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Estado de Minas SEU BOLSO

Preço do gás de cozinha sufoca o orçamento

Com sucessivos reajustes, botijão de 13kg custa até R$ 96 nas revendas em BH. Em 2020, produto subiu o dobro da inflação. Neste ano, alta já passa de 10%


13/02/2021 04:00 - atualizado 13/02/2021 20:01

Preço do botijão já subiu duas vezes este ano e deve sofrer novo aumento(foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press )
Preço do botijão já subiu duas vezes este ano e deve sofrer novo aumento (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press )

O preço do gás de cozinha (GLP) foi reajustado em 5,05% nas refinarias das Petrobras na última terça-feira e o aumento já chegou às revendas do produto em Belo Horizonte, onde o botijão de 13kg é vendido, pela nova tabela, ao preço máximo de R$ 96, enquanto o cilindro de 45kg passou a custar R$ 365.

O reajuste é o segundo deste ano e tudo indica que novo aumento deve ser aplicado este mês, impactando ainda mais o custo de vida do brasileiro num contexto de desemprego e queda de renda.
 
No início do ano, a Petrobras já havia anunciado um aumento de 6% para o GLP, também corrigido em 5% no início de dezembro passado. O gás de cozinha encerrou o ano passado com alta de 9,24%, segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Isso representa mais que o dobro da inflação geral registrada em 2020, de 4,52%. Nas refinarias, o aumento do combustível chegou a 21,9%. Apenas neste ano, a alta acumulada nas refinarias já passa de 10%.
 
Em Belo Horizonte, segundo levantamento da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (Ipead-UFMG), o gás de cozinha assumiu a oitava posição de peso na inflação entre 242 itens observados na composição do IPCA da capital no período entre 8 de janeiro e 7 de fevereiro. Nos últimos 12 meses, o aumento acumulado do gás em BH é de 8,19%, sendo negociado pelo valor médio de R$ 84,84.
 
“Somado a essa pressão nos alimentos, que compromete a renda das famílias, principalmente aquelas que têm renda mais baixa, nós tivemos constantes altas no preço do gás, que é um item mais do que necessário nessa nova condição de home office e de crianças em casa”, assinala a economista Thaize Martins, pesquisadora-chefe do IPCA no Ipead-UFMG. O impacto do valor do GLP é ainda maior para a população de baixa renda.

O estudo do Ipead mostra que o peso do produto na inflação das famílias belo-horizontinas que ganham até 5 salários mínimos já alcança a terceira posição.
 
Os recentes aumentos trazem preocupação para pessoas como Salvani Costa, que é suporte financeiro de uma família numerosa. Salvani é auxiliar de limpeza e mora no bairro Novo São Lucas, região Centro-Sul da capital, com os dois filhos, o genro e dois netos pequenos. Ela conta que, atualmente, apenas ela e a filha estão empregadas e que o auxílio emergencial do governo federal foi o que socorreu a família durante o ano passado. 
 
Com as crianças sem aula, a diarista gasta cerca de um botijão de 13kg por mês, consumo que compromete o já insuficiente orçamento do lar. “As coisas já estão tão difíceis, e agora tem o gás nesse absurdo pra complicar ainda mais a vida da gente”, lamenta.

Redução de preços com “fuzil na mão”

O presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem que as empresas revendedoras de gás de cozinha são “cartéis poderosíssimos” e que o valor dos botijões só vai diminuir com “fuzil na mão”. O comentário foi feito a apoiadores em frente ao Palácio do Planalto. “O gás de cozinha está caro, em média R$ 90. O preço na origem é menos de R$ 40 e o imposto federal (sobre o produto) é de R$ 0,70… não… se não me engano, de R$ 0,16. Então, não justifica chegar a R$ 90. São cartéis poderosíssimos, com dinheiro, com bilhões contra mim”, afirmou Bolsonaro.
 
Em seguida, o presidente sugeriu que precisaria usar armas para o valor do gás de cozinha diminuir. “Alguns, e eu fico chateado pela ignorância, apontam: ‘Tem que resolver’. Só com um fuzil na mão e ninguém quer fazer isso daí”, concluiu. Bolsonaro já determinou que sejam feitos estudos para analisar a possibilidade de ampliação do número de empresas engarrafadoras, especializadas em encher os cilindros de GLP. Para o presidente, a concentração geográfica dessas empresas faz o custo de logística de transporte sobrepesar o valor final do produto.
 
Em vigor desde 2019, a atual política de preços do gás de cozinha não restringe o número de reajustes (antes era feito a cada três meses). Com isso, o valor do GLP tem se expandido frequentemente e nunca esteve tão alto no país, resultado da atual escalada de preços do petróleo no mercado internacional e pela desvalorização cambial. A alta afeta tanto o preço do cilindro de 13 quilos, destinado ao uso doméstico, que sairá das refinarias por R$ 37,79, quanto o GLP fracionado, utilizado por indústrias, estabelecimentos comerciais e condomínios residenciais.
 
Embora seja controlado nas refinarias, o preço do gás de cozinha não é tabelado no varejo. A Petrobras fica, em média, com 46% do preço do produto, enquanto distribuidoras e revendedoras respondem por 36%. A incidência de impostos, como o ICMS, corresponde a 18% do valor.

Consumo


A alta no preço do gás reflete pouco no consumo do produto pelas famílias, devido a dificuldade em substituir o botijão por outra fonte de energia. De acordo com relatórios divulgados pelo Ministério de Minas e Energia, embora a demanda do gás tenha mostrado queda em dezembro passado, em janeiro foi observado um aumento de 4,5% no comércio do botijão de 13kg e de 12,8% nas vendas de cilindros maiores, quando comparado ao mesmo período do ano passado.
 
