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Estado de Minas

Alegria dos brasileiros e as relações calorosas contaminaram os japoneses

Durante os tempos da difícil adaptação em solo estrangeiro, os dois povos uniram forças para vencer as adversidades


postado em 14/01/2018 06:00 / atualizado em 14/01/2018 09:17

Amor pelas flores guiou a família do metalúrgico Kenji Inoue e se transformou em negócio(foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)
Amor pelas flores guiou a família do metalúrgico Kenji Inoue e se transformou em negócio (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)

Ipatinga – Na porta da sala de visitas está a gravura de um samurai sobre o mapa do Japão. Com precisão cirúrgica, Masateru Kobayashi, de 76 anos “completos”, enrola o guerreiro, aponta a cidade onde nasceu no Japão, Kusatsu-machi, no estado de Gunma, e revela com simpatia: “Deixo o mapa aberto, pois sempre tem alguém me perguntando de onde vim”. A exemplo de outros conterrâneos pioneiros em Ipatinga, no Vale do Aço, Kobayashi trabalhou, ainda adolescente e junto com a família, em lavouras de São Paulo antes de chegar a Minas para trabalhar.

A nova experiência foi uma surpresa para o jovem de 20 anos, até então acostumado a plantar verduras e lavrar o solo. De repente, estava na linha de produção da usina siderúrgica. “Tive que me acostumar à nova linguagem, os termos técnicos, algo que nunca tinha visto.” A necessidade de trabalhar e ganhar a vida derrubou as barreiras, mas a falta de infraestrutura de Ipatinga, então um distrito ligado por uma estrada barrenta à sede do município, Coronel Fabriciano, não passava em branco. “Era horrível. Para chegar a Belo Horizonte, por exemplo, gastávamos 11 horas de trem e 9 de ônibus”, recorda. E enfrentar toda a dureza daqueles tempos, só mesmo com paciência. E isso Kobayashi teve de sobra, pois “muita gente não aguentou ficar e foi embora”.

 Sábio, o japonês, que veio para Minas com três irmãos, se lembrou de um ditado da sua terra – “nem que for em cima de uma pedra, você deve aguentar durante três anos” e decidiu ficar. O alojamento, apelidado de Candangolândia, depois Bairro Amaro Lanari, em Coronel Fabriciano, tinha acomodações minúsculas, com chão de terra batida, beliches com colchão de capim que espetava o corpo e um banheiro sui generis: o chuveiro era um tubo de meia polegada conectado a uma caixa-dágua.

 A exemplo de outros trabalhadores, para Kobayashi, o salário “bem interessante” salvava a pátria e ajudava a fixar a mão de obra na usina. “O problema é que não tínhamos onde gastar o dinheiro.” O tempo passou, Kobayashi teve quatro filhos e se tornou avô cinco vezes, sendo dois netos nascidos em Ipatinga. Ao lançar um olhar sobre os velhos tempos, conta que o amor pela pesca o livrou do tédio.

 “Hoje está tudo poluído, mas tinha as lagoas Silvana e do Bispo. Pesquei muito ali. Posso dizer que acompanhamos o crescimento da região, que melhorou em tudo. Não há do que reclamar.” Na despedida, o repórter olha para a estante da sala e pede para ver uma placa que traz as bandeiras do Brasil e do Japão lado a lado e foi entregue ao trabalhador, em dezembro de 2011, pela direção da Unigal, empresa do grupo Usiminas. “Acho que tivemos influência nesta terra, principalmente quanto a horário. O povo era meio relaxado quanto ao relógio”, explica Kobayashi, que só fez dois inimigos no Vale do Aço: o feijão e o alho.

Pioneiro na chegada a Minas, Masateru Kobayashi derrubou barreiras para trabalhar na indústria(foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)
Pioneiro na chegada a Minas, Masateru Kobayashi derrubou barreiras para trabalhar na indústria (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)

 

ESCOLA DE IKEBANA O amor imenso pelas flores, consideradas instrumentos de paz, e outro tanto pela arte virou unanimidade na família do metalúrgico Kenji Inoue, de 81, e da mulher Kikuko Inoue, de 78, mestre em Ikebana. Em 1973, o casal chegou ao Brasil com três filhas pequenas (Toshiko, Yoshiko e Taeko), mais especificamente a Belém (PA), para plantar pimenta-do-reino e difundir os ensinamentos de Tikufu Ota, pai de Kikuko, fundador do Centro Internacional Tikufukai. “O objetivo era ampliar os horizontes”, informa Yoshiko Honda, casada com Satoru e mãe de Makoto, de 13, e contabilizando a passagem de mais de 40 mil alunos no curso de ikebana (arranjos florais) na escola mantida pela família há 45 anos.

