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Estado de Minas ESPERANÇA

Descoberta facilita busca por medicamento contra o novo coronavírus

Cientistas investigaram como se forma a principal enzima envolvida na multiplicação do vírus da COVID-19 dentro das células


16/08/2021 14:51 - atualizado 16/08/2021 15:52

Cientistas descobrem como a principal enzima responsável pela multiplicação do coronavirus funciona(foto: Pixabay)
Cientistas descobrem como a principal enzima responsável pela multiplicação do coronavirus funciona (foto: Pixabay)
Cientistas ligados ao Centro de Pesquisa e Inovação em Biodiversidade e Fármacos (CIBFar) desvendaram detalhes do processo de maturação da principal enzima envolvida na replicação do coronavírus, conhecida como 3CL. A descoberta, descrita no Journal of Molecular Biology, facilita a busca de medicamentos capazes de 'sabotar' esse processo logo no início.
 

“Em um ano e meio de pandemia, já temos, no mínimo, meia dúzia de vacinas em uso clínico, mas nenhum fármaco com comprovada eficácia e segurança. Antiviral é mesmo mais difícil de desenvolver. Porém, ainda que tenhamos bons imunizantes, obter um medicamento para a COVID-19 segue sendo muito importante, caso o vírus escape da vacina”, afirma Glaucius Oliva, coordenador do CIBFar, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). 

No artigo, os cientistas descrevem o mecanismo molecular pelo qual a principal protease do SARS-CoV-2 – enzima responsável pela multiplicação do vírus – se autoprocessa. Com isso, ela se torna ativa para replicar o material genético do RNA dentro da célula hospedeira. Proteases são enzimas que quebram ligações peptídicas (gordura) entre os aminoácidos das proteínas. 

“Quanto mais entendemos o metabolismo do vírus e suas etapas de replicação, mais facilmente conseguimos vislumbrar alvos nesse processo para, então, desenvolver moléculas capazes de travá-lo logo no começo”, diz Gabriela Noske, doutoranda do CIBFar e primeira autora do artigo.

Segundo Oliva, este é um estudo de ciência básica, mas com aplicações imediatas. “Diferentemente do que observamos em outros vírus, como zika, dengue ou da febre amarela, no novo coronavírus a protease não atua de forma monomérica (como uma molécula isolada).” 

“Para que ela se ative e passe a multiplicar o RNA do SARS-CoV-2, ela precisa ser dimérica, ou seja, é necessário um par de cópias da protease para que ela possa cortar a si mesma e às outras proteínas responsáveis pelo metabolismo do vírus dentro da célula”, explica.

Múltiplas etapas


O RNA do SARS-CoV-2, vírus responsável pela COVID-19, possui uma proteção formada por lipídios e proteínas – entre elas a famosa 'spike', ou espícula, que compõe a estrutura de coroa que dá nome à família do coronavírus. Quando o vírus invade a célula e é englobado por ela, o RNA é liberado da cápsula.

Dentro da célula, o objetivo principal do vírus é se multiplicar. Nessa fase, as proteínas estruturais deixam de ter função fundamental (transporte do RNA e evasão do sistema imune) e entram em cena as chamadas proteínas não estruturais, responsáveis pelo metabolismo viral dentro do hospedeiro.

“O microrganismo precisa fazer cópias de seu RNA. Como ele não tem todos os mecanismos para isso, precisa sequestrar algumas funções da célula invadida. Outras funções metabólicas, específicas do vírus, cabem às proteínas não estruturais, como a protease principal e outras 15 moléculas. Nosso estudo teve como enfoque a protease principal”, conta André Godoy, coautor do artigo e pesquisador do Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo (IFSC-USP).

Godoy explica que, enquanto as proteínas estruturais costumam servir de alvo para o desenvolvimento de vacinas, as não estruturais são usadas como referência para os medicamentos antivirais. É o caso dos coquetéis usados no tratamento da Aids, que têm como um dos alvos a protease do HIV.

