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Estado de Minas DEMARCAÇÕES INDÍGENAS

O que muda na sua vida (e em Minas Gerais) se o PL 490 for aprovado?

Nessa terça-feira (29/6), o PL 490 recebeu mais um sinal verde no Congresso: mas qual o impacto na nossa vida caso seja aprovado?


30/06/2021 16:41 - atualizado 30/06/2021 19:12

Terras atualmente protegidas podem perder a preservação e abrir caminho para agropecuária, mineração e afins(foto: Mario Vilela/Funai)
Terras atualmente protegidas podem perder a preservação e abrir caminho para agropecuária, mineração e afins (foto: Mario Vilela/Funai)
Protestos por todo o país - inclusive com bloqueio de estrada mineira -, hashtags nas redes sociais, tensão no Congresso e até confrontos. Além da CPI da COVID, o noticiário foi invadido nos últimos dias pela votação de um projeto de lei, o PL 490. Afinal, o que a aprovação - ou não - impacta na sua vida e na dos indígenas?
 
Antes, uma contextualização. A proposta, na verdade, é de 2007 e foi desengavetada agora, 14 anos depois. Nessa terça-feira (29), inclusive, recebeu mais um sinal verde: foi aprovada, sem nenhuma alteração, pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados.
 
O próximo passo é ser apreciada no plenário e, caso aprovada, vai ao Senado antes de receber o aval do presidente da República para se tornar lei - e alterar o Estatuto do Índio
 

Qual o impacto? 

 
O texto muda o chamado marco temporal para a demarcação de terras indígenas. O que isso quer dizer? Se aprovado, apenas as terras que já estavam em posse dos indígenas antes da promulgação da Constituição - portanto, até outubro de 1988 - podem ser consideradas desse povo. E a demarcação que hoje é feita apenas pela Funai (Fundação Nacional do Índio) também seria flexibilizada.
 
“Os atos demarcatórios implicam em sobreposições de áreas indígenas às áreas de proteção ambiental, estratégicas para a segurança nacional, como, por exemplo, as localizadas na faixa de fronteiras, de propriedades privadas destinadas à produção agropecuária e outras atividades produtivas importantes para a viabilidade econômica de Estados e Municípios”, diz trecho do PL 490/07.
 

E na prática?

 
“Os impactos seriam de ordem cultural e ambiental, tendo em vista a supressão das características naturais dos povos indígenas com a facilitação de convívio e relacionamento forçado”, explica Wallace Carvalho Costa, advogado e professor de Direito Ambiental.  
 
Lideranças indígenas temem - ainda mais - pelo futuro das etnias(foto: Mario Vilela/Funai)
Lideranças indígenas temem - ainda mais - pelo futuro das etnias (foto: Mario Vilela/Funai)
“A questão ambiental viria em relação à exploração da floresta e seus substratos, especialmente com a abertura para mineração e garimpo, atividades categoricamente ricas economicamente, mas altamente degradadoras”, esclarece o especialista.  
 
O que hoje é considerada área preservada justamente porque á habitada por povos indígenas poderia ser utilizada para instalação de hidrelétricas, por exemplo. Ou ocupada por mineração, arrendamento, estradas... 
 
"É preciso lembrar que as terras indígenas preservam mananciais de água, uma quantidade grandiosa de plantas, animais, e tudo que causa o equilíbrio na questão ambiental como um todo”, enfatiza Douglas Krenak. Ele vive com cerca de 200 famílias na aldeia Krenak, que fica no município de Resplendor, no Vale do Rio Doce.

A etnia reivindica a Terra dos Sete Salões, área que, além de Resplendor, abrange as cidades de Conselheiro Pena, Itueta e Santa Rita de Itueto, todas também no Rio Doce.   
 

'Retrocesso'

 
O projeto ainda prevê a flexibilização do contato com povos isolados. "Isso infringiria preceitos constitucionais e afrontaria os direitos de liberdade. Vale lembrar que os povos isolados não possuem memória imunológica, como também atrelamento a doutrinas religiosas externas, impostas por possíveis doutrinadores religiosos”, afirma Wallace Carvalho, ao alegar que o texto é inconstitucional.
 
