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Estado de Minas Disparada de preços

Alta de combustíveis ameaça serviços de transporte por aplicativo

Com gastos para abastecer o carro que passam de 50% da renda obtida na atividade, motoristas consideram deixar a profissão. Taxistas também sentem a pressão


12/03/2022 04:00 - atualizado 12/03/2022 07:36

Gleisson demonstra indignação com aumentos de preços dos combustíveis
O motoboy Gleisson Siqueira reclama da falta de ação do governo e admite que pode desistir da profissão (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press )
Se a vida dos motoristas de aplicativos de transporte de passageiros já estava difícil, os novos aumentos nos preços dos combustíveis podem levar ao encolhimento do setor, prejudicando a prestação do serviço. Taxistas também reclamam da elevação dos gastos para trabalhar. Há casos em que metade do ganho apurado no dia é levado na hora de abastecer o carro. A Petrobras aplicou reajustes, ontem, nas refinarias, de 18,77% na gasolina e 24,93% no diesel e na distribuição o gás de cozinha ficou 16,06% mais caros. Os repasses às bombas nos postos começaram ontem mesmo.

A situação dos motoristas de transporte de passageiros por aplicativo é desesperadora, segundo Paulo Xavier, presidente da Frente de Apoio Nacional ao Motorista Autônomo (FANMA).  Os trabalhadores estão gastando mais da metade da renda diária na compra de combustíveis. “A situação que vinha se arrastando numa equação muito difícil para o motorista, devido a tantas altas ao longo desses anos, e agora piorou muito. No início das operações por aplicativo, o combustível significava no máximo 20% da receita. Hoje, ultrapassa a 50%. Os motoristas têm selecionado melhor as corridas. É necessário critério que considere valor do quilômetro rodado. Hoje o condutor trabalha mais, alguns chegam a 15 horas por dia, não porque estejam ganhando mais, mas para diluir os custos.”

O motorista João Pedro seleciona corridas para administrar gastos
João Pedro passou a gastar o triplo para abastecer o carro usado no transporte de passageiros por aplicativo (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
De acordo com Xavier, a principal despesa é o combustível, mas existem outros gastos a ser considerados, como troca de óleo todo mês e manutenção de pneus. “Sem contar o custo de vida, os alimentos básicos subiram muito. Um carro popular que há três anos custava R$ 30 mil, hoje não se compra por menos de R$ 70 mil. Estamos lutando por reajuste nas tarifas das corridas, mas as operadoras são muito resistentes”, afirma.
Morador de Contagem, na Grande Belo Horizonte, e motorista de aplicativo há cinco anos, Veron Guilherme cumpre jornada de 12 horas diárias. “Há 5 anos a gasolina era 25% da despesa, e hoje está em 50%. As taxas de aplicativos podem chegar a 40%, dependendo das corridas. A gente depende do usuário, portanto a despesa não pode ser jogada ao consumidor. Se você ganha R$ 200,  R$100 vão para gasolina, R$ 20 para o carro, R$ 15, alimentação e o que sobra são R$ 65. O usuário reclama, mas os motoristas estão avaliando as corridas, quilometragem, deslocamento."
 
João Pedro Costa, de 26 anos, se mantém na atividade, mas considera que já não compensa. “A gente tem que selecionar muito as corridas. Para cada dez chamadas, atendemos duas que valem a pena. “Piorou muito. Eu colocava R$ 50 de combustível, hoje é R$ 150. Já penso em mudar ramo.”
O motoboy Gleisson da Silva Siqueira, de 46 anos, ficou indignado com os reajustes. “A situação está complicada. Até penso em desistir da profissão. Com esse aumento do combustível, onde vamos chegar? O governo não faz nada, ninguém faz nada, ninguém agiliza”, afirmou.
 
Foi o que fez o motorista de aplicativo Farid Mothaw Granja, 36 anos. “Começava a trabalhar às 8 da manhã e parava por volta de 21h, gastando, em média, R$ 120 com gasolina, e pagava R$ 50 de diária. Sobravam 60 reais por doze horas diárias. Desisti de trabalhar com aplicativo de passageiros. Passei a trabalhar com Ifood, com moto. Corro mais risco, mas preferi porque com o aumento de combustível ficou impraticável”, conta.