No ano passado, o experimento realizado por Godoy e a pesquisadora Aline Nakamura inaugurou a primeira estação de pesquisa do Sirius – o acelerador de partículas de última geração que está sendo finalizado no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas (SP).

Em três dias, com auxílio de um potente feixe de luz, foi possível determinar a estrutura de mais de 200 cristais de duas proteínas do coronavírus. Entre elas estava a protease principal, em várias formas e em complexos com vários ligantes.

“Junto com a spike, a protease principal é a proteína mais estudada no novo coronavírus. O que não se sabia até então era como o SARS-CoV-2 processa duas cópias dessa enzima para criar, na sua estrutura, a região chamada de ‘ciclo ativo’, onde consegue processar as outras proteínas sintetizadas a partir da informação contida no genoma viral. Existem outros tipos de vírus que também têm essa característica, a inovação neste estudo está em entender como isso tudo acontece”, ressalta Godoy.

Os pesquisadores explicam que, por ser um vírus de RNA, o SARS-CoV-2 já chega na célula pronto para ser transcrito pelo ribossomo e, desse modo, produzir proteínas não estruturais.

Porém, como ele tem uma única fita de RNA, antes é necessário decodificar todas as proteínas não estruturais (e estruturais) inúmeras vezes. Para isso, ele as produz como uma longa e única proteína (poliproteína), que depois precisa ser quebrada, formando as 16 moléculas responsáveis pelos mecanismos metabólicos.

“Por ser uma estrutura muito mais simples, o RNA do vírus codifica todas as proteínas juntas, coladinhas, como se fosse um longo colar de contas. São produzidas nos ribossomos da célula invadida na forma de uma longa poliproteína, que precisa ser cortada em pedaços. No entanto, existe um problema: quem corta as proteínas é a protease principal, que também está nesse ‘colar de contas’. Portanto, ela precisa dar um jeito de cortar a si própria e, a partir disso, ir clivando (fragmentando) as outras”, explica Oliva.

As análises com o feixe de luz síncrotron – um tipo de radiação eletromagnética extremamente brilhante e muito usada em estudos de biologia estrutural – permitiram que os pesquisadores identificassem como a protease principal realiza esse processo. O trabalho revelou que, ao clivar suas duas pontas, a protease principal modifica sua estrutura.

“Além disso, demonstramos que, para o processamento de uma das pontas (denominada C-terminal), a enzima precisa de um parceiro dímero, ou seja, uma proteína igual que consiga clivar a parte da frente. Ela consegue clivar uma ponta sozinha, mas não a outra. Já o parceiro (a outra proteína madura) vai se ligar a essa porção para então clivar o que falta”, relata Godoy.

O processo de maturação da protease principal, explica o pesquisador, permite que ela saia de um estágio em que faz parte de uma longa cadeia de proteínas, consiga se autoclivar na parte N-terminal, encontrar com outra cadeia dentro da célula, formar um dímero e fazer o processamento da porção C-terminal, formando por fim sua estrutura madura e ativa.

Luz no fim do túnel


De acordo com o coordenador do CIBFar, a farmacêutica Pfizer está fazendo ensaios clínicos com um medicamento que pode barrar a protease principal, mas em sua fase madura. 

A farmacêutica Merck também tem um estudo clínico com uma molécula que bloqueia outra proteína não estrutural, chamada polimerase – responsável por sintetizar cópias do RNA viral.

Oliva ressalta que todo medicamento antiviral atua se encaixando em um receptor. 

“O mundo inteiro está em busca de drogas candidatas que se encaixem na protease, porém, olhando a estrutura da enzima já pronta, madura. O que mostramos é que existem variações de estágios anteriores dessa protease que podem ser alvos mais interessantes para o desenvolvimento de fármacos. É como cortar a erva daninha antes que ela cresça”, conclui.

O artigo Um instantâneo cristalográfico do processo de maturação da protease principal SARS-CoV-2 pode ser lido aqui.
 
* Estagiária sob supervisão da subeditora Ellen Cristie. 
 

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