
Gente compra de gente
O consumidor não compra só produtos: ele compra presença, afeto e identificação. E isso nenhum sistema entrega
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Vivemos cercados de dashboards, algoritmos, CRMs e automações. Tudo isso pode ser extremamente útil quando bem utilizado. Mas há algo que os números ainda não conseguem prever: o instante exato em que alguém decide confiar. No marketing real, não aquele centrado em funil, mas aquele que entende gente, o que move a decisão de compra vai além do preço ou da funcionalidade. É afeto. É vínculo. É a percepção de que, por trás da marca, há alguém que compreende, escuta e respeita.
Não é à toa que tantas marcas disputam não mais o produto em si, mas a relação. Gente compra de gente. Compra o tom de voz. Compra o cuidado na resposta. Compra a sensação de ser lembrada. Compra o olhar, mesmo que digital. Cada ponto de contato com o consumidor hoje carrega o peso de uma escolha. Pode parecer exagero, mas é exatamente aí que o marketing encontra sua força silenciosa.
Em meu trabalho como consultor e professor de marketing, costumo lembrar aos empresários e alunos que não existe neutralidade em uma interação. Ou a marca aproxima ou ela afasta. E não há escudo tecnológico que proteja da indiferença.
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A famosa definição de marketing do professor Philip Kotler como “o processo social e gerencial pelo qual indivíduos obtêm o que necessitam e desejam, por meio da criação e troca de valor com os outros”, continua atual. Mas é preciso enxergar o “social” como algo mais do que uma palavra no dicionário. É a alma do processo.
Posso citar o caso da Zappos, nos Estados Unidos. A empresa se tornou conhecida não apenas pelos sapatos que vende, mas pela forma como trata seus clientes. Um atendimento que ultrapassa scripts e prazos. Um dos relatos mais famosos é de uma ligação de atendimento que durou mais de oito horas — não para resolver um problema, mas porque o atendente realmente quis escutar o cliente. Isso é extremo? Pode ser. Mas é autêntico. E gerou o que nenhuma campanha compraria: reputação e afeto. A empresa foi adquirida pela Amazon, mas manteve sua essência. Porque sabia que o ativo mais valioso era essa conexão humana.
Aqui no Brasil, vemos bons exemplos também. A Reserva, marca de moda masculina, transformou sua forma de atendimento em canal de encantamento. Seus vendedores são chamados de “consultores de estilo”, com autonomia para criar relacionamentos verdadeiros com os clientes, inclusive enviando mensagens personalizadas após a venda. A experiência de compra deixa de ser transação — e vira construção de vínculo. Quando o consumidor volta, não é só pela roupa. É pelo sentimento que a experiência deixou.
É esse o ponto central. O consumidor pode até fazer comparações racionais, buscar o melhor preço, simular frete. Mas o que o faz voltar, recomendar, defender uma marca, é a maneira como ele foi tratado. E isso tem pouco a ver com tecnologia e muito a ver com humanidade.
Eu sempre reforço que isso não é romantismo. É estratégia. Empresas que compreendem o comportamento do consumidor moderno já perceberam que a diferenciação sustentável vem do que não pode ser facilmente copiado: a conexão. Produtos são replicáveis. Logística pode ser ajustada. Preço pode ser reduzido. Mas uma relação construída com base na confiança e na escuta... Isso é único.
É importante que os profissionais de marketing resgatem a noção de que suas ações não são neutras. Cada mensagem, cada silêncio, cada contato gera percepção. E percepção, no fim, é o que move a decisão de compra. O marketing orientado ao cliente, tão falado nos livros, não se faz apenas com segmentação e personalização de conteúdo. Ele se faz com escuta ativa, com coerência entre discurso e prática, e com presença real.
Enquanto algumas empresas se contentam em fazer anúncios bonitos, outras estão promovendo experiências que tocam. São essas que permanecem. E são essas que criam o que hoje no marketing chamamos de advocacy, ou seja, o engajamento voluntário e genuíno do cliente com a marca. E isso não se consegue com slogan. Consegue-se com vínculo.
Gente compra gente. Compra confiança. Compra escuta. Compra coerência. E compra sentimento. Pode não estar escrito na embalagem, mas está na memória.
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A fidelização não nasce da insistência. Ela nasce da empatia. Por isso, toda marca que quiser permanecer precisa primeiro aprender a se relacionar. Porque por fim, o cliente não quer só comprar. Porque, no fim das contas, o cliente quer mais do que um produto. Ele quer sentir que fez a escolha certa, feita com o coração e com a razão.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.