O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulga nesta sexta-feira (3/12), a edição 2020 da Síntese de Indicadores Sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira.
A pesquisa mostra indicadores sobre: estrutura econômica e mercado de trabalho; padrão de vida e distribuição de rendimentos; educação; habitação e saúde. Os recortes por grupos populacionais destacam as desigualdades de rendimentos, gênero, cor ou raça e grupos de idade e sua evolução em séries históricas em muitos dos indicadores.
Mercado de trabalho
Os dados da pesquisa mostram que, até 2014, o mercado de trabalho brasileiro apresentou aumento da ocupação, sobretudo do emprego formal, e redução da desocupação, que atingiu naquele ano sua menor taxa na série.
Nos anos seguintes, porém, esses resultados positivos foram revertidos, completa ou parcialmente, embora com discreta melhora em 2018 e 2019. Nesse contexto de recuperação insuficiente, em 2020, a pandemia da COVID-19 trouxe consequências danosas à saúde da população, afetando também a economia. Tanto a queda da renda quanto a destruição dos postos de trabalho atingiram recordes históricos no último ano da década atual.
A taxa de desocupação teve forte crescimento nos anos de 2015 a 2017, tanto no Brasil quanto em Minas Gerais. A queda da taxa nos anos de 2018 e 2019 foi bruscamente interrompida em 2020, com aumento significativo da taxa de desocupação devido à crise sanitária. Já, a taxa de subutilização composta da força de trabalho apresentou forte crescimento entre os anos de 2015 e 2018, ano em atingiu 24,7% no país e 23,9% em Minas Gerais.
Em 2019, teve ligeira queda, apesar de permanecer em patamar elevado, atingindo 24,4% e 23,1%, respectivamente, no país e no estado. Em 2020 a taxa de subutilização composta da força de trabalho apresentou o maior valor da série histórica, com percentuais de 27,0% em Minas Gerais e 28,3% no Brasil. De modo geral, ambas as taxas são maiores entre as mulheres, entre os mais jovens (14 a 29 anos) e entre os que declararam ser de cor ou raça preta ou parda, tanto no país quanto no estado.
Busca pelo emprego
Outro indicador social que chama a atenção é o da distribuição percentual dos desempregados por tempo sem trabalhar e procurando emprego. Em Minas, a proporção de desocupados que procuram trabalho, entre mais de um mês a quase um ano, subiu de 45% em 2012 para 62,4% em 2020.
“Este dado subiu bastante, desde que começou a pesquisa, em 2012. Isso mostra uma piora no mercado de trabalho e indica uma dificuldade maior de quem está procurando, conseguir trabalho’, explica Alexandre Veloso, analista do IBGE,
De acordo com ele, este aumento também está relacionado com a pandemia da COVID-19.
“Ano passado tivemos até uma situação um pouco anômala, com a diminuição do número de ocupados e de desocupados, já que muita gente nem procurou trabalho, até por restrições sanitárias. Porém, quem procurou teve dificuldade de encontrar. Isso é um reflexo direto da escassez dos postos de trabalho que houve no ano de 2020, por causa da pandemia.”
Rendimentos
Em relação aos rendimentos do trabalho principal, o rendimento médio habitual mensal da
população ocupada teve alta no Brasil, em média, de 8,0%, passando de R$ 2.197, em 2012, para R$ 2.372, em 2020, o maior da série histórica.
No ano de 2019, o rendimento médio habitual mensal da população ocupada era de R$ 2.285, portanto o crescimento de 2019 para 2020 foi de 3,8%. O aumento do rendimento médio do trabalho em 2020, analisado no contexto da pandemia da COVID-19, revela a maior perda de empregos mais vulneráveis em relação aos mais protegidos, uma vez que as categorias ocupacionais com menores rendimentos médios foram as que tiveram maior índice de elevação das taxas de desocupação.
Em Minas Gerais, o rendimento médio passou de R$ 1.916 em 2012 para R$ 1.965 em 2020, ficando abaixo da média nacional em todo o período.
