Pesquisa traça panorama da sexualidade dos brasileiros
Estudo mostra contradições entre desejo, frequência e prevenção e destaca desafios masculinos como ejaculação precoce
compartilhe
SIGA
Uma pesquisa inédita encomendada pela Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), em parceria com a farmacêutica FQM, e conduzida pelo Instituto Ideia, traça um panorama amplo e muitas vezes paradoxal da vida sexual no Brasil.
O estudo buscou um retrato fiel da diversidade brasileira, entrevistando 3.213 adultos, sendo 54% mulheres e 46% homens, de todas as regiões do país, com margens de erro de dois pontos percentuais. Os resultados revelam que, embora a maioria (56%) considere o sexo essencial para a harmonia do casal, poucos (5,3%) o citam como pilar da qualidade de vida, reforçando a necessidade de debater a sexualidade como parte integral da saúde.
Orientações sexuais
A psiquiatra e sexóloga Carmita Abdo, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade do Hospital das Clínicas de São Paulo, destaca que o cenário atual evidencia mudanças profundas em comparação com o início dos anos 2000.
“Duas décadas depois do primeiro estudo do comportamento sexual do brasileiro, os dados revelam um Brasil mais plural: diminuiu o número de pessoas que se declara heterossexual e aumentou quem assume outras orientações, refletindo menor constrangimento em manifestar as suas preferências sexuais”, afirma.
Tipos de relacionamento
No âmbito dos relacionamentos e das orientações sexuais, os dados apontam que cerca de 70% dos entrevistados estão em relações estáveis. A maioria das mulheres tiveram essas relações apenas com homens, enquanto 12,9% dos homens relataram relações com outros homens.
Além disso, 69% dos participantes que tiveram relações no último ano estiveram com um único parceiro, revelando certa predominância de monogamia.
Sobre esse dado, Carmita ressalta que mudanças importantes estão em curso: “A infidelidade masculina diminuiu de patamares entre 65% e 70% para 41,5%, enquanto o índice feminino subiu para 28,6%, em média, que varia conforme a faixa etária, indicando uma convergência de comportamentos e novas dinâmicas nas relações afetivas”, pontua.
Frequência e satisfação
A pesquisa mostra que o sexo acontece, em média, de duas a três vezes por semana para a maior parcela da amostra, enquanto quase um quinto afirma ter menos de uma relação semanal.
Apesar de quase 90% declararem sentir desejo sexual, apenas um terço das mulheres sempre chega ao orgasmo, ao passo que quase três quartos dos homens o fazem. Metade dos respondentes já fingiu orgasmo, com predominância feminina, evidenciando disparidades de satisfação entre os gêneros.
Cuidados e hábitos
As respostas também expõem contradições entre medo e prevenção. A principal preocupação é contrair infecções sexualmente transmissíveis (31,6%), seguida do receio de não satisfazer o parceiro (31,2%). Ainda assim, mais da metade admite não usar preservativos. Ao mesmo tempo, um terço dos entrevistados confessa já ter traído o parceiro, e quase metade relata ter sido traído, acentuando a necessidade de diálogo e prevenção.
O levantamento ainda aborda hábitos de vida e condições de saúde mental relacionados à sexualidade. Entre os participantes, 27% levam uma vida sedentária e 24,9% afirmam ter uma rotina estressante, ambas condições de risco para a função sexual.
Tratamentos para ansiedade e depressão são relatados por 16,3% e 12,6% dos respondentes, respectivamente, sinalizando a tendência crescente da sociedade médica contemporânea em valorizar a saúde mental, além da física, na avaliação e no resgate do bem-estar sexual.
Leia Mais
Iniciação sexual
A pesquisa também revela transformações importantes no acesso à informação e na relação dos jovens com a sexualidade. Segundo Carmita, “a educação sexual passou por uma mudança completa: se antes 70% buscavam informação em revistas e livros, hoje mais de 70% se informam sobre sexo pela internet, comprovando o impacto da era digital na formação e percepção da sexualidade”.
Ela acrescenta ainda que “a iniciação sexual, que acontecia entre adolescentes com seus respectivos colegas ou namorados(as), passou a ser frequentemente virtual, com acesso a vídeos e outras mídias digitais, inclusive, adiando o contato físico entre parceiros sexuais por meses e até anos”.
Saúde sexual masculina
Os resultados evidenciam que muitos homens ainda enfrentam questões não debatidas abertamente:
- Cerca de 9,6% relatam ejacular sempre mais rápido do que gostariam, e quase 39% dizem que isso ocorre ocasionalmente.
- Para 20,8%, o tempo até a ejaculação é considerado muito curto. Mesmo assim, 33% dos homens observaram que o parceiro reagiu com compreensão e buscou diálogo. Outros 14,9% receberam estímulos para continuar, enquanto 11,6% afirmam que o parceiro fingiu não perceber.
- 13,6% têm dificuldades para manter a ereção, 20,3% enfrentam dificuldade em controlar a ejaculação e 12,3% relatam baixo desejo sexual, embora 60,6% não apontem nenhum desses problemas.
“A ejaculação precoce, disfunção erétil e baixa libido ainda são tratados com muito tabu. Os homens precisam saber que há tratamento e que ir ao médico e pedir ajuda não é sinal de fraqueza, mas, sim, a busca por uma melhor qualidade de vida”, avalia o presidente da SBU, Luiz Otávio Torres.
Brasil precisa falar mais sobre sexualidade
A entidade ressalta que os dados reforçam a necessidade de ampliar o acesso à informação, promover campanhas de educação sexual e incentivar mulheres e homens a buscar ajuda quando enfrentam dificuldades como dor, falta de orgasmo ou ejaculação precoce. “Os resultados mostram que o Brasil precisa falar mais sobre sexualidade. A saúde sexual precisa ser compreendida como parte essencial da saúde integral.”
Segundo Luiz Otávio, “como entidade médica, a SBU tem a responsabilidade de acolher essa realidade e estimular uma cultura de cuidado, respeito e informação. Acreditamos que essas evidências ajudam a orientar políticas de saúde, ampliar o debate público e fortalecer ações de educação”, complementa o urologista, acrescentando que os resultados serão utilizados para orientar iniciativas de prevenção e conscientização sobre o tema.
Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia