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Estado de Minas

Comida em self-service fica mais cara para o consumidor

Enquanto caiu a inflação dos alimentos comprados para consumo em casa, alta dos preços da refeição assusta quem precisa comer em restaurante durante a semana


postado em 27/11/2017 06:00 / atualizado em 27/11/2017 08:19

Marcos Afonso de Araújo, dono do Restaurante Tom Brasil, diz que garante preço e qualidade para manter o movimento(foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
Marcos Afonso de Araújo, dono do Restaurante Tom Brasil, diz que garante preço e qualidade para manter o movimento (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)

Antes mesmo de chegar ao caixa, o cliente antenado para o comportamento dos preços no sacolão e nos supermercados sente o desconforto com a conta da refeição no bar ou no restaurante. A sensação tem fundamento.

Comer e beber fora do lar voltou a encarecer neste ano, enquanto caiu a inflação dos alimentos e bebidas comprados para a casa. Em Belo Horizonte, a dança dos preços dessas duas despesas se inverteu depois de dois anos – 2015 e 2016 – em que os reajustes fora do domicílio perderam o lugar de vilões do orçamento para a comida e bebida preparadas na própria cozinha da família.


De janeiro a outubro, na Grande BH, a queda de 6,20% dos preços dos alimentos e bebidas no domicílio, veio na contramão do aumento de 1,73%, em média, desses gastos fora da residência, medidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o indicador oficial do custo de vida no país, apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essa disparidade no curso dos alimentos e bebidas em 2017 foi também observada no Brasil.

Segundo a mesma pesquisa da inflação oficial deste ano até outubro, os preços da alimentação fora do domicílio na média do país foram remarcados em 2,85%, ao passo que, dentro de casa, houve redução de 4,56%.

Analisados mês a mês em 2017, os dois gastos gravitaram em campos opostos durante quase todo o ano (veja o gráfico), no primeiro caso na linha positiva e, no segundo, com seguidas taxas negativas, à exceção de abril e maio, quando a alimentação no domicílio ficou mais cara.

Os reajustes captados pelo IBGE são aqueles baseados no preço final da comida e da bebida nos bares e restaurantes, como observa a economista Luciene Longo, analista do instituto em Minas Gerais.

Há diferenças nas despesas com alimentação dentro e fora de casa, tendo em vista uma série de outros custos incorporados nas refeições vendidas ao consumidor, como o gás de cozinha, energia elétrica, combustível e os salários pagos aos trabalhadores de bares e restaurantes.

“São custos que, quem oferece os serviços, acaba repassando ao consumidor, e isso resulta em maior peso no orçamento das famílias”, afirma Luciene Longo. As remarcações dos preços do gás de botijão e da energia elétrica residencial comandaram a alta da inflação de outubro, que foi de 0,42% no Brasil, ante 0,16% em setembro, e de 0,34% na Grande BH, em lugar de 0,24% no mês anterior. Quando considerado o período acumulado do ano, o gás encareceu 12,98% na média do país, quase seis vezes o IPCA geral, de 2,21%. As contas de energia elétrica residencial, por sua vez, ficaram, em média, 9,27% mais altas neste ano.

Ainda assim, para o consumidor intrigado, que se pergunta por que durante tantos meses as curvas dos reajustes ficaram em campos opostos, a analista do IBGE não descarta a possibilidade de um ingrediente a mais ter contribuído para a diferença no comportamento dos reajustes da alimentação dentro e fora de casa. Poder ter ocorrido uma reação dos bares e restaurantes, em tempo de crise econômica, que teriam procurado compensar com as remarcações dos preços a baixa da demanda nas lojas.

INEVITÁVEIS O presidente da seção mineira da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-MG), Ricardo Rodrigues, afirma que as empresas já vêm trabalhando com margens baixas do negócio, se adequando aos tempos mais duros com medidas de redução internas dos custos e fazendo repasses que são inevitáveis.

“Os custos fora do lar é que fazem a diferença. Eles carregam o abuso imposto pelo governo no reajuste do gás de cozinha e na bandeira vermelha que encarece a energia. Ainda assim, a inflação da alimentação fora de casa foi menor do que a média”, afirma.

Na Grande BH, o IPCA subiu 1,78% neste ano até outubro, ante 1,73% da alta da alimentação fora de casa. Na média do Brasil, os aumentos foram de 2,21% e 2,85%, respectivamente. Segundo o presidente da Abrasel-MG, o gás de botijão representa de 8% a 10% dos custos operacionais de bares e restaurantes.