Pressionado pela população, o governo estuda medidas que visam diminuir a pressão do produto no consumo das famílias. O Ministério da Economia defende a aprovação do novo marco regulatório do gás, que foi aprovado pelo Senado no fim de 2020 e que aguarda nova votação na Câmara. A privatização de refinarias da Petrobras também está no radar da equipe econômica, que argumenta maior concorrência no setor e consequente diminuição dos preços. (Com agências)

 *Estagiário sob supervisão do subeditor Marcílio de Moraes

Esforço para conter aumentos

Fernando Alves, proprietário de revenda no bairro Serrano, diz que, se fizesse todos os repasses, preço hoje seria de mais de R$ 100(foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)
Fernando Alves, proprietário de revenda no bairro Serrano, diz que, se fizesse todos os repasses, preço hoje seria de mais de R$ 100 (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)

Fernando Alves é proprietário de uma revendedora de gás no bairro Serrano, região da Pampulha. Ele afirma que os clientes têm reclamado do aumento constante do botijão e, mesmo com ligeiro aumento da procura para uso doméstico, nota uma queda em suas vendas, decorrente, principalmente, do fechamento temporário ou permanente de muitos restaurantes e bares na região.

Alves revela que faz manobras pra não repassar todo o aumento do produto para seus clientes, mas que, com os reajustes constantes, fica difícil de não mexer no seu preço.

“Está tendo muita pesquisa de preços e o revendedor, que fica na frente do negócio, tem dificuldade em manter a clientela e repassar o aumento. Se eu repassasse todo o aumento, que já vem desde o final do ano passado, o botijão de gás aqui já estaria pra mais de R$ 100. Isso tudo afeta a margem de ganho da gente”, explica.
 
Numa outra revenda, no Centro da capital, Mateus de Moura, dono do estabelecimento, também tem escutado muitas reclamações dos consumidores, que se espantam com o valor do gás.

Ele afirma que também faz o possível pra absorver ao máximo os aumentos impostos às revendedoras, que, segundo ele, só em 2021 foi mais de 11%. Mateus destaca que os esforços para manter a clientela se dão num contexto de queda das vendas e calcula que cerca de 24% dos restaurantes que eram seus fregueses tenham fechado as portas.
 
Em seu comércio, o botijão de gás de 13 quilos altera de acordo com a forma de pagamento e retirada e variava, ontem, entre R$ 77 e R$ 92, valores já corrigidos com o aumento anunciado pela Petrobras na terça. “A gente deixa um preço mais baixo na portaria, porque daí não tem os gastos com motorista, gasolina, pneu, todo um custo operacional por trás.

É uma forma de a gente diminuir o valor pro cliente que pode vir buscar”.

O médico Eduardo Maia faz uso doméstico do gás e ficou surpreso quando se deparou com o valor do botijão na revenda de Mateus, de onde é cliente há muito tempo.

Ele conta que, como o uso do produto não é intenso em sua casa, a última compra realizada foi entre outubro e novembro do ano passado e que o valor pago na época foi de R$ 68. Ontem, Maia pagou R$ 79 no botijão de 13 quilos. “Eu fiquei surpreso porque não tinha informação disso (dos recentes aumentos). Eles falam que a inflação está por volta de 6%, mas a sensação é que tudo aumentou 30% no ano”, constata.

Restaurantes


Saulo Vidigal é proprietário de um restaurante de porte médio no bairro Padre Eustáquio, Região Noroeste de Belo Horizonte. O seu estoque é composto por cilindros de 200 quilos, sendo negociado diretamente com distribuidoras. Em suas anotações, ele verifica que no carnaval de 2020 pagou R$ 5,32 no quilo do combustível. Em novembro, o valor contratado já estava em R$ 6,21.
 
O comerciante conta que investiu em equipamentos elétricos e na captação de energia solar pra diminuir o uso do produto em seu estabelecimento. “Eu tive uma redução de 30% no consumo do gás. Então, eu consegui não repassar pro meu cliente esse aumento”, conta Vidigal, que também revela que batalhou por um preço mais justo na renegociação do seu contrato de fornecimento com a distribuidora.
 
“Eu peguei todos os aumentos do gás na Petrobras e os aumentos que me passaram e mostrei pra eles que não estava correto. Então, no final do ano passado, eu consegui uma renegociação do meu preço, mas que também já teve aumento neste ano. O que acontece é que, quando há um aumento na Petrobras, ele é repassado integralmente pelas distribuidoras, mas quando há redução, o percentual de abatimento é menor do que o previsto.”
 
Matheus Daniel, que é proprietário de restaurantes e presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes em Minas Gerais (Abrasel-MG), afirma que o setor, que está sofrendo com restrições em suas atividades desde o início da pandemia de COVID-19, não tem margem de receita pra absorver a alta no preço do gás de cozinha e deverá repassá-la aos clientes.
 
“O aumento do gás é impactante, ainda mais se somado a todos os outros aumentos que tivemos”, ressalta. “Em dezembro de 2020, 53% dos restaurantes de Belo Horizonte estavam operando em prejuízo. (Daniel estima um número maior após o fechamento do comércio em janeiro.) Se esse aumento, como todos os outros, não for repassado, o estabelecimento em dificuldade quebra. Se já está tomando prejuízo, está comprando mais caro e não repassar, ele não tem sustentabilidade no empreendimento.”


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