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Estado de Minas PENSAR

Maíra Nassif: 'A literatura é protagonista na Relicário'

Rumo aos 10 anos, editora mineira define os próximos objetivos: nova identidade visual e ampliação de publicações e funcionários


30/06/2023 04:00 - atualizado 07/08/2023 17:38
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Na casa no Bairro Floresta, onde fica a sede da Relicário, Maíra Nassif mostra a edição em capa dura e bilíngue de 'Poesia completa' de Beckett: 'Tenho orgulho'
Na casa no Bairro Floresta, onde fica a sede da Relicário, Maíra Nassif mostra a edição em capa dura e bilíngue de "Poesia completa" de Beckett: "Tenho orgulho" (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)

 

O tempo foi essencial para que a Relicário fortalecesse seu projeto editorial. Na clausura imposta pela pandemia, a editora Maíra Nassif concentrou todos os seus esforços e lançou títulos que se tornaram divisores de águas para a editora: “Batendo pasto”, livro de poemas de Maria Lúcia Alvim, em agosto de 2020, e “O ausente”, romance de Edimilson de Almeida Pereira, em dezembro.

 

O tempo também foi essencial para que os dois livros viessem a cabo. O primeiro estava engavetado havia 38 anos e sua autora, vivendo em uma casa de idosos em Juiz de Fora, tinha dado ordens expressas de que ele só deveria vir a público após sua morte. Dono de extensa (e reconhecida) produção poética, Edimilson levou 18 anos reescrevendo “O ausente” até dar o seu primeiro romance como finalizado.

 


 

Entre novembro e dezembro de 2021, os dois foram premiados. Receberam, respectivamente, o Jabuti de poesia e o segundo lugar do Oceanos. Maria Lúcia chegou a ver a edição de “Batendo pasto”, mas não o Jabuti – sucumbiu à COVID em fevereiro de 2021, aos 88 anos.

 

Em outubro, a Relicário completa sua primeira década com 150 títulos publicados. Sete foram lançados neste ano; outros 15 estão previstos até o fim de 2023. “Estamos hoje bem colocados nas livrarias, temos site (para venda própria), nossa tiragem é boa em comparação à época em que começamos. Dentro do meio independente, há muitas diferenças. Tem as pequeníssimas, que não têm intenção de crescer. Sob este aspecto, estamos caminhando para ampliar tanto o número de livros quanto o de funcionários”, afirma Maíra Nassif.

 

 

Graduada em filosofia pela UFMG e mestre em estética e filosofia da arte pela mesma instituição, Maíra, de 38 anos, montou a editora depois de uma experiência como produtora editorial. Assim que terminou o mestrado, quis trabalhar fora da universidade. Trabalhou em outra editora até fundar a sua própria, que começou com foco em livros acadêmicos – o título inicial foi “Personagens conceituais: filosofia e arte em Deleuze”, de Fernando Tôrres Pacheco.

 

“Depois de três anos, comecei a ter a linha editorial mais definida, voltada para a literatura, que hoje é protagonista, e ensaios”, continua. O best-seller da Relicário é “Escrever”, com cinco ensaios de Marguerite Duras, título que em 2021 deu início à coleção que a editora dedica à autora francesa (e que está no quarto volume). “Escrever” está em sua segunda reimpressão. 

 

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Já o xodó de Maíra é “Poesia completa” do irlandês Samuel Beckett (1906-1989). "É uma edição em capa dura, bilíngue, o Beckett é uma figura superimportante, Nobel. Tenho orgulho da publicação." Mesmo com cânones no catálogo, a Relicário publicou autores inéditos no país. Entre eles o poeta austríaco Ernst Jandl ("Eu nunca fui ao Brasil").

 

“Gosto muito de trazer para o Brasil autores internacionais que já têm repercussão em seus países. Ela é importante para que a gente tenha uma noção”, explica. Em relação a brasileiros, a Relicário não recebe originais. “Por falta completa de disponibilidade de avaliar. Mesmo assim, as pessoas mandam. Hoje publicamos muito por indicações e ainda autores que já conhecemos. Diferentemente de algumas editoras, para a gente é um pouco mais difícil apostar no ineditismo total.”

 

 

Localizada em uma casa na Floresta, Zona Leste de Belo Horizonte – a editora mora em outro andar do mesmo imóvel –, a Relicário conta com equipe enxuta. São três profissionais e Maíra Nassif. 


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Além dos títulos já citados, a editora lançou outros livros premiados, como “Deriva”, poemas de Adriana Lisboa (semifinalista no Jabuti e Oceanos), “Como se fosse a casa: uma correspondência”, com a troca de poemas de Ana Martins Marques e Eduardo Jorge (Prêmio Bravo!), e o romance “Uma exposição”, de Ieda Magri (segundo lugar no prêmio Biblioteca Nacional).

 

“Quero que nossos projetos autorais, aqueles que realmente partem da editora, que têm relação com curadoria, pesquisa e desejo, sejam hegemônicos na Relicário”, acrescenta Maíra. 

 

Nos últimos anos, tais lançamentos têm se intensificado. O tempo, mais uma vez, está a favor da Relicário.  

 

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Entrevista/Maíra Nassif
“Adoraria ter sido a primeira editora de Cortázar  no Brasil”

 

Quais os maiores desafios de ser uma editora no Brasil?

Me interessa falar de uma questão atual que é puramente material: os custos de impressão dos livros. Devido ao monopólio da indústria do papel e ao aumento do dólar nos últimos tempos, o custo de impressão praticamente dobrou de três anos para cá. Isso nos traz várias dificuldades. A mais imediata é o aumento do preço do livro no mercado e, portanto, a inviabilidade de sua plena democratização. Muita gente fala que o Brasil não tem leitores, mas antes de responsabilizarmos os indivíduos, vale nos perguntarmos se as condições oferecidas para o acesso ao livro são também satisfatórias. Faltam apoio, regulação do mercado, quebra de monopólios e por aí vai. 

 

Quais serão os próximos capítulos de sua editora?

Estamos preparando ainda para 2023, em comemoração aos nossos 10 anos, uma nova identidade visual. Também teremos festa! Sobre os livros, a nossa grade de 2024 já está praticamente completa, com muita literatura.

 

Quais livros ou autores, brasileiros ou estrangeiros, gostaria de ter sido a primeira a editar?

Acho que para essa pergunta vale uma resposta a partir da nossa paixão como leitora: adoraria ter sido a editora de Julio Cortázar no Brasil. Um autor lido no final da adolescência e que abriu um mundo a partir da primeira página. Mas tenho a alegria de dizer que fui a primeira a editar a obra poética de sua amiga Alejandra Pizarnik no Brasil. Ela, inclusive, chegou a perder o manuscrito de “O jogo da amarelinha” e achar alguns dias depois, para completo desespero do amigo. Já pensou? 

 


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