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Estado de Minas ENTREVISTA

Zé Silva: 'Brasil é gigante do agro, mas pode ser gigante muito maior'

Deputado federal destaca a importância de Minas no setor rural e expõe ideias para aliar a produção de alimentos à preservação ambiental


03/01/2023 06:00 - atualizado 03/01/2023 08:36

O deputado federal Zé Silva
Zé Silva (foto) é o presidente do Solidariedade em Minas Gerais (foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados )
Pronto para começar o quarto mandato como deputado federal por Minas Gerais, o agrônomo Zé Silva (Solidariedade) diz enxergar o agro como a "principal potencialidade do mundo". Ele chama a produção rural de setor "fundamental" para o estado e crê que a área pode ser impulsionada por meio do equilíbrio entre a chegada dos alimentos à mesa dos consumidores e a preservação do meio ambiente.

Apesar do otimismo, o parlamentar defende a facilitação das regras que os agricultores precisam seguir para conseguir financiamentos públicos. "O Brasil é um gigante do agro, mas pode ser um gigante muito maior", assinala ao Estado de Minas.

Zé Silva é mais um dos deputados mineiros a participar das edições especiais do "EM Entrevista", podcast de Política do Portal Uai. Nesta conversa, ele destrincha obras federais paralisadas em Minas e no país. "Conseguimos com que a Caixa reduzisse à metade a burocracia (para liberar recursos). Mesmo assim, não resolveu. Os ministérios do Planejamento e da Infraestrutura têm de utilizar ferramentas modernas de gestão", pontua.
No plano nacional, o Solidariedade vai compor a base aliada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em Minas, onde a legenda é comandada por Zé Silva, há alinhamento com o governador Romeu Zema (Novo). Por isso, a ideia é utilizar a agremiação como um elo entre o estado e a União.

Paralelamente, a cúpula do Solidariedade se prepara para receber o espólio de outro partido, o Pros, que vai se incorporar à sigla.

A íntegra da entrevista pode ser assistida no YouTube do Portal Uai. Leia a seguir os principais trechos.



Um dos principais setores da economia estadual é a mineração. Agora, há debates em torno do tombamento da Serra do Curral, alvo de projetos de exploração. Qual sua avaliação sobre o setor minerário no estado?
A prioridade do mandato é a agricultura, mas sou estudioso dos pontos estratégicos para Minas. Infelizmente, houve a maior tragédia do mundo, que foi o crime, o desastre, em Brumadinho. Presidi a Comissão Externa sobre o desastre de Brumadinho, me aprofundei muito no tema mineração e visitei países como Itália e África do Sul, onde ocorreram as maiores tragédias da mineração antes da que houve aqui. As principais proposições para uma mineração sustentável são de minha autoria. São nove projetos; quatro já estão no Senado e, cinco, na Câmara.

Trato de mineração cientificamente. A mineração é importante, mas não pode ser uma ameaça à vida e ao meio ambiente. Por isso, sou favorável ao tombamento da Serra do Curral. É um patrimônio de todos; parte de nossa história. Há tecnologias para fazer mineração sem afetar patrimônios como a Serra do Curral, o meio ambiente e a vida. Relatei um conjunto de projetos sobre a vinda do 5G ao Brasil. É possível fazer atividades minerárias sem colocar trabalhadores em uma cava.

A partir de 1° de fevereiro, vou assumir a coordenação de uma frente parlamentar pela mineração sustentável. A Serra do Curral tem outro valor que não só a riqueza do solo. Há outros lugares para minerar sem prejudicá-la.

Depois das tragédias de Mariana e Brumadinho, muito se falou sobre a necessidade de Minas diversificar as fontes de receita. Paralelamente à mineração, o estado tem grande lastro na agricultura. O senhor enxerga a produção rural como o principal caminho para diminuir a dependência econômica da mineração?
O agro, hoje, é a principal potencialidade do mundo. A ONU fez um estudo até 2050 da quantidade suplementar de alimentos que o mundo vai precisar para alimentar 10 bilhões de pessoas - pois esta será a população total - e espera que o Brasil produza 40% da quantidade a mais de alimentos. Por ser agrônomo, acompanho, desde a ECO 92, as mudanças climáticas. Fui às últimas três Conferências do Clima (COPs) representando o Parlamento brasileiro. Há uma grande expectativa de o Brasil superar o desafio de produzir alimentos e (ao mesmo tempo) preservar o meio ambiente. Em vez disso ser um problema para nós, vejo como potencialidade.