Yakó Krenak, da mesma etnia de Douglas, reforça a importância da preservação dessas áreas hoje protegidas. “A natureza será afetada de forma direta por exploração de seus recursos naturais, uma vez que sua preservação é de extrema importância para o bom funcionamento do ecossistema", explica.

Povo Krenak protesta em Brasília contra a aprovação do PL 490/07(foto: Warra Teporan/Arquivo pessoal)
Povo Krenak protesta em Brasília contra a aprovação do PL 490/07 (foto: Warra Teporan/Arquivo pessoal)
"Isso gera um sentimento de revolta em nós, indígenas, porque estão tentando retirar o que é nosso e o que a gente vem fazendo há tantos anos, que é a luta pela mãe terra!”, complementa.  "É uma afronta aos povos indígenas que, por direito, precisam de seus territórios demarcados. Não vejo nexo em estabelecer um marco temporal para tal questão”.
 
Outro líder dos Krenak, o professor Itamar Krenak, participa dos protestos em Brasília. “Estamos na luta contra esse retrocesso, essa proposta é totalmente agressiva com os nossos direitos, devido ao risco que temos de perder aquilo que é nosso. O Brasil inteiro está se mobilizando e fechando rodovias contra esse projeto”.
 

Protestos

 
Além de Brasília, Minas é palco de protestos desde a manhã dessa segunda-feira (28). A BR-259, próximo ao distrito de Independência, em Resplendor, é ocupada por indígenas, que liberam a pista apenas para veículos de emergência e pessoas enfermas. Além das exceções, a estrada é desocupada, a cada três horas, por 60 minutos. 
 
Indígenas interditam a BR-259, em Resplendor, como forma de manifestação(foto: Ezequiel Medeiros/Arquivo pessoal)
Indígenas interditam a BR-259, em Resplendor, como forma de manifestação (foto: Ezequiel Medeiros/Arquivo pessoal)
Também há presença do povo Krenak na capital federal. Um dos integrantes do grupo que protesta em Brasília, Lírio Krenak, conta que estão acampados em frente ao Teatro Nacional há duas semanas e que, por parte dos povos indígenas, as manifestações têm sido pacíficas. 
 
“Eles querem tirar o nosso direito de ser humano, de poder ter a nossa cultura, de ter uma casa para morar. Junto com o PL 490, vem o 191, que anistia os crimes dentro das nossas terras”, enfatiza.  
 

O povo Krenak 

 
“Na história da luta indígena, nossos povos sempre lutaram para permanecer nos territórios, mas vêm sendo expulsos”, ressalta Douglas Krenak sobre as origens da aldeia. “O povo Krenak é um subgrupo da nação Borum, que vivia nos territórios hoje conhecidos como Minas Gerais, Bahia e Espírito Santo”. 
 
Indígenas reunidos na aldeia Krenak(foto: Reprodução/Krenak Imagens/Instagram)
Indígenas reunidos na aldeia Krenak (foto: Reprodução/Krenak Imagens/Instagram)
Ainda de acordo com o indígena, o povo Krenak “perambulava nas regiões do Rio Doce, em busca de alimento e sobrevivência, mas sempre cuidando das terras e preservando o meio ambiente”. 
 
É por isso que, para Douglas Krenak, o marco temporal do PL 490 não faz sentido, porque a luta indígena antecede a própria Constituição. “O governo brasileiro matou, violentou e retirou os povos indígenas de suas terras durante esse tempo”, conclui.

Mulheres Krenak em dança típica na aldeia(foto: Reprodução/Krenak Imagens/Instagram)
Mulheres Krenak em dança típica na aldeia (foto: Reprodução/Krenak Imagens/Instagram)
Procurada, a assessoria da Câmara dos Deputados afirmou que não há previsão para que o projeto seja encaminhado à votação em plenário. 
 
 


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