CINEMA

Mulheres superam traumas e se tornam senhoras de si no filme 'Abre alas'

Documentário mineiro sobre o universo feminino, dirigido por Ursula Rösele, estreia nesta quinta (11/12) em Belo Horizonte

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“Como é possível existir uma conexão entre as gerações?”, perguntou-se Ursula Rösele uma década atrás. Na época, ela vivia realidades conflitantes. Em casa, com o filho Antônio recém-nascido, se deparava com mãe, sogra e tias reagindo, cheias de justificativas, à sua maternidade. No trabalho, como professora do curso de cinema e audiovisual da UNA, tinha alunas jovens recém-chegadas ao feminismo que olhavam para o mundo de forma hiperbólica.

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A resposta veio por meio de seu primeiro filme, “Abre alas”, que chega nesta quinta (11/12) aos cinemas. No longa, Ursula, de 45 anos, reúne sete mulheres, todas moradoras da Grande Belo Horizonte. Com idades variando de 53 a 85 anos, elas falam para a diretora com o coração aberto. Com situação econômica e nível de escolaridade diferentes, elas são, sem exceção, senhoras de si – tal ponto foi atingido já na maturidade, depois de grandes dificuldades.

Ainda que a diferença entre gerações tenha sido um marco para a própria Ursula se questionar – “eu ficava observando os dois lados”, diz ela, se referindo às parentes e às alunas –, houve ainda outro ponto relevante na motivação do filme.

“Escrevi o projeto em setembro de 2019 (no primeiro ano do governo Bolsonaro). Fiz um monte de pesquisas e encontrei uma, entre o primeiro e o segundo turnos (do pleito presidencial, em 2018), que dizia que mais de 50% das intenções de voto no Bolsonaro era de mulheres acima dos 60 anos”, conta Ursula. Curiosa em saber por que ele gerava identificação com tal grupo, resolveu buscar mulheres acima dos 55 anos para seu filme.

Aqui, um parêntese: ainda que “Abre alas” tenha a polarização política como um dos motivadores, é um filme sobre histórias de vida. Direita versus esquerda no Brasil não faz parte do jogo.

Eduardo Coutinho

Foi outro jogo que fez a cabeça de Ursula na concepção do projeto. Produtora cultural, docente e pesquisadora de cinema, ela realizou seu mestrado na UFMG com base em “Jogo de cena” (2007), documentário de Eduardo Coutinho (1933-2014). No filme, o diretor fez um chamado público para que mulheres comuns contassem suas histórias. Depois, as narrativas reais foram recriadas por atrizes como Fernanda Torres, Andréa Beltrão e Marília Pêra (1943-2015).

“Tive medo de ficar superficial ao construir um corpo muito diverso, mas resolvi correr o risco”, diz a diretora. Ela fez um chamado público, “bem mais singelo do que o do Coutinho, por meio do meu Instagram e de algumas pessoas da equipe”. Algumas das personagens vieram por meio deste anúncio. Outras eram conhecidas de Ursula, como Heloísa, sua ex-aluna, que enfrentou a dor de perder a filha.

Todas as sete personagens foram filmadas no mesmo cenário, um dos galpões da Funarte MG. Walkiria, que abre o filme, é mulher trans do Vale do Jequitinhonha que trabalhou no campo e agiu conforme as regras. Casou-se, teve filhos (hoje tem muitos netos), há 15 anos saiu de casa e conheceu a liberdade de viver como é. Lorena, também mulher trans, a despeito do apoio da família, teve que recorrer à prostituição.

Dora viveu um casamento que só muito mais tarde descobriu ser abusivo. Silvana passou por maus bocados trabalhando de sol a sol, até conquistar autonomia com a própria empresa. Regina recebeu o diagnóstico de câncer terminal, mas conseguiu sobreviver – vive bem, fazendo o que gosta e aproveitando cada momento. Sheila tinha família amorosa e estável até que uma tragédia colocou seu mundo – e dos que lhe são próximos – abaixo.

Dora e Silvana, personagens do documentário Abre alas, estão de perfil, frente a frente, em ambiente iluminado por uma vela
Dora superou casamento abusivo e Silvana penou para ter autonomia Nathalia Gomes/Divulgação

Ao contrário de Coutinho, cuja premissa era não conhecer as histórias de seus personagens antes de filmá-los, Ursula queria que suas convidadas se sentissem à vontade. Ainda na fase da pesquisa, entrevistou-as em casa. Mas na hora da filmagem, o cenário foi outro.

“Foi intencional tirá-las do espaço delas. Não queria muito o referencial do documentário, como quando a personagem é devota de Nossa Senhora, você vai lá e filma a imagem. Também não queria nada que gerasse opressão na fala. Por isso criei um ambiente cinematográfico, que assume a presença dos equipamentos. Você vê o tripé, a câmera, pois achei que o ambiente controlado seria o único jeito de nos sentirmos seguras.”

Também proposital foi a escolha de profissionais mulheres. Houve não mais do que três homens na equipe. O cenário onde todas falam é repleto de espelhos, “que trazem uma dimensão simbólica.” Além disso, algumas performances curtas intercalam as narrativas. A mais forte delas reúne Sheila e sua mãe. Prestes a completar 102 anos, Eunice Duarte Paiva toca piano em vídeo, exibido em cortinas, enquanto a filha passeia pelo ambiente. O trauma familiar havia deixado a pianista clássica durante 30 anos distante do instrumento.


“ABRE ALAS”


(Brasil, 2025, 109min.) – De Ursula Rösele. O filme estreia às 16h50, na Sala 3 do UNA Cine Belas Artes. Haverá também sessão na terça-feira (16/12), às 21h, na Sala 2 do Centro Cultural Unimed-BH Minas.

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