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O vídeo do médico americano Robert Malone sobre a vacinação em crianças tem alegações infundadas

Ele afirma que vacinas de RNA mensageiro (mRNA) podem "danificar o sistema reprodutivo", mas cientistas afirmam que isso carece de contexto


23/12/2021 22:01 - atualizado 29/12/2021 11:00

Um vídeo no qual o médico americano Robert Malone argumenta contra a vacinação de crianças contra a covid-19 foi compartilhado mais de 1,5 mil vezes desde meados de dezembro de 2021.

Especificamente, ele afirma que as vacinas de RNA mensageiro (mRNA) podem "danificar o sistema reprodutivo", "reinicializar geneticamente o sistema imunológico" e que são necessários "cinco anos" para conhecer os riscos associados a essa tecnologia.

No entanto, cientistas consultados pela AFP afirmam que essas alegações são infundadas ou carecem de contexto.

“Dr. Robert Malone, o ‘pai da tecnologia MRNA nas vacinas’ trazendo um alerta sem igual para não vacinar as crianças... ‘A vacina genética é uma decisão irreversível’ E agora... a ANVISA autorizou que isso aconteça... com a Pfizer que tem esse MRNA... parabéns ANVISA GENOCIDA !”, diz uma das publicações compartilhadas no Twitter (1, 2, 3), no Facebook (1, 2, 3) e no Instagram (1, 2).

No vídeo viralizado com pouco menos de 5 minutos de duração, Malone, de frente para a câmara, afirma em inglês: “Quero que conheçam os fatos científicos sobre essa vacina genética que se baseia na tecnologia de mRNA que inventei”.
Captura de tela feita em 23 de dezembro de 2021 de uma publicação no Twitter
Captura de tela feita em 23 de dezembro de 2021 de uma publicação no Twitter ( . / )

Conteúdo semelhante também circulou em francês, espanhol, alemão, árabe, italiano e catalão.

Robert Malone é um cientista cuja pesquisa no final dos anos 1980 contribuiu para o desenvolvimento de vacinas de mRNA, uma tecnologia usada nos imunizantes contra a covid-19 da Moderna e da Pfizer/BioNtech. Em seu Twitter, ele se descreve como "o inventor da vacina de mRNA". No entanto, muitos outros especialistas estiveram envolvidos em seu desenvolvimento por várias décadas.

Algumas das alegações expostas por Malone no vídeo viralizado carecem de fundamento ou contexto, segundo especialistas consultados pela AFP.

1 - As proteínas “spike” são "tóxicas" e "costumam causar danos permanentes a órgãos críticos em crianças": Sem fundamento

Na gravação, Malone se refere à proteína "spike" ou "S", que desde o início das campanhas de vacinação tem sido alvo de inúmeros rumores sobre sua alegada periculosidade e viralidade, desinformação já verificada pela AFP em diversas ocasiões (1, 2, 3).

Localizada na superfície do SARS-CoV-2, a proteína spike permite a adesão e a entrada do vírus nas células humanas para infectá-las, além de lhe dar o formato característico de coroa. Essa partícula é essencial no funcionamento das vacinas de mRNA, que não contêm a proteína em si, mas um manual genético para que ela seja gerada pelo organismo para que, assim, possa se proteger quando se depara com o coronavírus.

O mRNA entra pelas células musculares e instrui o mecanismo celular a produzir uma porção inofensiva de algo chamado proteína S. (...) Uma vez que o corpo fabrica a porção da proteína, nossas células quebram o mRNA e o eliminam”, explica o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos em seu site.

No entanto, a teoria de que uma proteína spike vacinal poderia ser perigosa foi desmentida por vários especialistas nesta verificação da AFP em junho de 2021.

Daniel Dunia, diretor de pesquisa do Centro Nacional Francês de Pesquisa Científica (CNRS), explicou à AFP em um artigo de 9 de dezembro de 2021 que "a vacina de RNA mensageiro é injetada localmente no músculo, e a expressão da proteína spike é limitada às células que ela inicialmente almeja para desencadear a resposta imune. O mRNA é instável e se degrada rapidamente".

Uma busca pelas palavras-chave em inglês “vaccine, covid, spike, damage, children” no banco de dados da Biblioteca Nacional dos Estados Unidos, PubMed, não levou a nenhum estudo médico publicado até 23 de dezembro de 2021 relatando danos da proteína spike em crianças após a vacinação contra covid19.