Taxista Júlio Borges roda, em média, 100 quilômetros por dia
O motorista de táxi Júlio Borges diz que os gastos com gasolina subiram de um quinto da renda para quase a metade (foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press)
Concessionários A situação não está muito diferente para quem trabalha como motorista de táxi auxiliar. Mailton Rogério Liberato, diarista, diz que seu carro gasta um litro de gasolina a cada 7,5 quilômetros rodados e 5 litro com álcool. “Atualmente só uso gasolina. Pago diária de R$ 80, abasteço R$ 130, em média, e ainda tem a alimentação. Trabalho, em média, 14 a 16 horas de domingo a domingo. Isso para ganhar R$ 50 a 60 reais por dia. Só começo a ganhar meu dinheiro a partir de R$ 250”, reclama
 
Júlio Cezar Barbosa Borges é concessionário de um táxi, e diz gastar média que varia conforme o dia da semana entre R$ 80 a R$ 150. “Antes desses aumentos todos eu gastava, em média, um quinto com combustível, e, hoje, gasto quase a metade do que faço no dia abastecendo. Rodo, em média, 100 quilômetros por dia. Por mês, tenho um gasto em torno de R$ 2.600 com combustível e manutenção.”
 
A artesã Raquel Monteiro é usuária frequente de transporte por aplicativo e mora em Nova Lima, na Grande BH. Ela notou, nos últimos três meses, um aumento da demora pelo serviço. Quanto a valores diz que não notou muita diferença. “Apenas em horário de pico os preços se elevam, aí eu aguardo uns 10 minutos e solicito novamente. Tem sido recorrente também o cancelamento de viagens”, afirma.

Em nota, a plataforma POP 99 informou que está atenta à situação do país e tem investido esforços e recursos para reduzir o impacto da crise econômica global e os consequentes reajustes dos combustíveis, que afetam os motoristas parceiros e a todos. A empresa afirma que o índice de cancelamentos na plataforma registrado em todo o Brasil nos últimos 12 meses está abaixo de 5%, “a menor porcentagem do setor”, afirma. A plataforma Uber não respondeu à reportagem até o fechamento desta edição.

Empresas de ônibus terão escala reduzida

Após os aumentos nos preços dos combustíveis anunciados pela Petrobras, as empresas de transporte público de Belo Horizonte divulgaram, ontem, um desabafo, sustentando que o setor enfrentará o colapso, diante de grave crise financeira. Segundo o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra-BH), o reajuste de 24,9% no preço do diesel nas refinarias inviabilizará toda a atividade, que já se encontra deficitário desde o ano passado.

A entidade afirma que as despesas do transporte público, em janeiro, giraram em torno de R$ 64 milhões, enquanto a receita foi de R$ 58,9 milhões proveniente da cobrança de tarifa dos usuários. Hoje, as empresas empregam cerca de 8,5 mil funcionários, sendo 5 mil motoristas, na capital. “Os recursos financeiros gerados pelas tarifas cobradas dos usuários não são suficientes para custear o diesel usado na operação e pagar a mão de obra. O aumento divulgado pela Petrobras inviabiliza a continuidade da operação”, afirma o presidente do Setra-BH, Raul Lycurgo Leite.
 
O sindicato enviou ofícios à prefeitura da capital, à BHTrans, empresa responsável pela gestão do transporte público na capital, à Câmara Municipal de BH, ao Ministério Público e à Justiça de Minas Gerais como alerta para a gravidade do problema vivido pelas empresas. “Agimos dentro dos limites do contrato. E ele prevê uma revisão extraordinária emergencial quando eventos dessa magnitude ocorrem. Solicitamos uma reunião emergencial com a prefeitura para levar a situação”, afirma Lycurgo Leite.
 
O presidente do Setra-BH explica que as tarifas de ônibus não são reajustadas desde 2018, uma das razões apontadas pelo colapso do setor. No ano passado, a PBH conseguiu o desbloqueio de R$ 4,3 milhões retidos na Justiça para o custeio de despesas com a folha salarial e diesel.
Lycurgo Leite diz que as empresas não vão paralisar os serviços, mas atuarão em escala reduzida. “O contrato prevê que haja reajuste das passagens. Porém, o poder público pode prever que esse é um evento temporário em razão da guerra Rússia e Ucrânia e prever um subsídio temporário. Entretanto, é uma decisão para as autoridades. As empresas implantarão plano de guerra para tentar evitar o colapso".
 
“Para que o plano de guerra seja bem pensado e implantado e para que a população tenha tempo suficiente para ser adequadamente informada, os serviços permanecerão com sua viagens e quadros de horários normais até o final da noite de terça-feira, dia 15/03/2022", afirmou o Setra-BH, em nota. A prefeitura de BH foi questionada sobre o problema, mas não se posicionou até o fechamento desta edição. (RD)


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