Mulher posa para o celular

Mulher posa para o celular

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Acreditar que o nariz é grande demais, as curvas corporais não são esteticamente bonitas e o rosto está envelhecido é algo comum dentro de um consultório de cirurgia plástica, mas em alguns casos isso pode esconder um problema que não é estético, mas sim uma doença caracterizada pela distorção da autoimagem. "O fenômeno de distorção de imagem, também conhecido como transtorno dismórfico corporal, é uma condição que faz com que as pessoas tenham um foco obsessivo em características que consideram inadequadas para sua aparência. Dessa forma, elas perdem a capacidade de reconhecer de forma realista a beleza do seu corpo. Essa é uma doença tão comum e que acontece com tanta frequência que mais de 4 milhões de pessoas na faixa etária de 15 a 30 anos apresentam esse transtorno no Brasil", explica a cirurgiã plástica Heloise Manfrim, sócia-fundadora da Brazilian Association of Plastic Surgeons (BAPS), entidade que preocupa-se com o problema, que vem crescendo por influência das redes sociais.

Somente para ilustrar, recentemente o TikTok criou um filtro chamado "My New Twin", que vem sendo chamado de "galã de novela" por transformar o rosto do usuário em uma imagem aprimorada, de capa de revista. "Hoje, está sendo muito comum principalmente por influência dos filtros dos aplicativos como Instagram e Snapchat ou até mesmo pelo photoshop que hoje faz com que o culto à aparência acabe massacrando as peculiaridades dos corpos reais, das vidas reais, de pessoas reais. Muitos pacientes chegam ao consultório buscando alterar tantos pontos da aparência e é necessário identificar esses distúrbios para o encaminhamento correto ao psiquiatra", acrescenta a médica.

Baseada em estudos internacionais sobre o tema, a BAPS enumerou três pontos principais para ajudar no diagnóstico. Segundo a associação, o cirurgião plástico deve: verificar a preocupação com um defeito imaginário na aparência, notando se a preocupação pode ser acentuadamente excessiva se uma ligeira anomalia física estiver presente; perceber se essa preocupação causa sofrimento clinicamente significativo; notar que a preocupação não é mais bem explicada por outro transtorno mental (por exemplo, insatisfação com a forma e o tamanho do corpo na anorexia nervosa).

"É um tema complexo e, na verdade, ainda é um grande desafio mostrar para cada paciente que é necessário que ele acolha cada mudança do seu corpo, e que às vezes o mais correto é investir na saúde do corpo e da mente. Não é um trabalho fácil, mas nós sempre precisamos estar ao lado dessas pessoas para orientar, acolher e acompanhar", explica Heloise. "É positivo querer melhorar, porque isso vai impulsionar a gente a procurar mais qualidade de vida, autocuidado e satisfação pessoal. No entanto, a gente vai precisar sempre entender que o principal foco é a nossa saúde e nós devemos ao máximo deixar de viver como refém da aprovação do outro", acrescenta a médica.

O paciente com transtorno dismórfico

O transtorno dismórfico corporal é observado em 5% a 15% dos pacientes de cirurgia estética. O sinal de alerta com relação aos aplicativos é que essa condição pode começar até na infância, mas geralmente tem início durante a adolescência - e hoje os jovens passam a maior parte do dia no celular.

"Nessa fase da vida, a autoestima ainda depende muito de uma 'boa' aparência, logo, aparecer bem nas selfies torna-se quase que uma obrigação. Há também o desejo de receber 'likes' e obter mais 'seguidores' nas mídias sociais, já que os adolescentes pensam nisso como sua posição social. No total, esses fatores motivam muitos jovens a querer se submeter à cirurgia plástica", explica.

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Qualquer área do corpo pode ser o foco de preocupação; no entanto, as áreas mais comuns são a pele (por exemplo, acne mínima, cicatrizes), cabelo (por exemplo, afinamento), nariz e formato do corpo. Segundo Heloise, a pressão estética também é algo que influencia nesse comportamento.

"Além da indicação do tratamento psiquiátrico, o cirurgião plástico deve recomendar sempre a todas essas pacientes que substituam essas horas de tela do celular por mais tempo de qualidade, para as pessoas com que elas convivem e amam. Sempre que possível pensar nisso, praticar atividade física, cuidar do seu corpo, cuidar da sua saúde mental, porque esses padrões simplesmente não devem existir", destaca.

A BAPS defende que a capacidade de identificar uma psicopatologia subjacente em pacientes de cirurgia estética auxilia o profissional na tomada de decisão sobre a realização ou recusa do procedimento solicitado, com o devido encaminhamento para tratamento psiquiátrico. "Melhorar as habilidades de comunicação com técnicas e perguntas de entrevista estruturada é valioso ao lidar com pacientes que procuram cirurgia estética, especialmente se houver suspeita de problemas psiquiátricos subjacentes", finaliza Heloise.