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Estado de Minas FACT-CHECKING

Checamos: assintomáticos podem sim transmitir vírus e não espalham anticorpos

Publicações em redes sociais disseminam informação falsa de que assintomáticos pode gerar uma imunidade em massa, espalhando anticorpos


06/07/2020 20:30 - atualizado 14/07/2020 08:10

“Eu não sou assintomático, sou IMUNE!”, asseguram publicações compartilhadas centenas de vezes nas redes sociais ao menos desde 15 de junho de 2020.

O texto afirma que as pessoas assintomáticas não transmitem o vírus e, ao contrário, podem espalhar anticorpos e gerar uma “imunidade em massa”.

Órgãos de saúde e especialistas consultados pela AFP indicam que os pacientes assintomáticos podem transmitir um vírus, mas não disseminar anticorpos.

“O ‘paciente assintomático’ é a maior contradição médica já vista, e a desculpa perfeita para assediar qualquer cidadão livre que a tirania queira silenciar. Uma pessoa assintomática é uma pessoa SAUDÁVEL”, assinalam publicações que circulam no Facebook (1, 2, 3, 4), por vezes acompanhadas de uma ilustração do corpo humano.

E a mensagem continua: “É alguém que tem um vírus, mas seu corpo desenvolveu Anticorpos, isso é chamado de ‘vírus atenuado’, ou seja, ele venceu o vírus graças a seus hábitos de vida saudáveis. Essa pessoa não transmite o vírus, mas comunica anticorpos para outras pessoas e gera imunidade em massa”.

As publicações também asseguram: “Não precisamos de máscaras, luvas ou distâncias, vacinas muito menos alteradas, o que precisamos é fortalecer nosso sistema imunológico, para que ele gere anticorpos naturais contra qualquer vírus. Que em quarentena, a única coisa que podemos fazer é ficar realmente doente [sic].

Mensagens similares circularam no Twitter e em outros idiomas, como o espanhol (1, 2, 3).

Embora as publicações não falem de um vírus específico, foram compartilhadas no contexto da pandemia de COVID-19, que, até 13 de julho, havia deixado mais de 569 mil mortos e mais de 12,9 milhões de casos confirmados no mundo.

Os assintomáticos transmitem?


Uma das afirmações indica que a pessoa assintomática “não transmite o vírus, mas comunica anticorpos para outras pessoas e gera imunidade em massa”.

Um paciente assintomático é uma pessoa que, por suas características imunológicas e biológicas, tem uma melhor resposta ao vírus e este não gera efeitos negativos tão severos e tão visíveis como em outros indivíduos, explicou à equipe de checagem da AFP o infectologista Juan Carlos Cataño, professor da Universidade de Antioquia, na Colômbia.

A Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos amplia a definição a pessoas “que tendo uma doença, ou uma condição especial de saúde, não apresentam sintomas disso”, ou às que “se recuperaram de uma doença, ou um problema, e já não apresenta nenhum sintoma”.

Essa mesma instituição define os vírus como “germes muito pequenos” compostos por um material genético dentro de uma capa de proteína.

“Os vírus são como sequestradores. Invadem as células vivas e normais, e as usam para se multiplicar e produzir outros vírus como eles [...] causam doenças infecciosas comuns como o resfriado comum, a gripe e as verrugas. E também causam doenças graves, como o HIV/aids, a varíola e o ebola, indica.

Os coronavírus, por sua vez, “são uma extensa família de vírus que podem causar doenças tanto em animais como em humanos”, diz a Organização Mundial da Saúde (OMS).

De acordo com o epidemiologista Jorge Rodríguez, professor e pesquisador do Instituto de Saúde Pública da Universidade Javeriana, na Colômbia, em quase todos os vírus há pacientes com manifestações leves da doença, ou assintomáticos, e estes podem “potencialmente transmiti-los a outras pessoas”.

A transmissão dos vírus e o seu comportamento no corpo humano pode variar dependendo da infecção e da sua capacidade de contágio, explica a epidemiologista Cecilia Morales Veloso, médica assessora da direção do Hospital Clínico da Universidade do Chile, embora faça uma advertência de que o que pode mudar é “a proporção de doenças assintomáticas que geram”.

Cataño indica que os casos assintomáticos de outros vírus respiratórios não foram tão estudados nem levados em conta como os do novo coronavírus devido a sua alta capacidade infecciosa.

Para o caso do SARS-CoV-2, a OMS indica que algumas pessoas infectadas podem apresentar sintomas levíssimos, especialmente nas primeiras etapas da doença, mas indica que “é possível se infectar de alguém que tenha apenas uma tosse leve e não se sinta doente”.