A estimativa para a participação da energia elétrica nas despesas totais gira entre 5% e 7%. “Em 2015 e 2016, houve grande número de estabelecimentos que fecharam as portas, estimamos algo entre 25% e 30% do setor, tendo em vista a queda do faturamento e o fato de terem segurado os aumentos de custos”, diz Rodrigues.

Este ano, a Petrobras adotou a política de revisões mensais de preços dos combustíveis, alinhadas ao movimento dos preços do petróleo no mercado internacional, política oposta aos dos governos do PT, quando os reajustes foram contidos.

O comerciante diz, ainda, que as empresas que permaneceram na atividade se reinventaram, diminuíram custos, vencendo as dificuldades, até que o consumo parou de cair. “O segundo semestre está sendo um período de recuperação e algumas empresas já começam a procurar trabalhadores para recontratar.” Os cerca de 21 mil bares e restaurantes que atuam em BH e no entorno da capital mineira empregam ao redor de 116 mil pessoas.

Negociar com os fornecedores


"Tenho notado que há mais restaurantes oferecendo número maior de promoções aos clientes, talvez como forma de capturar o público" Sheila Castro, dentista e advogada (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)

Os alimentos in natura (os hortifrútis) e os de elaboração primária (basicamente carnes e leite) têm segurado a inflação este ano, o que favorece os gastos das famílias com alimentação no domicílio. E não há indícios de reviravolta nessa condição até o fim de dezembro, na avaliação de Thaize Martins, coordenadora de Pesquisas e Desenvolvimento da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas e Administrativas (Ipead), vinculada à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). É a esses produtos que se deve boa parte da queda de preços dos alimentos em 2017.

“Por mais que a matéria-prima básica dos bares e restaurantes esteja em queda, é possível inferir que outros custos interferem na inflação os alimentos fora de casa”, pondera Thaize, sem, no entanto, deixar de considerar a importância de uma boa pesquisa de preços e da concorrência. “Vale para o consumidor o alerta para que ele mantenha o senso de pesquisador, para aproveitar os melhores preços, e de que não precisa se fidelizar a nenhum estabelecimento para fazer suas compras”, afirma.

De acordo com a pesquisa da Fundação Ipead, que apura a inflação em BH medida pelo seu Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a alimentação na residência barateou 4,09% nos últimos 12 meses até outubro e a despesa fora do lar foi reajustada em 2,90%. No ano passado, os preços desses grupos de gastos evoluíram 7,32% e 3,67%, respectivamente. Em 2015, houve aumentos nos preços de 14,03% e 10,56%, também respectivamente. Não é por pouco que os clientes retomaram a velha marmita.

Pedro Mattioli, estudante do último período de Engenharia Elétrica na UFMG, teve de adequar sua rotina à mudança de preços. “Senti claramente o aumento. Costumava almoçar no Restaurante Universitário da UFMG, onde, antigamente, contava com o apoio financeiro da universidade. De um tempo para cá, porém, houve mudança nas regras e perdi o auxílio. O preço duplicou, infelizmente”, afirma.

ATENÇÃO A percepção sobre os reajustes contrastou com a conta paga pelas compras de casa e estava claro, segundo Mattioli, que almoçar em casa custava menos. Para a dentista e advogada Sheila Castro, que almoça fora de casa durante toda a semana, os preços nos restaurantes têm se mantido, possivelmente à custa da concorrência. “Tenho notado que há mais restaurantes oferecendo número maior de promoções aos clientes, talvez como forma de capturar o público”, afirma.

Lidar com as variações nos índices da inflação dos alimentos requer mais atenção e adoção de estratégias, da mesma forma, pelos comerciantes do setor. O proprietário do Restaurante Tom Brasil, localizado no Bairro Funcionários, Zona Sul de BH, Marcos Afonso de Araújo, conta que apostou em estratégias para manter a clientela e segurar os preços oferecidos ao consumidor. “Qualquer aumento que o comércio pratica gera percepção ruim nos clientes; é uma questão de mercado. E, mesmo que alguns produtos tenham seu preço ligado à sazonalidade, o fato é que as coisas estão, sim, muito caras”, reconhece.

Marcos Araújo diz que, cada vez mais, é preciso negociar com fornecedores para tentar manter o cliente na loja e garantir o faturamento do negócio. Ele conta que há 20 anos trabalha no ramo e, nos últimos quatro, vem sofrendo com a diminuição dos lucros. “Tenho movimento bom em meu restaurante, mas acredito que o caminho é tentar manter, ao mesmo tempo, o preço e a qualidade do serviço – mesmo em tempos de crise.”


(*) Estagiário sob a supervisão da subeditora Marta Vieira


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