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Estado de Minas OPINIÃO SEM MEDO

Nova Lima: até onde o Poder Público e a sociedade civil ficarão calados?

Considerada a cidade mais rica do país, Nova Lima é também vitrine da precariedade dos serviços públicos e graves problemas de infraestrutura urbana


16/03/2023 11:47 - atualizado 16/03/2023 14:53

Vista aérea do Vale do Sereno, em Nova Lima, MG
Especulação imobiliária: até quando? (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Poucos lugares do Brasil retratam tão bem nossas características socioeconômicas - e políticas - como Nova Lima, município com cerca de 100 mil habitantes que faz “fronteira” com Belo Horizonte, a capital de Minas Gerais.

Considerada a cidade mais rica do país, segundo recente pesquisa divulgada pela Fundação Getúlio Vargas, é também vitrine da precariedade dos serviços públicos e graves problemas de infraestrutura urbana, como tratamento de água e esgoto.

Fundado há 132 anos, o município vive dias de glória, com os cofres abastecidos pelos setores de mineração, serviços e, principalmente, imobiliário, que há cerca de 15 anos adotou a região (limítrofe à BH) como alvo de grandes investimentos.

Céu e inferno

O maior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do estado convive com um dos piores índices de coleta e tratamento de esgoto do país. Apenas 20% do que é gerado é coletado e, pasmem!!, deste número, ridículos 21% são devidamente tratados.

A falta de moradias e moradias em condições precárias, principalmente em áreas de risco, reproduzem o modelo cruel de distribuição de renda do Brasil. Enquanto prédios de luxo não param de ser erguidos, barracos são destruídos a cada temporada de chuvas.

Condomínios de altíssimo padrão abundam em todas as regiões da cidade, uma vez que contam com regras construtivas extremamente benéficas, principalmente se comparadas com as de Belo Horizonte. E aí mora o grande perigo e motivo desta coluna.

Mais caos à vista

Principal (e praticamente única) via de acesso à Belo Horizonte, a MG-30 transformou-se em avenida, com quebra-molas, semáforos e outras intervenções comuns às ruas, e não às estradas. O trânsito é simplesmente infernal nos horários de pico.

Em situações de emergência, não há o que fazer diante dos quase diários “nós” na região. Ambulâncias, viaturas policiais e do corpo de bombeiros, ou mesmo motoristas a caminho de compromissos ou atendimento hospitalar, desesperam-se impotentes.

Trânsito em rodovia obriga pessoas a caminhar
É inadmissível a condição da MG-30 (foto: Reprodução/Redes Sociais)
Não bastasse o fluxo atual - e crescente - de automóveis, caminhões e carretas, proibidos de trafegar pela via, estes desrespeitam as leis e contam com a precariedade da fiscalização. Estamos literalmente falando de uma “terra de ninguém”.

Não cabe mais

O adensamento do Vale do Sereno e do Vale dos Cristais (região mais valorizada do município, com residências que chegam a valer 30 milhões de reais) beira a crimes ambientais e, eu diria, sem exagero, contra a própria vida humana.

A sanha arrecadatória da cidade não tem limite, como também, a fome de dinheiro das construtoras. O resultado é um processo descontrolado de adensamento demográfico, levando à destruição do meio ambiente e significativa piora na qualidade de vida.

Se a situação já é insustentável - sem trocadilho algum - ficará ainda pior, pois mega empreendimentos imobiliários estão em construção e/ou em fase adiantada de projetos. Um deles, no “quintal” do Vale dos Cristais, é simplesmente alarmante. Atenção!

Constelações

Uma área de inimagináveis 7 milhões de metros quadrados, equivalentes a quase mil campos de futebol, foi vendida pela Anglo Gold Ashanti, mineradora sul-africana que explora a região, por cerca de 160 milhões de reais, para investidores imobiliários.

Mineração na Serra do Curral
Não vai sobrar nada (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
Presume-se que edificações residenciais e comerciais, em áreas hoje de servidão ambiental, objetos de TACS e áreas preservadas, serão erguidas, rasgando a mata - de fora a fora!! -, desconfigurando irremediavelmente a trilha que dá acesso a Macacos.

O que é orgulho da região metropolitana pela diversidade ambiental e belezas naturais, dará lugar a empreendimentos calculados em 5 bilhões de reais, alterando definitivamente o mapa local - sairá a natureza preservada, entrará ruas, espigões e shoppings.

Parem com isso; já

O setor de mineração já rasgou nossas montanhas, inclusive, nosso ex-cartão postal, a Serra do Curral. As construtoras já devastaram o Vale do Sereno, outrora bolsão natural e importante fonte de equilíbrio térmico de Belo Horizonte. Agora, querem mais.

Como farão para sair de casa os moradores da região, sobretudo os dos condomínios do Vale dos Cristais? Há apenas uma mísera mini ponte, um mísera mini rotatória e nada mais. E onde será coletado e tratado todo o lixo e esgoto resultante?

Não é possível colocar Belo Horizonte dentro de Nova Lima, e é isso o que vem ocorrendo sob as vistas grossas do Poder Público e a complacência da sociedade civil há mais de uma década. É hora de dar um basta nisso, pois depois não será, já é tarde!

Encerro

As autoridades ambientais do município e do estado ainda existem? Os órgãos de controle, como o Ministério Público, ainda existem? A prefeitura de Nova Lima ainda existe, para além do propósito arrecadatório? O bom senso dos empreendedores, talvez?

Ao que parece, as respostas para as perguntas acima são não, não, não e também… não! Daí eu faço mais uma pergunta antes de me despedir? Cidadãos - moradores ou não da região, mas que trafegam por lá - ainda existem ou já se foram todos?

Tal empreendimento tem de ser questionado e, dentro das vias adequadas e legais, impedido imediatamente, sob risco de irreversibilidade posterior, algo a que assistimos todos os dias. Lembrem-se: depois de derramado, o leite já era. Não adiantará chorar.

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