Uma recomendação da Agência Europeia de Medicina sobre o assunto indica que a vacinação pode ter efeitos adversos em crianças, embora leves, mas em nenhum caso menciona envolvimento de órgãos críticos.

Em um documento sobre os mitos da vacinação infantil contra a covid-19, o CDC aponta para a segurança da imunização: “Em ensaios clínicos da vacina contra a covid-19 que foram realizados com milhares de crianças, não foram identificados casos graves de pós-vacinação, problemas de segurança e os efeitos colaterais foram leves e não duradouros. Algumas crianças não terão efeitos colaterais e efeitos colaterais graves são pouco frequentes".

2 - "Não se pode consertar um sistema imunológico geneticamente restaurado": Sem fundamento

Malone diz no vídeo que não é possível "consertar um sistema imunológico geneticamente restaurado". Mas essa analogia entre vacinação e terapia gênica, que costuma ser usada para instalar medo sobre uma suposta modificação do DNA, é contestada por acadêmicos. Especialistas consultados pela AFP lembraram que, ao contrário de certas terapias genéticas, as vacinas contra covid-19 não têm a capacidade de modificar o DNA humano.

"O objetivo da terapia gênica é claramente modificar o DNA para reparar um gene defeituoso. O vetor, seja um adenovírus ou um retrovírus, permitirá a integração no genoma de um gene normal não mutado, o que permitirá o reparo da função defeituosa", algo que não acontece com vacinas anticovid de mRNA, explicou à AFP em agosto de 2021 Thierry Walzer, diretor de pesquisa do Instituto Nacional Francês de Saúde e Pesquisa Médica (Inserm), ligado ao Centro Internacional de Pesquisa em Doenças infecciosas de Lyon.

Infografia mostra imunidade a partir do código genético
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Além disso, o RNA mensageiro é muito frágil para integrar o núcleo da célula e modificar o genoma: “Com essas vacinas trazemos uma molécula de RNA que fará com que as células do sistema imunológico produzam a proteína spike do vírus de forma muito transitória, o que fará com que os linfócitos reajam, mas este RNA não persiste e não permanece no corpo”, disse também à AFP, em agosto passado, Anne Galy, diretora do laboratório público de pesquisas tecnológicas em terapia genômica do Inserm.

3 - "Esta vacina pode causar dano ao sistema reprodutivo": Sem provas

A teoria de que as vacinas prejudicam o aparelho reprodutor ou causam infertilidade, por afetar a proteína conhecida como sincitina, envolvida no desenvolvimento da placenta, circula com frequência nas redes sociais. No entanto, isso não tem base científica. O risco de o organismo “perder” essas capacidades é mesmo inexistente, conforme explicaram vários especialistas à AFP neste artigo de dezembro de 2020.

Outras pesquisas vão na mesma direção. Um estudo em animais, no qual a vacina da Pfizer foi administrada antes e durante a gravidez, não encontrou efeitos adversos relacionados ao imunizador na fertilidade e no desenvolvimento fetal, explica a fabricante em seu site.

Outro estudo publicado em abril de 2021 no New England Journal of Medicine, que avaliou 35.691 mulheres grávidas que haviam recebido a vacina, "não mostrou nenhum risco particular" para sua saúde.

Essa teoria também circulou associada ao sistema reprodutivo dos homens, mas também não tem fundamento. "A vacina de RNA permanece localmente, não vai se espalhar por todos os lados em seus testículos, que são um santuário imunológico. E nunca vacinamos ninguém nos testículos", disse o professor Jean-Daniel Lelièvre, imunologista do Henri Mondor hospital de Créteil, em 16 de março de 2021 à AFP.

A AFP já verificou conteúdos semelhantes (1, 2).

4. "Esta nova tecnologia [mRNA] não foi testada adequadamente": Sem fundamento

As vacinas anticovid que utilizam o mRNA citadas por Malone são as desenvolvidas pela Pfizer/BioNTech e pela Moderna. No entanto, os resultados da fase 3 (a última) dos ensaios clínicos que ocorrem com milhares de voluntários foram publicados em dezembro de 2020 para ambos os imunizantes (1, 2), embora possam ser atualizados dependendo das autorizações, inicialmente emergenciais, recebidas de agências de saúde locais.

Como parte desse procedimento emergencial, a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) concedeu o seu aval por um ano renovável, e destacou que as vacinas contra a covid-19 só podem ser autorizadas na Europa se "cumprirem todos os requisitos de qualidade, segurança e eficácia definidos na legislação farmacêutica da União Europeia".