O rendimento médio no estado é inferior à média do país em todas as categorias de grupo
populacional analisadas. Verificando as diferenças de rendimento por sexo, é possível perceber que, no Brasil, as mulheres recebiam em média 73,2% dos rendimentos dos homens em 2012, enquanto, em 2020, os rendimentos médios das mulheres correspondiam a 78,1% daqueles dos homens. Isso revela uma redução do diferencial de rendimentos por sexo. Em Minas Gerais, a situação é semelhante: a proporção era de 69,1% em 2012 e passou para 74,8% em 2020.
Embora haja diferenças importantes de rendimentos entre homens e mulheres, as
diferenças de rendimento por cor ou raça são mais acentuadas e estáveis. No Brasil, os pretos e pardos ganhavam em média 57,6% do rendimento dos brancos em 2012. Essa proporção foi de 57,7% em 2020, situação praticamente inalterada.
Em Minas, a proporção de rendimentos dos pretos e pardos em relação ao rendimento médio dos brancos, 65,9% em 2012 e 66,2% em 2020, traz valores mais altos que aqueles encontrados para o país.
Distribuição do rendimento
O rendimento médio mensal domiciliar per capita em 2020, no Brasil, era de R$ 1.349, enquanto o rendimento mediano era de R$ 836. Em Minas Gerais, esses valores eram, respectivamente, R$ 1.290 e R$ 908, o menor registrado na Região Sudeste. No Espírito Santo, o valor foi de R$ 1.323, no Rio de Janeiro de R$ 1.664 e em São Paulo de R$ 1.787.
Esse rendimento é o mais baixo desde 2017 no estado. Resultados piores só aconteceram em 2016, ano de recessão no Brasil, em que o rendimento médio foi de R$ 1.254 e em 2012, quando o valor era de R$ 1.240.
O analista explica que o rendimento médio domiciliar é composto tanto pela renda vinda do trabalho, como também de outras fontes, a exemplo de aposentadorias e aluguéis.
“No ano passado, com a pandemia, tivemos uma situação bastante crítica, com uma redução importante do rendimento da massa do trabalho. Muita gente ficou desempregada, então o rendimento proveniente do trabalho deixou de estar nos domicílios.”
Segundo Veloso, houve ainda uma queda no rendimento geral, de outras fontes, já que um percentual grande vinha de aposentadorias e pensão do INSS.
“O valor mínimo dessa aposentadoria é o salário mínimo, de R$ 1.100. No ano passado, muitas pessoas deixaram de receber esses valores e passaram a receber o auxílio emergencial. Ele foi importante para que essa renda não caísse ainda mais, porém o valor máximo do benefício era de R$ 600 e, em alguns poucos domicílios chegava a R$ 1.200. Por isso, essa média também caiu.”
Para o analista, este é um reflexo direto dos efeitos da pandemia no mercado de trabalho, em virtude do aumento da desocupação. “Mais pessoas nos domicílios ficaram sem nenhum tipo de rendimento de trabalho ou uma diminuição desses rendimentos. A média também caiu porque havia uma participação de aposentadoria e pensão muito maior do que registrada no ano passado. O Auxílio Emergencial foi o responsável por estes outros rendimentos, além do rendimento de trabalho.”
Veloso ressalta que, como o valor médio do benefício era bem inferior ao salário mínimo, a tendência é de queda da média. “Esse dado específico tem relação direta com a deterioração da economia, em virtude dos efeitos da pandemia.”
Ele acredita que os indicadores de 2021 sejam semelhantes, já que o Auxílio Emergencial continuou a ser pago durante boa parte do ano.
“Neste ano, como a situação da economia como um todo e do mercado de trabalho se assemelhou um pouco a 2020, tivemos um 1° semestre ainda complicado, com efeitos da pandemia muito fortes, imaginamos que pode continuar assim. Vimos uma certa reação do mercado de trabalho, o número de ocupados aumentou no 3° trimestre. Já notamos essa reação, mas em termos de rendimento médio, ainda vamos sentir esse efeito nos indicadores de 2021.”
No país, 60,6% dos rendimentos domiciliares per capita observados em 2020, ainda eram iguais ou inferiores ao valor do salário mínimo vigente nesse mesmo ano, já no estado esse percentual era de 58,0%. Isso significa que mais da metade das pessoas tinham rendimento domiciliar per capita de até R$ 1.100, tanto em Minas quanto no Brasil. Por outro lado, apenas 3,4% dos rendimentos domiciliares per capita no Brasil e 2,3% em Minas Gerais eram superiores a cinco salários mínimos.
