é de Belarmino de Freitas Miranda. Ele teve mais de 70% do corpo queimado e passou por cirurgias na unidade hospitalar. Ele segue em coma induzido.

 

Empresa

 

A reportagem do Estado de Minas entrou em contato com o sócio da Jbretas, Felipe Bretas. Ele explicou que está ciente da dificuldade da situação, mas que estão fazendo o possível para auxiliar as famílias. “Sei que a situação é bastante complicada, mas estamos fazendo tudo que está ao nosso alcance. Continuamos em contato com todas as famílias afetadas”, disse.

 

A empresa também emitiu um comunicado. Veja na íntegra:

 

"Desde o momento em que tomamos conhecimento do acidente, estamos empenhados em prestar toda a assistência possível às pessoas afetadas. Nossa prioridade, desde então, foi garantir o suporte às vítimas hospitalizadas, fornecendo apoio emocional, recursos materiais, como mantimentos, medicamentos, e até mesmo aluguel.


Desde o dia seguinte ao ocorrido, nos reunimos com os moradores afetados pela tragédia, comprometendo-nos a encontrar soluções e oferecer o devido ressarcimento pelos danos causados. Estamos trabalhando incansavelmente para garantir que todos os afetados recebam o apoio necessário e sejam devidamente compensados.

 

Reiteramos nosso compromisso com a transparência e a responsabilidade durante todo o processo de investigação e resolução desta situação. Estamos cooperando plenamente com as autoridades competentes para entender as circunstâncias que levaram a este acidente".

 

Relembre o acidente

 

Na madrugada de quinta-feira (14/3), por volta das 2h25, um caminhão-tanque tombou, pegou fogo e incendiou casas e carros às margens do Anel Rodoviário, no Bairro Goiânia, Região Nordeste de Belo Horizonte. O motorista, de 58 anos, morreu carbonizado no local do acidente.

 

Com o impacto da queda, o tanque foi danificado e a carga de combustível vazou, escorreu e criou uma ‘rua de fogo’, levando as chamas por três quarteirões. Oito residências e dez veículos foram atingidos. Famílias saíram às pressas de casa e pelo menos nove pessoas — quatro homens, três mulheres e duas crianças — tiveram lesões como queimaduras ou pequenos traumas na tentativa de se salvarem.

 

De acordo com informações, o caminhão-tanque saiu de Betim, na Grande BH, com destino a Sabará. Ele seguia na BR-381, ao virar à direita para entrar na MG-5, antiga MGC-262, o veículo tombou e pegou fogo. A tragédia pegou os moradores de surpresa, já que a maioria estava dormindo.