Nos Estados Unidos, a regularidade de certos ensaios clínicos da vacina da Pfizer foi contestada em novembro de 2021 por um ex-funcionária da Ventavia, uma empresa terceirizada para conduzir uma pequena parte dessas análises em nome da gigante farmacêutica. Segundo a mulher, ocorreram violações durante alguns desses exames.

No entanto, essa empresa testou somente mil pessoas, enquanto a vacina, no total, foi avaliada em cerca de 44 mil pacientes em todo o mundo. Após essas acusações, as autoridades da Food and Drug Administration (FDA) dos EUA reiteraram sua "total confiança nos dados que deram suporte à autorização da vacina Pfizer / BioNTech".

Laboratório para embalagem de vacinas de mRNA contra covid-19 em Garín, província de Buenos Aires, em 22 de setembro de 2021
Laboratório para embalagem de vacinas de mRNA contra covid-19 em Garín, província de Buenos Aires, em 22 de setembro de 2021 (foto: AFP / Juan Mabromata)

5 - São necessários "pelo menos 5 anos" para avaliar os riscos de mRNA, e os efeitos adversos de medicamentos mais novos "muitas vezes ocorrem anos depois": Sem fundamento

Até o momento, os dados científicos não sustentam essas duas afirmações. A Academia Francesa de Medicina se recusa a descrever o RNA mensageiro como "novo", o qual, como explica um documento publicado em 4 de agosto de 2021, "cientistas e industriais desenvolveram e melhoraram por mais de trinta anos" e que "demonstrou ser muito eficaz para a vacinação contra o SARS-CoV-2".

Além disso, as vacinas autorizadas para o combate ao coronavírus são, como qualquer novo medicamento, submetidas a uma fase de farmacovigilância para controle de seus efeitos colaterais. Em 2021, a segurança dos imunizantes continua a ser monitorada de perto pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que identifica e investiga quaisquer reações adversas que ocorram após a administração de uma vacina.

6. "Não há nenhum benefício da vacinação para seus filhos e sua família dado o baixo risco do vírus": Sem contexto

Esse argumento de Malone, que ignora os casos graves aos quais algumas crianças podem estar expostas, é refutado por Jean-Daniel Lelièvre, chefe do departamento de doenças infecciosas do Hospital Henri-Mondor de Créteil e especialista no assunto na Haute Autorité de Santé, na França. “A criança tem um lugar especial na infecção de covid-19, que é muito menos grave que a do adulto, mas não é nula”, explicou à AFP em 20 de dezembro de 2021.

“Não podemos dizer que as crianças não representam um reservatório e que não há risco para as crianças, mesmo que esse risco seja muito inferior ao dos adultos”, acrescentou.
Uma criança é vacinada contra a covid-19 em um posto de vacinação em Lisboa, em 18 de dezembro de 2021
Uma criança é vacinada contra a covid-19 em um posto de vacinação em Lisboa, em 18 de dezembro de 2021 (foto: AFP / Patricia De Melo Moreira)

“Do ponto de vista individual, sabemos que há crianças muito expostas a formas graves, principalmente quando o sistema imunológico está falhando, quando há patologias crônicas de base, quando estão imunossuprimidas”, explica Vincent Maréchal, pesquisador em virologia na Universidade de Paris Sorbonne.

A OMS destacou em um comunicado no dia 24 de novembro que, embora haja proporcionalmente menos infecções sintomáticas e casos graves da doença em crianças e adolescentes, eles podem apresentar sintomas prolongados e até sequelas. Uma delas seria a síndrome inflamatória multissistêmica (SIM-C) que, “embora rara, tem sido relatada em todo o mundo e dificulta a recuperação”.

A Academia de Medicina francesa considera, por sua vez, que “o princípio ético, segundo o qual a vacinação de crianças com pouco risco de desenvolver formas graves da doença, não deve servir (...) para compensar a rejeição de vacinação de certos adultos".

Em dezembro de 2021, vários países já começaram a vacinar crianças menores de 12 anos, incluindo Chile, Argentina, Colômbia, Estados Unidos, Israel, França e Espanha.

No Brasil, a Anvisa aprovou a vacinação de crianças entre 5 e 11 anos, mas o Ministério da Saúde decidirá sobre a sua implementação em 5 de janeiro de 2022, após realizar uma consulta pública.

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