
Recordista de indicações ao Oscar, "Emilia Pérez" revolta mexicanos
Longa do francês Jacques Audiard indicado em 13 categorias é considerado desrespeitoso com a crise provocada pelo narcotráfico no país em que sua trama se situa
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Siga noAplaudido em Hollywood e repudiado no México, "Emilia Pérez", o musical francês de Jacques Audiard,sobre uma narcotraficante transgênero, seduziu o mundo cinéfilo, mas irritou o país em que se inspirou por supostamente banalizar o drama da violência criminal.
O filme recebeu na última quinta-feira (23/1) 13 indicações ao Oscar, liderando a competição deste ano e estabelecendo um recorde para uma obra em língua não inglesa. Ele concorre em quase todas as principais categorias: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Atriz, Melhor Atriz Coadjuvante, Melhor Fotografia, Melhor Edição. A estreia do longa no Brasil está prevista para o próximo dia 6 de fevereiro.
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"'Emilia Pérez' é tudo de ruim em um filme: estereótipos, ignorância, falta de respeito, lucro em cima de uma das crises humanitárias mais graves do mundo (desaparecimentos massivos no México). Ofensivo. Frívolo", disse a jornalista mexicana Cecilia Gonzáles, em sua conta no X (ex-Twitter).
Inverossímil
O diretor de fotografia Rodrigo Prieto (“Barbie” e “Assassinos da Lua das Flores”) fez a primeira crítica negativa ao filme, que foi gravado em um cenário francês com algumas externas noturnas no México.
Salvo o trabalho da atriz mexicana Adriana Paz, "tudo me parece inverossímil", resumiu em uma entrevista à revista “Deadline”.
"Principalmente quando o tema é muito importante para os mexicanos", acrescentou, referindo-se aos mais de 30 mil assassinatos anuais e mais de 100 mil pessoas desaparecidas, registros ligados em sua maioria à narco-criminalidade.
“Não tenho nada contra o fato de não mexicanos dirigirem filmes sobre o México, mas os detalhes são importantes. Temos o caso de Ang Lee. Ele é de Taiwan e fez 'Brokeback Mountain', mas se concentrou nos detalhes”, afirmou.
“O filme banaliza o problema dos desaparecidos no México”, acusa Artemisa Belmonte, que lançou uma petição no site change.org para se opor ao lançamento do filme .
É “um dos filmes mais grosseiros e enganosos do século 21”, escreveu o escritor Jorge Volpi no diário “El País”, no início deste mês. Ele também destacou o sotaque de Selena Gómez, irritante para a fibra nacionalista dos mexicanos.
Ele se pergunta qual seria a reação se um cineasta mexicano, seja Alfonso Cuarón, Alejandro González Iñárritu ou Guillermo Del Toro, tivesse feito um filme sobre os tumultos nos subúrbios franceses em um estúdio no México e com atores latinos de Hollywood interpretando franceses.
O ator mexicano Eugenio Derbez, que também tem uma carreira em Hollywood, chamou o sotaque de Gomez de “indefensável”.
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“Desculpe-me, fiz o que pude com o tempo que me foi dado”, respondeu a atriz. O mexicano terminou pedindo desculpas: “Como latinos, devemos apoiar uns aos outros”.
Pedido de desculpas
O diretor Jacques Audiard (“De tanto bater meu coração parou”, “O profeta”, “Ferrugem e osso”) se defende com o argumento de que “é uma ópera” e, portanto, “irreal”. Mas ele fez um exercício de mea-culpa em uma apresentação no México: “Se vocês acharem chocante, estou pronto para pedir desculpas”.
“[A presença no elenco de] Selena e Zoe [Saldaña, indicada ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante] dá [ao filme] uma dimensão comercial, não há como negar”, disse ele em Bogotá, quando questionado em uma entrevista sobre os poucos mexicanos no elenco.
“Não acho que Gene Kelly tenha ido a Paris para fazer 'Um Americano em Paris'”, disse o cineasta mexicano Guillermo Del Toro em defesa do filme. O diretor de “O labirinto e o fauno” elogiou publicamente “Emilia Pérez” e disse considerar Audiard brilhante.
Outro defensor do filme é o crítico do jornal “Milenio” Álvaro Cueva. “Se os grandes mestres do cinema, como Federico Fellini e Luis Buñuel, estivessem vivos, esse é o tipo de filme que eles fariam”, afirmou, num comentário que também gerou polêmica.
Angie Orozco, pesquisadora do estado de Nuevo León, no Norte do país, não se importa com o fato de ser um musical, mas pede que ele trate o México “com respeito” e com a “intenção de ajudar”.
“Espero que todo esse barulho possa ser aproveitado. Espero que deixemos o superficial e cheguemos ao fundo do que os desaparecimentos implicam. Precisamos dar uma olhada nessa crise”, disse ela ao “Milenio”.