Em 2020, o índice da distribuição do rendimento domiciliar per capita no Brasil era de 0,524 e em Minas Gerais, 0,460. Tanto em nível nacional quanto estadual, os valores registrados em 2020 foram os menores para este índice desde o início da série histórica (o índice nacional em 2015 também foi 0,524).
O comportamento deste indicador se mostrou atípico, com forte variação ante 2019, o que refletiu o impacto da pandemia de COVID-19. Se considerarmos o Índice de Gini da distribuição do rendimento domiciliar per capita sem os benefícios de programas sociais governamentais – especialmente o auxílio emergencial, pago durante alguns meses da pandemia –, a situação é diferente: para o Brasil, este índice foi de 0,573 (o maior da série histórica) e, para Minas Gerais, subiu de 0,501, em 2019, para 0,506, em 2020.
Segundo o IBGE, como no Brasil não há uma linha de pobreza oficial, para medir a pobreza no país é possível usar uma medida calculada pelo Banco Mundial para países de nível médio-alto de desenvolvimento (classificação do Brasil), que é a linha de US$ 5,5 per capita por dia em Paridade de Poder de Compra (PPC). Em 2020, no Brasil, havia 24,1% da população com rendimentos inferiores a US$ 5,50 PPC por dia, aproximadamente R$ 450 mensais em 2020, o que equivale a cerca de 40,9% do salário mínimo vigente no ano (R$ 1.100). Em Minas Gerais, 17,1% da população se encontrava nesta condição.
Educação
A pandemia da COVID-19 representou não somente uma crise sanitária de proporções históricas, como também resultou na maior adversidade, até então, enfrentada pela educação básica brasileira. Sem pretender dimensionar os efeitos da suspensão de aulas presenciais no aprendizado dos alunos, dados coletados pela PNAD COVID-19 permitem apresentar um retrato sucinto das desigualdades de oferta e acesso ao ensino a distância no contexto da pandemia do coronavírus.
No contexto internacional, o Brasil está entre os países que tiveram o maior período de
suspensão das aulas presenciais de acordo com dados do monitoramento global do fechamento de escolas causado coronavírus, da UNESCO.
Em nível nacional, a estimativa é que 92,2% dos estudantes das redes pública e privada, de 6 a 17 anos, não tiveram aulas presenciais, 5,4% frequentavam aulas presenciais parcialmente e apenas 2,4% estavam frequentando normalmente aulas presenciais, em novembro de 2020.
O levantamento detectou uma intensa desigualdade regional dos sistemas de ensino quanto à oferta de conteúdo pedagógico durante a suspensão das aulas presenciais. Além de fatores internos do sistema de ensino, essa variação regional pode ser explicada por diferenças de densidade populacional, infraestrutura de comunicação e transporte, e vulnerabilidade socioeconômica da população, impondo um quadro mais desafiador para implementação do ensino a distância.
Isso pode ser observado analisando a proporção de estudantes que frequentavam escolas sem atividades presenciais e sem oferta de atividades escolares, em novembro de 2020. Se no Brasil este percentual era de 10,8%, em alguns estados da Região Norte, como Roraima, Pará, Amapá e Amazonas, o valor era superior a 30%. Já nos estados da Região Sul, além de Rondônia, Mato Grosso do Sul, Ceará e no Distrito Federal, o número de estudantes nessa situação não passava de 5%.
Em Minas Gerais, a proporção de estudantes que frequentavam escola e estavam sem atividades presenciais e sem oferta de atividades escolares era de 5,2% em novembro de 2020. Também houve diferenças bastante significativas entre o apoio pedagógico oferecido para os alunos das redes pública e privada de ensino. No Brasil, 35,5% das escolas da rede pública garantiram aos alunos aulas síncronas pela Internet com possibilidade de interação direta entre aluno e professor. Já na rede privada este número foi de 69,8%. Em Minas Gerais, os percentuais foram de 27,5% na rede pública e 64,7% na rede privada, ambos inferiores às proporções nacionais.
