ilustração do Lelis sobre a Plasticidade do cérebro

ilustração do Lelis sobre a Plasticidade do cérebro


Não existem dois cérebros iguais. A veracidade científica dessa afirmação resulta da capacidade de aprendizagem de cada um, tornando único o que apenas na aparência é semelhante: a estrutura cerebral com seus bilhões de neurônios e trilhões de conexões neurais.

Outra descoberta da ciência para a humanidade, em especial para idosos, é que não há uma perda significativa dos neurônios à medida que envelhecemos. Podemos, portanto,  seguir pela vida toda aprendendo e reaprendendo.


“Sabemos que o cérebro forma novas conexões entre suas células pela vida inteira e algumas regiões cerebrais mantêm mesmo a capacidade de produzir novas células, ainda que esse fenômeno seja muito limitado”, explica o neurocientista Ramon Cosenza, de 74 anos, coautor do livro “Neurociência e educação – Como o cérebro aprende”.
 

Mas a longo prazo, pontua, é natural que o cérebro também envelheça e perca parte de sua capacidade dos primeiros anos. Cosenza faz até uma projeção hipotética, tendo em vista o aumento progressivo da expectativa de vida. “Aos 140 anos, estaríamos todos dementes”, sorri ele, antes de fazer essa observação.
 
APRENDIZAGEM Até lá, que tal levarmos em conta a plasticidade do cérebro, visto que a demência não chegará para todos? Antes disso, estaremos, em grande maioria, mortos.

Aproveitar essa maleabilidade cerebral significa uma oportunidade para treiná-lo de acordo com os nossos objetivos.

Em uma palestra virtual para estudantes da Universidade de Goiás (UFG), Cosenza reafirma o que a ciência descobriu há algumas décadas: o sistema nervoso “é muito plástico”, ou seja, está o tempo todo formando conexões. “E é isso que chamamos de aprendizagem”, esclarece.

Entretanto, ele destaca que há algo ameaçador para o cérebro no século 21.
 
AMEAÇADO Graduado médico, mestre e doutor pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e com pós-doutorado em duas universidades norte-americanas, em San Diego e Nova York, o neurocientista explica que diante do que ele chama de ‘presente futurístico’, advindo com as novas tecnologias, “nosso cérebro paleolítico está ameaçado”.

“Desde que surgiu a espécie humana – há 300 mil anos –, nosso cérebro praticamente não se modificou. Ainda temos o mesmo cérebro do primitivo homem das cavernas”, justifica.

Mas, o que antes era natural, o desenvolvimento paulatino do cérebro, em um ambiente social presencial e restrito, modificou-se completamente e, hoje, com as novas tecnologias, surge a necessidade de uma nova maneira de pensar, agir e aprender.

Por quê? “Construímos uma sociedade tão complexa que o cérebro começa a apresentar falhas diante das novas tecnologias e da grande quantidade de informações”, afirma.
 

Neurocientista, Ramon Cosenza

Neurocientista, Ramon Cosenza

Leandro Couri/EM/D.A Press

 

"Construímos uma sociedade tão complexa que o cérebro começa a apresentar falhas"

Ramon Cosenza, neurocientista

 

Algoritmos eletrônicos

Cosenza alerta que os algoritmos eletrônicos se tornaram mais potentes do que “os algoritmos que temos no nosso sistema nervoso”.

“Nossas decisões, intuições, desejos e emoções são decodificados e manipulados por algoritmos eletrônicos”, observa.

Nessa conjuntura irreversível de progresso da humanidade, Cosenza destaca algumas habilidades necessárias para sobreviver no ‘mundo futurístico’.

PILARES Ele cita “os quatro pilares para a educação no século 21”, premissas para quem quer autonomia em seu processo de aprendizado e estar no mundo de forma saudável, evitando ser ‘engolido’ pela tecnologia e pelas inúmeras telas que habitam o cotidiano nosso de cada dia – celular, computador, TVs, entre outros aparelhos eletrônicos.

Esses pilares foram apontados por uma comissão de especialistas criada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a a Cultura (Unesco), agência da Organização das Nações Unidas (ONU).

Em resumo, caberá ao ser humano do século 21, conforme a Unesco, aprender a fazer (usar o conhecimento para resolver problemas); aprender a conhecer (distinguir no excesso de informação o que é irrelevante e até mesmo desinformação); aprender a ser (relacionado ao mix inteligência, criatividade, responsabilidade e  espiritualidade); e, por fim, aprender a viver juntos, compreendendo que somos seres gregários, precisando sempre de conectividade uns com os outros, dentro de um sistema de valores comuns, revelando nossa interdependência com todos os seres vivos.

“Sabendo interagir, conviver, cooperar, com tolerância e respeito à diversidade, com empatia e compaixão. Uma das lições da pandemia (do coronavírus) foi deixar clara a falta que isso nos faz: viver juntos”, descreve o neurocientista.