“Segundo algumas informações, as pessoas sem sintomas podem transmitir o vírus. Ainda não se sabe com que frequência isso acontece. A OMS está analisando as pesquisas em andamento sobre esta questão e continuará informando as conclusões à medida que forem obtidas”, acrescenta o organismo.
Captura de tela feita em 13 de julho de 2020 de uma publicação no Facebook
Captura de tela feita em 13 de julho de 2020 de uma publicação no Facebook

Para o epidemiologista Rodríguez, é completamente errado afirmar que não se pode transmitir o novo coronavírus porque se está assintomático. “Uma pessoa assintomática não desenvolve o vírus em seu corpo, mas é claro que pode se tornar um transmissor do agente infeccioso porque tem a carga viral”.

Cataño exemplifica: “Os assintomáticos têm o vírus e, portanto, são capazes de transmiti-lo. O que pode acontecer é que sejam menos infecciosos do que uma pessoa que tem sintomas. É simples: alguém que tosse, ou espirra, é mais infeccioso do que alguém que não o faz, mas isso não significa que se ambos têm o vírus, aquele que não tosse ou espirra não o transmite, porque só por falar ele pode espalhar”.

Sobre a possibilidade de que esses anticorpos possam ser transmitidos de uma pessoa assintomática para outras e gerar imunidade em massa, os três especialistas concordam que “ninguém pode transmitir anticorpos”, exceto em casos específicos.

“Há apenas quatro opções para que os anticorpos se formem. Uma opção é: você é exposto, é infectado e assim gera imunidade natural, correndo o risco de que essa exposição o leve a contrair uma doença e você pode morrer. A outra é que você se vacine e gere anticorpos indiretamente para protegê-lo quando você for exposto ao vírus naturalmente. Outra é em uma transfusão específica de plasma de anticorpos, e a última é que seja passada da mãe para o feto através da placenta”, explica Cataño.

A epidemiologista Morales também o afirma: “Somente quando as pessoas são expostas a um vírus é que o corpo humano gera os anticorpos, as defesas, para combater esse vírus. Essa resposta não pode ser transmitida, exceto nos casos mencionados”.

Assintomático não é igual a imune


“Eu não sou assintomático, sou IMUNE!”, assinalam as publicações.

Mas ser assintomático não significa ser imune, assegura Morales: “Uma pessoa assintomática quer dizer exatamente isso: que não tem sintomas, tem o contágio, mas sem sinais do mesmo”, mas detalha que a imunidade “é produzida, geralmente, semanas depois de superar uma doença” e é produzida tanto por assintomáticos quanto pelas pessoas que apresentaram sintomas.

A Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos indica que existem três tipos de imunidade: inata, adquirida, ou passiva. A primeira é o sistema de defesa com o qual um indivíduo nasce, a segunda é a que é desenvolvida quando é exposta a um agente biológico (como um vírus) e a última é que terceiros passam a outros - como o caso do feto, da vacina, ou de uma transfusão.

Cataño explica que, entretanto, esta proteção gerada pelos assintomáticos é de menor qualidade em comparação com as pessoas que sofreram todas as fases e sintomas da COVID-19 e que se recuperaram completamente.

“Quanto mais grave for a doença no corpo humano, maior será a proteção imunológica obtida. As pessoas assintomáticas têm menos estímulo em seu corpo, e suas defesas e resposta imunológica ao vírus em longo prazo não são as melhores”, afirma.

A OMS explica da seguinte forma: “O desenvolvimento da imunidade a um patógeno por infecção natural é um processo de várias etapas e que costuma ser produzida ao longo de uma ou duas semanas”.

Contudo, detalha o organismo, isso não quer dizer que uma pessoa que tenha sido infectada com o novo coronavírus não possa voltar a contraí-lo. “Atualmente não existem dados científicos que demonstrem que as pessoas que tenham tido a COVID-19 e apresentem anticorpos estejam protegidas de uma segunda infecção”.

Anticorpos e vida saudável


Outra afirmação das postagens é que “uma pessoa assintomática é uma pessoa SAUDÁVEL”, que “desenvolveu Anticorpos”, ou “vírus atenuado”, e que conseguiu isso graças aos seus “hábitos de vida saudáveis”.

O infectologista Cataño indica que alguém que tem uma infecção, “ainda que não apresente sintomas”, não é uma pessoa saudável. “Pode ser que se sinta saudável, mas isso é diferente estar”, esclareceu, assegurando que isso fez com que pessoas sem sintomas não obedecessem as medidas de proteção e isolamento indicadas em meio à pandemia.