Condições de moradia
Em relação à moradia, a pesquisa analisa alguns aspectos: condição de ocupação do imóvel, inadequações referentes ao domicílio, acesso a serviços de saneamento básico. Um conjunto de indicadores analisados se refere aos tipos de inadequações nas condições de moradia e nível de ocorrência.
Dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do IBGE, coletada em 2017
e 2018, mostram a proporção de pessoas residentes em domicílios que apresentavam problemas ou inadequações.
No Brasil:
- 33,2% das pessoas moravam em domicílios com pouco espaço,
- 23,2% em casa escura, com pouca iluminação natural,
- 28,3% relataram ter o telhado com goteira,
- 30,2% estavam em domicílios com fundação, paredes ou chão úmidos
- 23,3% disseram que em sua casa havia madeira das janelas, portas e/ou assoalhos deteriorados
Os percentuais são semelhantes em Minas Gerais:
- 30,1% moram em domicílios com pouco espaço,
- 23,8% em casa escura, com pouca iluminação natural,
- 23,5% com telhado com goteira,
- 25,7% em domicílios com fundação, paredes ou chão úmidos
- 22,3% em domicílios onde havia madeira das janelas, portas e/ou assoalhos deteriorados
A pesquisa também levantou a proporção das despesas familiares monetárias com itens
relacionados à habitação em relação ao rendimento familiar. Em nível nacional, a soma dos itens analisados representou em média 8,1% do rendimento monetário das famílias (ante 8,0% em Minas Gerais).
De acordo com o IBGE, é preciso levar em consideração que a proporção média diz respeito a todas as famílias, inclusive às que não fizeram qualquer gasto relativo ao item em questão. Essa ponderação é especialmente relevante para o item aluguel, para o qual apenas 16,3% das famílias no Brasil (e 17,4% em Minas Gerais) fizeram despesa. Assim, embora o comprometimento médio do rendimento familiar com o pagamento de aluguel em âmbito nacional tenha sido de 2,2%, entre famílias locatárias essa proporção chegou a 13,4%.
Saúde
A Pesquisa de Orçamentos Familiares (2017- 2018) investigou a restrição de acesso à saúde, ou seja, verificou se as famílias precisaram, no período de referência, de algum produto ou serviço de saúde, mas, por algum motivo, não os compraram.
Em nível nacional, 16,4% das pessoas faziam parte de famílias que experimentaram restrição quanto ao acesso a medicamentos e uma maior proporção, 26,2%, declararam vivenciar restrições quanto ao acesso a serviços de saúde. Em Minas Gerais, os percentuais estimados foram 14,2% e 23,3%, respectivamente.
O motivo principal declarado para ambas as restrições, tanto em Minas como no Brasil, foi falta de dinheiro, seguido por indisponibilidade do produto ou serviço.
Outra pesquisa do IBGE que aborda amplamente aspectos da saúde da população brasileira é a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), coletada em 2019. Segundo esse levantamento, do total de 159,2 milhões de pessoas residentes no Brasil com 18 anos ou mais em 2019, 8,5% tiveram algum problema de saúde que os impossibilitou de fazer atividades cotidianas nas duas semanas anteriores à realização da entrevista.
Neste grupo:
- 30,7% alegaram que não fizeram as atividades devido a problemas nos ossos ou articulações,
- 14,0% por problemas respiratórios,
- 8,6% por problemas cardiovasculares,
- 7,0% por problemas relacionados à saúde mental,
- 6,8% por problemas gastrointestinais,
- 5,9% por lesões ou fraturas provocadas por acidente ou violência,
- 26,9% declararam que a impossibilidade ocorreu por outros problemas de saúde
Já em Minas Gerais:
- 34,1% alegaram que não realizaram as atividades devido a problemas nos ossos ou articulações,
- 11,5% por problemas respiratórios,
- 8,8% por problemas cardiovasculares,
- 8,2% por problemas relacionados à saúde mental,
- 6,3% por problemas gastrointestinais,
- 5,7% por lesões ou fraturas provocadas por acidente ou violência
- 25,5% dos mineiros informaram outros problemas de saúde que os incapacitaram a fazer atividades cotidianas
* Estagiária sob supervisão da subeditora Ellen Cristie.