O escritor, pensador e líder indígena Ailton Krenak e a cantora e ativista cultural Titane são os convidados do projeto Sempre um Papo para o lançamento do livro “O encenador e a floresta” (ACV/Relicário Edições), nesta quarta-feira (10/12), às 19h30, no auditório do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. A obra reúne textos que o dramaturgo, diretor e escritor João das Neves (1935-2018) produziu durante o período em que viveu no Acre, entre 1986 e 1991.
Nessa temporada no Norte do país, ele estreitou laços com movimentos e lideranças indígenas – especialmente os Kaxinawá (ou Huni Kuin, como se autodenominam) – e com ambientalistas, além de criar o Grupo Poronga de Teatro. Esses encontros resultaram em três peças escritas por João ( “Cadernos de acontecimentos”, “Tributo a Chico Mendes” e “Yuraiá – O rio do nosso corpo”) e em textos diversos que registram sua vivência e suas reflexões relativas a esse período.
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Esse é o foco de “O encenador e a floresta”, segundo Titane, que responde pela organização da obra. Krenak, que assina o prefácio, manteve, desde aquela época, profunda amizade e parceria intelectual com João.
O lançamento do livro enseja o debate acerca do tema “Justiça climática e territórios em transição” que ele Krenak vai conduzir, com mediação de Afonso Borges.
Titane fará a apresentação, contextualizando e explicando como surgiram os textos reunidos no volume.
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Primeiro encontro
O primeiro texto, intitulado “O teatro e a floresta”, é um artigo cujo tema foi tratado por João também em palestras e outras publicações no Brasil, Espanha, Alemanha e México ao longo da década de 1990. “O segundo, bem pequenininho e muito instigante, é 'Como os Kaxinawá descobriram o teatro', em que ele conta, de maneira muito inspirada, como foi o primeiro encontro com esse povo”, diz Titane. O terceiro texto, ela pontua, é o diário de viagem do artista.
“Durante esse período no Acre, João foi convidado pelos Huni Kuin a visitar suas aldeias e, nisso, fez um diário de viagem manuscrito. Esses textos acabaram virando seis cadernos, a partir dos quais ele, antes de falecer, fez uma versão compacta, datilografada, que é o que estamos publicando no livro”, explica. Companheira do artista por mais de 20 anos, ela detalha que, nesse diário de viagem, ele fala da floresta, dos Huni Kuin, das escolas e cooperativas indígenas de maneira muito consistente.
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Duas culturas
“É bonito perceber, por esses textos, como duas culturas, a do homem branco e a de um povo indígena, se encontram sem que uma desrespeite ou seja uma afronta à outra”, ressalta Titane. Os três textos de “O encenador e a floresta” são bem diferentes e mostram a forma como João – autor de muitos poemas e ensaios sobre a cultura brasileira, além de peças – pensava e se expressava em frentes literárias distintas.
“Temos um diário de viagem, um ensaio e esse pequeno texto sobre o encontro dele com os Kaxinawá, que não sabemos nem como classificar, porque é uma história”, pontua. O livro inclui, também, a reprodução de desenhos que acompanham os manuscritos e fotografias tiradas quando ele estava nos territórios Huni Kuin. No texto “Como os Kaxinawá descobriram o teatro”, João relata seus primeiros dias no Acre.
“Ele estava dando um curso de teatro em Rio Branco e os Kaxi foram até lá, perguntando se poderiam participar daquela brincadeira. No final desse curso, foi montado o espetáculo 'Caderno de acontecimentos', com atores de Rio Branco e com os indígenas que participaram. Isso foi a origem do Grupo Poronga e motivou o convite para que fosse visitar as aldeias”, diz, destacando que João, nascido no Rio de Janeiro, sempre se inseriu de maneira profunda nas culturas dos lugares onde viveu.
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O livro que será lançado no Sempre um Papo integra a série de iniciativas da Associação Campo das Vertentes, cuja criação Titane e João das Neves capitanearam em 2008, em torno do acervo do artista.
Uma parte desse acervo foi organizada no âmbito do programa Rumos, do Itaú Cultural, e doada para a UFMG. “O encenador e a floresta” sucede a “Estado de arte – João das Neves em Minas Gerais”, lançado em 2023. Uma reunião de todos os seus textos dramatúrgicos também está nos planos.
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Posfácio
Além dos textos de João das Neves e do prefácio de Ailton Krenak, Titane destaca que “O encenador e a floresta” traz posfácio assinado pela jornalista Mara Vanessa Fonseca Dutra, que sempre atuou como indigenista e conviveu com o dramaturgo e diretor durante o período que ele passou no Acre. “Ela é de Belo Horizonte, tem um conhecimento muito profundo das relações interculturais, viveu em várias áreas indígenas no Brasil e na Bolívia. Sempre foi muito amiga do João e escreveu o posfácio que contextualiza a chegada dele no Acre, falando da Aliança dos Povos da Floresta, do assassinato de Chico Mendes e daquele momento de grande desenvolvimento das escolas indígenas. Mara ouviu muitas pessoas que conviveram com João no Acre, os artistas, os indígenas, as instituições que o convidaram para ministrar o curso de teatro”, ressalta Titane.
“O ENCENADOR E A FLORESTA”
Lançamento do livro de João das Neves, com apresentação de Titane e debate “Justiça climática e territórios em transição”, com Ailton Krenak. Projeto Sempre um Papo TCE Cultural, nesta quarta-feira, às 19h30, no auditório do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (Av. Raja Gabáglia, 1.315, Luxemburgo). Entrada franca, mediante lotação do espaço.