Rodríguez, por sua vez, diz que a diferença não deve ser feita em termos de saudável ou doente, mas de infectado ou não.

“Uma pessoa assintomática é uma pessoa infectada que não desenvolve sintomas e cujo organismo responde de tal forma que não tem manifestações clínicas”, indica.

Sobre os anticorpos, a epidemiologista Morales explica que se tratam de proteínas que estão no sangue e que foram produzidos como consequência de estarem expostas a uma infecção por um micro-organismo, “seja ele bactéria, vírus ou parasita”. Mas enfatiza que anticorpos não são sinônimos de vírus atenuado.

Cataño, por sua vez, indica que os vírus atenuados são a forma que os cientistas buscam para estimular o sistema imunológico.

“Quando nós, epidemiologistas, falamos de vírus atenuados, estamos falando da base das vacinas. Coletamos um vírus e lhe damos tratamento químico e físico em laboratório para que possa estimular o sistema imunológico da pessoa que está sendo vacinada sem que isso signifique causar a doença. É como se estivéssemos encorajando o corpo a gerar anticorpos. Então é biologicamente impossível que o vírus entre magicamente no corpo e saia atenuado. Isso só pode ser conseguido em laboratório”, explica.

Os especialistas consultados concordam que hábitos de vida saudáveis podem ser um fator favorável no comportamento que o corpo humano tem diante dos vírus, mas isso não significa que todos tenham a mesma resposta.

“Uma pessoa com hábitos saudáveis de vida tem mais chances de um resultado favorável quando contrai um vírus. Se alguém tem fatores de risco como obesidade, hipertensão, diabetes, doença cardiovascular, pode desenvolver as fases mais graves da doença, mas isso não significa que alguém que tem um estilo de vida mais saudável tenha uma chance zero ou garantida de superar o vírus. Por exemplo: tivemos pacientes saudáveis, jovens, que adoeceram e morreram de COVID-19. A parte genética também tem muito a ver e este é um fator que ninguém pode controlar”, assinala Cataño.

O epidemiologista Rodríguez acrescenta que as rotinas saudáveis não se referem apenas aos alimentos consumidos, ou aos exercícios praticados, mas que existem outros determinantes sociais, como o ambiente em que se vive, se há aglomeração, ou qual é a carga de trabalho, entre outros.

Fortalecer o sistema imunológico


A última afirmação diz que não são necessários itens de proteção como máscaras e luvas, ou medidas de distanciamento social, e, eventualmente, as vacinas - tratadas nas postagens virais como “alteradas” -, mas “fortalecer nosso sistema imunológico, para que ele gere anticorpos naturais”. Também assinala que em quarentena “a única coisa que podemos fazer é ficar realmente doente”.

Cataño afirma que não há como gerar anticorpos apenas pelo fortalecimento do sistema imunológico. Da mesma forma, a epidemiologista Morales enfatiza que “somente quando as pessoas são expostas a um vírus é que seu próprio sistema gera anticorpos. Essa resposta não pode ser transmitida, exceto nos casos mencionados”, explica.

E acrescenta que “o objetivo da quarentena é evitar o contágio maciço, que colocaria os sistemas de saúde em risco, e proteger os vulneráveis”, concordando com Cataño que, “a priori, é difícil saber qual pessoa pode ter complicações com a doença”, ou como reagirá a ela.

A OMS explica que o objetivo desta restrição de atividades no âmbito da atual pandemia é prevenir a propagação da doença e que as máscaras ajudam a proteger da infecção.

“Qualquer pessoa que esteja doente e apresente sintomas leves, como dores musculares, tosse leve, dor de garganta, ou cansaço, deve se isolar em sua casa e usar uma máscara de proteção”, aponta o organismo.

Sobre as luvas, essa organização sinalizou que não são uma forma eficaz de prevenir a infecção e que “lavar as mãos frequentemente proporciona mais proteção diante do contágio”.

Os Centros para o Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) indicam que o distanciamento social “é uma das melhores formas para evitar se expor ao vírus e desacelerar a sua propagação em nível local, nacional e mundial”.

“Considerando que as pessoas podem espalhar o vírus antes de saber que estão doentes, é importante se manter afastado de outras pessoas se for possível, inclusive se você ou elas não tiverem sintomas”, destaca.

Em resumo, com base nas informações fornecidas por organizações de saúde e por especialistas consultados pela equipe de checagem da AFP, uma pessoa assintomática pode sim transmitir o vírus, mas não pode espalhar anticorpos.

Esta verificação foi realizada com base em informações científicas e oficiais sobre o novo coronavírus disponíveis na data desta publicação.

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