Ana Cunha e Laura Queiroz são idealizadoras da rede que busca conectar mulheres negras na mineração -  (crédito: Pretas na Mina/Divulgação)

Ana Cunha e Laura Queiroz são idealizadoras da rede que busca conectar mulheres negras na mineração

crédito: Pretas na Mina/Divulgação

“Se eu quero falar de lutas femininas, também preciso falar de lutas femininas negras e das demandas específicas desse grupo”, explica Ana Cunha, diretora de Relações Governamentais e Responsabilidade Social da Kinross e conselheira do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM). Ela e a gerente de Mineração do Governo Britânico no Brasil, Laura Queiroz, são idealizadoras da Rede “Pretas na Mina”, uma iniciativa que ajuda a mapear as diferentes atuações das mulheres negras no setor da mineração.

Com o objetivo de reconhecer quem são as trabalhadoras negras que trabalham na mineração, Ana e Laura lançaram um formulário para que a Rede chegue ao maior número de pessoas – e chegaram a receber mais de 100 respostas nos primeiros dez dias de divulgação.

“Nossa intenção não é fazer um censo, mas para construirmos essa rede, a gente precisa ter acesso e escuta com a maior diversidade possível”, conta Ana em entrevista ao Estado de Minas.

“Um dos conceitos fundamentais de rede é que, sozinhas, não faremos nada, mas com os dados e as informações que tivermos, vamos nos conectar até com outras iniciativas, para além da gente”, complementa.

Marcadores de raça

O 3º Relatório da Women In Mining (Mulheres na Mineração) - WIM Brasil, mostrou que a participação feminina na força de trabalho e na liderança dentro das mineradoras tem avançado. A pesquisa, realizada em parceria com a Ernst & Young (EY), revelou que 21% da ocupação nas 33 corporações participantes corresponde a mulheres, e que o número de contratações do sexo feminino subiu de 32%, em 2022, para 43% em 2023. Nos cargos de gestão, também houve progresso, mas menor: o indicador saiu de 22% no ano passado para 24% neste ano.

A conselheira do IBRAM, no entanto, sentiu falta de um marcador específico de raça. “Não é só porque eu sou uma mulher negra, mas também porque o Brasil é um país racializado, e um recorte de raça seria muito interessante”, relata.

“Durante a nossa vida inteira, a gente teve que se deparar com essas questões por onde quer que estivermos, principalmente pela ausência de pessoas como eu nesses ambientes. Essa ausência foi se tornando cada vez maior conforme fui adentrando espaços de mais visibilidade, e só para ilustrar, atualmente sou a única mulher negra na diretoria da qual faço parte. A mineração ainda é um espaço de pouca diversidade”, acrescenta ela.

Para Ana Cunha, a Rede “Pretas na Mina” nasce no sentido de cocriação e precisa ser construída em conjunto. “Um caminho muito mais curto seria pensar individualmente quais as pautas importantes para este grupo, mas será muito mais rico se pudermos escutar de outras mulheres e pensarmos num futuro juntas”, conta.

“Eu conheço pouquíssimas mulheres negras que trabalham na mineração, mas seria possível que a gente não exista? Preciso saber onde essas mulheres estão. A gente precisa se conhecer, se conectar e, a partir daí, se estabelecer. Quais as nossas agendas? Como vamos endereçá-las? É muito importante esse passo num primeiro momento, porque precisamos entender quais as posições que ocupamos dentro das organizações, em quais regiões estamos, quais os desafios que temos enfrentado”, complementa ela.

Objetivos

A iniciativa Rede “Pretas na Mina” ajuda a mapear as diferentes atuações das mulheres negras no setor, além de fomentar a troca e a ampliação de conhecimentos por meio do compartilhamento de perspectivas para melhorar as oportunidades no setor.

“Isto ajuda a abrir cada vez mais caminhos de crescimento, ampliar a diversificação e fortalecer a mineração responsável no Brasil. Afinal, é por meio do coletivo que poderemos elaborar iniciativas efetivas para ampliar a nossa representatividade no setor, identificando e endereçando nossas especificidades”, explica Ana Cunha.

Quando perguntada sobre as expectativas para a iniciativa, a idealizadora conta que é importante pensar numa “mineração responsável” que pensa não apenas no gênero, mas também na raça – e que isso faça parte de ações efetivas das empresas mineradoras.

“Quando eu olho para o futuro desse movimento, penso que ele pode ter um potencial de ser um espelho para que a gente consiga estabelecer políticas e ações afirmativas que, de fato, sejam ações institucionalmente endereçadas pelo setor e pelas empresas. Nós temos essa capacidade de influenciar as tomadas de ação através de políticas e procedimentos que mudem o cenário ou que ajudem a mudar o cenário da diversidade na mineração brasileira”, afirma.

“Mas a gente não pode se conectar só pela dificuldade. Quando penso numa rede, é para endereçar as dificuldades, mas também para impulsionar as felicidades e histórias positivas”, finaliza ela.

A Rede “Pretas na Mina” já planeja um primeiro encontro nos primeiros meses de 2024.