Há um projeto de minha autoria, o selo verde, que apresentei na COP de 2019, na Espanha. É uma das soluções para o Brasil ter esse diferencial. O mundo só vai comprar produtos do nosso agro se forem itens que não utilizem terras com queimadas e desmatamentos ilegais - ou ocupação ilegal. Não tenho dúvida de que o agro familiar e o agro com vocação para venda a outras nações são grandes potencialidades. Minas e Pará são os dois estados que estão implantando um sistema para dar esse diferencial competitivo (o selo verde). Tenho a convicção de que o agro de Minas é fundamental.

Uma das dificuldades é que, na grande maioria (dos locais) onde chega a mineração, acontece a 'minério-dependência'. As outras atividades da região praticamente deixam de existir. Por isso, há um projeto meu para que a mineração seja mais sustentável.

Existem debates importantes na saúde: o piso da enfermagem e a necessidade de retomar obras paradas - em Minas, há o caso dos Hospitais Regionais. Como avalia o cenário?
Em 2017, criamos uma comissão (na Câmara) para estudar porque o Brasil tem tantas obras paradas. O assunto foi tão bem debatido que quem me assessorava nessa comissão era o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), servidor de carreira da Câmara. Em 2019, publiquei um livro (Obras paradas: Entrave para o Desenvolvimento do Brasil). O ex-presidente Michel Temer atendeu a uma demanda da comissão, que presidi, e retomou 1.670 obras paralisadas - cerca de 70% delas eram na saúde, e as demais, na educação.

Entre 2017 e 2018, resolvemos um grande problema das unidades de saúde. O ministério liberava (recursos) para uma unidade de pronto-atendimento, a obra começava, geralmente em cidades de pequeno ou médio porte, mas, sem capital de giro, depois de 20% (de avanço), a empresa quebrava. Foi feita uma nova resolução do Ministério da Saúde e, agora, toda obra para a saúde tem os recursos 100% liberados. Por isso, praticamente não há obras (federais) paradas na saúde.

A pandemia nos colocou à prova. Só foi possível superá-la acreditando na ciência e na solidariedade das pessoas. Não houve, na prática, até agora, a criação do piso nacional para valorizar a enfermagem. Não apenas o piso vai resolver. É preciso ações integradas. Uma pessoa do Noroeste de Minas, em cidades como Unaí, se precisar de cardiologista, tem de ir a São Sebastião do Paraíso, a quase 1 mil quilômetros. Na saúde, não é preciso apenas os recursos, mas estratégias mais locais de atendimento, como os Hospitais Regionais. (Com) um conjunto de medidas de descentralização da saúde e da melhoria da gestão do SUS, que pode ser muito criticado, mas é o melhor sistema de saúde do mundo, e o trabalho de prevenção, podemos avançar muito.

O senhor citou a conclusão de algumas obras federais, mas o tema ainda é um gargalo. O presidente Lula vai ter condições de alavancar parte das obras que ainda estão paradas?
Em relação às obras paradas, retrocedemos bastante. Não estão paradas por falta de recursos. A primeira causa de obras paradas, com 39,6%, está ligada a falhas nos projetos executivos. O segundo motivo, com 9,8%, é o licenciamento ambiental. Em 2019, tivemos o menor índice de obras paradas no país. Eram aproximadamente 38 mil obras com contratos e recursos do governo federal - dessas, 29% estão paradas. Em 2017, eram 37,5%. Agora, na última fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU), voltamos a estar pior do que 2017: temos 38,5% das obras do país paradas.