 A chegada da família Inoue a Minas – e em especial a Ipatinga, onde ocorreu “uma fusão profunda de culturas”, segundo Yoshiko – tem lances cinematográficos. Do estado pouco sabiam, a ideia inicial era mudar para Seattle, nos Estados Unidos, mas, ao chegar à cidade do Vale do Aço, Kenji pegou um táxi na rodoviária e teve a sorte de o motorista falar japonês. Então se estabeleceu e trabalhou 18 anos na siderúrgica.

 Na terça-feira, a equipe do Estado de Minas foi recebida pela família na casa do Bairro Ideal, podendo provar e aprovar a hospitalidade japonesa, bem como conhecer a arte de fazer arranjos com flores naturais (ikebana).

 À mesa, além do casal Inoue, estava Bárbara, de 16, filha de Taeko. “Temos gratidão por Ipatinga, houve muito respeito conosco. Se os japoneses trouxeram uma grande responsabilidade pelo trabalho, receberam de volta uma amizade calorosa e a alegria de viver dos brasileiros”, afirma Yoshiko.  (GW e MV)


Esporte como herança

 

Time de softbol é retrato da miscigenação em Carmo do Paranaíba(foto: Associação Esportiva Nipo Carmense/Divulgação)
Time de softbol é retrato da miscigenação em Carmo do Paranaíba (foto: Associação Esportiva Nipo Carmense/Divulgação)
Bem na entrada da Associação Nipo-Brasileira de Ipatinga (ANBI) há dois ipês, árvore símbolo do Brasil, plantados em 25 de março de 1967: um pelas mãos do então príncipe do Japão e atual imperador, Akihito, e outro pela princesa e agora imperatriz Michiko. No gramado que se tornou estacionamento, os associados praticavam um esporte bem popular na terra do sol nascente: o gateball. Filho de japoneses, o segundo vice-presidente e diretor de relações públicas da entidade, o aposentado Minoru Sakuraoka, diz que o esporte tem semelhança com o golfe, sendo praticado por pessoas mais velhas.

 Em Carmo do Paranaíba, distante 350 quilômetros de Belo Horizonte, o esporte também marca a vida dos imigrantes japoneses e ajudou a aproximá-los dos mineiros. As primeiras famílias desembarcaram na cidade de apenas 30 mil habitantes em 1973, para desbravar o solo. Oito anos mais tarde, integrantes das famílias Tanaka, Shimosaka, Sakaguti, Kawakami, Moriyama e Assanome criaram a Associação Esportiva Nipo Carmense.

 A determinação era resgatar a tradição japonesa do beisebol. Eles também criaram uma escola para ensinar a língua japonesa. O time participou de grandes torneios, mas se ressentiu da falta de recursos para continuar naquele formato. Desde os anos 90, a associação investe no softbol, uma versão mais leve do beisebol, para manter a tradição. Do grupo de atletas, hoje, fazem parte 26 pessoas, sendo 10 associados e 16 não descendentes. A associação tem trabalhado e se esforçado para conseguir recursos.

 A disseminação do esporte em Ipatinga é um dos orgulhos da comunidade japonesa, hoje estimada em cerca de 100 famílias: houve ganhos expressivos em natação e no judô. Dá para ver esse interesse, tanto que na sede da ANBI há aulas de bujikan budo taijutsu (ninjutsu), arte marcial japonesa praticada pelos ninjas. “É uma arte milenar”, conta o professor Claudiney Miranda. (GW e MV)



OUTROS TEMPOS , OUTRO MAR

1974
O então presidente Ernesto Geisel
e o primeiro-ministro japonês Kakuei Tanaka assinam acordo para o
desenvolvimento da agricultura no cerrado, criando o Programa de
Cooperação Nipo-brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados
(Prodecer). A implantação e o
assentamento de colonos começaram por Minas Gerais, nos municípios de Iraí de Minas, Coromandel e Paracatu

1984
Em agosto, a CVRD, os grupos japoneses Kawasaki Steel Corporation e Mitsubishi Corporation, e a Metalur Mecânica S.A fundam a Eletrovale
Indústria e Comércio, fabricante de ferro-silício, que originou a Nova Era Silicon, nome adotado em 1992.
A empresa hoje pertence à JFE
Corporation, resultado da fusão das siderúrgicas japonesas Nippon Kokan e Kawasaki Steel e à Mitsubishi



1986
O governo de Minas faz o pedido de empréstimo ao banco japonês JBIC ao Projeto Jaíba (foto), que é formalizado em 1991, com período de amortização de 25 anos. O projeto foi implantado em 1977 com o objetivo de desenvolver a agricultura irrigada na região,
então denominada Mata do Jaíba, entre os rios São Francisco e
Verde Grande


2012

A japonesa Panasonic inaugura sua primeira
fábrica de eletrodomésticos no Brasil, em Extrema, no Sul de Minas, com
investimentos de R$ 200 milhões. A empresa iniciou atividades no país em 1967, mantendo fábricas em
Manaus e São José
dos Campos

 

 


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