Ilustração de um homem atordoado

No primeiro semestre, cerca de 88% da população adulta pensaram ao menos uma vez na semana sobre o assunto

(Maurenilson Freire)

Uma pesquisa sobre saúde mental, divulgada ontem, concluiu que a principal preocupação dos brasileiros acima de 16 anos é a situação financeira. Da mesma forma, as mulheres estão com o psicológico mais abalado do que os homens. A constatação é do Panorama da Saúde Mental , índice que pretende medir e acompanhar a saúde mental do país.

 

Desenvolvido pelo Instituto Cactus e pela AtlasIntel, o levantamento criou um índice, o iCASM, que mede de 0 a 1.000 as categorias pesquisadas e considera que quanto maior esse número, melhor. Analisa, ainda, três fatores dos entrevistados: confiança (autoestima), vitalidade (capacidade de superar desafios) e foco (concentração). Mais de 2,2 mil pessoas foram ouvidas, em 746 municípios.

Segundo o iCASM, a preocupação financeira é o que mais impacta na saúde mental das pessoas. Cerca de 88% da população brasileira adulta pensou ao menos uma vez na semana sobre esse assunto, no primeiro semestre deste ano. Em relação aos assuntos que dizem respeito ao bolso, quem busca de emprego atinge 494 pontos, enquanto os assalariados marcam 680.

 

No recorte de gênero, as mulheres (600) marcam menos pontos do que os homens (672) em relação à saúde mental. No que se refere à identidade de gênero, pessoas trans (445) são mais afetadas. No que diz respeito à orientação sexual, homens homossexuais (576) têm índice maior que bissexuais (488) em relação ao psicológico. A pesquisa destaca que apenas 5% da população brasileira afirmam fazer psicoterapia, enquanto que 17% fazem uso de medicamentos para a saúde mental.

 

 

 

De acordo com os organizadores do projeto, esse levantamento será feito a cada seis meses e criará uma série histórica de dados sobre a saúde mental no Brasil. A intenção é que, a partir dele, novas pesquisas, estudos e políticas públicas sejam levadas adiante.

Indígenas

Em paralelo à divulgação do Panorama da Saúde Mental , levantamento do Ministério da Saúde constatou que apenas em 2019, 665 indígenas provocaram lesões no próprio corpo, dentro e fora das aldeias. Tentativas de suicídio ou transtornos psicológicos fazem parte desse quadro.

 

A psiquiatra Jacyra Araújo alerta que há a expectativa de que taxa de mortalidade indígena aumente, como uma tendência em toda a população mundial. Para ela, é preciso apontar as causas, antes de buscar meios de cessar essa realidade.

 

"Precisamos de estudo mais focados nas populações indígenas, nos povos mais vulneráveis. Esses estudos vão direcionar quais são os fatores que aumentam a vulnerabilidade para o suicídio e podemos criar soluções ou medidas públicas que minimizem esse risco", explicou.

Além das múltiplas violências e das questões culturais, a pobreza pode ser outro fator que gera o estresse mental entre essas populações. De acordo com o relatório Violência contra os Povos Indígenas no Brasil , do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), no ano passado o Mato Grosso do Sul foi o segundo estado onde mais ocorreram suicídios entre os povos originários: 28.

 

É lá onde vivem os povos guarani kaiowá. Janio Kaiowá, da Aty Guasu, entidade da juventude kaiowá, relata que os indígenas sul-matogrossenses vivem uma situação grave de extrema pobreza. "A violência, o choque cultural, também o preconceito, tudo isso leva a tirar as próprias vidas. Alguns estão há mais de 30 anos na beira da rodovia, vivendo em extrema pobreza", lamentou.

 

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Os relatos sobre indígenas às margens de rodovias também foram lembrados pela antropóloga que elaborou o relatório do Cimi, Lúcia Helena Rangel. Ela atribui o problema ao racismo e, por isso, lembra que formas de valorização podem ajudar a melhorar a saúde mental indígena.

 

"Valorizando as culturas, as línguas, as pessoas, mostrando que essas pessoas têm valor e que elas podem ser aceitas como elas são, e não negar a elas a existência", recomenda.

 

Matheus Cruz, psicólogo da Secretaria de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, argumenta que as ações de vigilância da pasta ajudaram a enxergar o problema mais de perto, o que é importante para a elaboração de políticas públicas. "A gente tem adotado algumas estratégias em alguns lugares, alguns distritos sanitários pelo país, de estabelecimento de redes intersetoriais de atenção psicossocial justamente para fortalecer os projetos de promoção do bem viver", salientou.

 

Ao reconhecer o suicídio como um problema de saúde pública, o Ministério destaca o papel estratégico da atenção primária na prevenção, a partir da identificação e intervenção precoce em casos de risco e da capacitação de profissionais para oferecer apoio e acompanhamento. (Com Agência Brasil)