É possível que o presidente atue nesse sentido. O problema não são os recursos. Nos anos 1990, um prefeito, quando fazia um convênio com a Caixa, tinha 2.226 dias entre a assinatura e a prestação de contas. No contrato, mais ágil, o prazo é de 1.326 dias. Conseguimos com que a Caixa reduzisse à metade a burocracia. Mesmo assim, não resolveu. Os ministérios do Planejamento e da Infraestrutura têm de utilizar ferramentas modernas de gestão.

Independentemente do presidente ou do ministro, o Ministério da Economia avançou muito com a plataforma "Mais Brasil", onde é possível conferir o local das obras e os recursos. Se eu fosse presidente, faria um decreto para que 100% dos recursos passassem por essa plataforma - infelizmente, pequena parte passa. Condição, cenário e funcionários preparados no ministério da Economia (da Fazenda agora) há para evitar com que obras sejam paralisadas.

O senhor tem interlocução junto a vários setores da produção rural. Qual deve ser a primeira medida do novo governo para alavancar o agro no país?
Mudar a lógica dos financiamentos rurais. Como funciona o financiamento da agricultura? Você empresta um recurso a uma taxa, e o banco cobra essa taxa mais alta. No mundo inteiro, entram recursos do tesouro (para cobrir) a diferença, chamada de equalização. O último governo, por meio de Paulo Guedes, tomou outra decisão: os bancos, o mercado, resolvem. Vamos ter um blecaute na safra. No Plano Safra passado, a taxa de juros aumentou de 23% a 67% se você quiser pegar um financiamento com a participação do governo. Para a agricultura familiar, a taxa subiu 67%; para o médio produtor, 23%. Em qualquer lugar do mundo, o Tesouro Nacional, com os impostos, paga a diferença e coloca recursos por seguro.

O grande produtor, que não precisa do governo, é financiado pelo mercado. Ele vai a qualquer banco ou trade, que compra a produção e financia a safra, e eles emprestam (recursos). No começo do governo Bolsonaro, a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), que regula a inflação, era de 2,5%; agora, está acima de 13%. Um grande produtor, se quiser um financiamento, paga mais de 20% (de juros). Se eu fosse presidente, a partir de agora, o governo equalizaria as taxas de juros para proteger a agricultura, dando recursos mais baratos e aumentando a competitividade.

Não se pode lançar um Plano Safra faltando um mês para o plantio. (É preciso) fazer um Plano Safra para cinco anos. Se você for montar uma fábrica de eletrodomésticos, não pode saber as regras 60 dias antes de começar a fabricar. Ninguém faz isso no mercado. Com o produtor, é desse jeito. Sessenta dias (antes da safra), em junho ou julho, lançam as regras do Plano Safra. Ficam sabendo das regras já com as sementes prontas. O Brasil é um gigante do agro, mas pode ser um gigante muito maior.

O Solidariedade apoiou Lula e Zema nas eleições de 2022. O senhor, pessoalmente, apoiou Zema, mas ficou neutro no pleito presidencial. Como será a relação com o novo presidente?
O Solidariedade tomou a decisão (de apoiar Lula), mas liberou os estados. Tomamos a decisão em Minas (neutralidade no pleito presidencial) para não que não houvesse conflito. Nossa relação é partidária. O Solidariedade é da base de Lula. Fui presidente da (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais) Emater quando Aécio (Neves) era governador, e Lula, presidente.

O Brasil não precisa de divisão, mas de união. Estive com o governador recentemente fazendo entregas de bens e viaturas às polícias Militar e Civil. Zema deixou um recado claro: não vamos olhar pelo retrovisor, mas daqui para a frente, trabalhar por Minas e pelo Brasil. O Solidariedade não vai faltar ao país no momento de fazer a ligação entre Minas e o governo federal. Somos da base de Lula, mas também críticos. Não significa que votaremos (a favor de) todas pautas que ele mandar ao Congresso. Como fizemos com Temer, Dilma e Bolsonaro. Temos a convicção de que apoiar um governo é apoiar pautas importantes para o Brasil.


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