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Estado de Minas ELEIÇÕES 2022

Crescem denúncias de assédio eleitoral no segundo turno em Minas

Estado tem o maior número de ocorrências de coação de patrões sobre funcionários a favor de determinado candidato


21/10/2022 04:00 - atualizado 21/10/2022 07:15

Ilustração
(foto: Quinho)

Minas Gerais é o estado com mais registros de denúncias de assédio eleitoral a funcionários por parte de patrões no segundo turno. Até ontem, a seccional estadual do Ministério Público do Trabalho (MPT) havia recebido 247 queixas desse tipo, envolvendo 215 empresas, bem à frente do Paraná, o segundo, com 98 ocorrências. Todas as acusações foram feitas a partir de 3 de outubro, um dia após o primeiro turno.

Em todo o Brasil, segundo o MPT, o assédio eleitoral no segundo turno já motivou 903 reclamações oficiais. Os números mineiros, portanto, correspondem a cerca de 28% do total nacional.

Um dos casos sob investigação ocorreu em Carmo do Cajuru, no Centro-Oeste do estado, onde a Líder Interiores, empresa do ramo moveleiro, teria reunido funcionários no pátio de sua sede para palestra a respeito de “conscientização eleitoral”.

A denúncia conta, inclusive, com áudio que teria sido enviado pelo governador Romeu Zema (Novo) parabenizando uma pessoa ligada à firma pela iniciativa e incentivando o voto no presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição.

Ainda ontem, em Passos, no Sudoeste do estado, a Justiça do Trabalho emitiu liminar ordenando que entidades lojistas da cidade removam das redes sociais vídeo em que dirigentes do Sindicato do Comércio Varejista (Sicomércio), da Associação Comercial e Industrial e do Clube dos Dirigentes e Lojistas de Passos pedem votos para Bolsonaro. Se a ordem for descumprida, todos estão sujeitos a multas diárias de R$ 30 mil, mas que podem chegar a R$ 1 milhão. O magistrado Victor Luiz Berto Salome da Silva determinou, também sob ameaça de multa, que os representantes das entidades gravem retratação e publiquem nas redes. Há pedido ainda para que a estrutura das associações não seja utilizada com fins eleitorais — o que pode gerar sanção de R$ 50 mil.

Hoje, o MPT-MG, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e o Ministério Público Federal (MPF) farão audiência pública para discutir com sindicatos de classe formas de combate ao assédio eleitoral nos ambientes corporativos. A ideia é propagar os canais de formalização de denúncias e mostrar, aos participantes, as providências tomadas durante a apuração. O MPT quer ainda tomar sugestões dos representantes de diversos setores profissionais para ampliar o cerco aos assediadores.

No plano nacional, depois de Minas e Paraná, os estados com mais denúncias são Santa Catarina (88) e São Paulo (79). Ao tomar conhecimento de uma denúncia, o MPT instaura procedimento de investigação, que é conduzido por um procurador do Trabalho. Para barrar o vídeo divulgado em Passos, o procurador do Trabalho Geraldo Emediato de Souza recorreu a uma ação civil pública (ACP), que deu origem à liminar do magistrado Victor Salome.

Segundo a também procuradora do Trabalho Elaine Nassif, que chefia a seção regional da Coordenadoria da Promoção da Regularidade do Trabalho (Conap), o pedido por medida cautelar é caminho frequentemente utilizado pela entidade.

“Se já houver prova cabal da participação noticiada, ele [o procurador do Trabalho] pode, diretamente, entrar com liminar. Temos priorizado essa via, principalmente quando notamos, no contato inicial, com os advogados ou com o noticiado [denunciado], que não há interesse imediato em resolver o problema. Quando há a possibilidade de adequação espontânea, emite-se uma notificação para retratação cabal”, disse ela ao Estado de Minas.

Cajuru 


Em Carmo do Cajuru, além do áudio atribuído a Zema, o caso envolve um convite compartilhado por meio de aplicativos de mensagens. São anunciadas as presenças do senador eleito Cleitinho Azevedo (PSC), e de seu irmão, Eduardo Azevedo, filiado ao mesmo partido e futuro deputado estadual. O texto é assinado por um grupo que se autointitula Movimento Brasil Acima de Tudo e informa que a palestra no pátio da Líder Interiores é destinada, sobretudo,  àqueles que estão pensando em votar  branco ou nulo.

Cleitinho não participou. Já Eduardo, vereador em Divinópolis, foi um dos palestrantes. “Hoje, vamos falar a verdade para centenas de colaboradores na empresa Líder”, chegou a afirmar o parlamentar, nas redes sociais. Procurado pela reportagem, ele disse ter participado a convite da direção da empresa para manifestar sua posição no segundo turno eleitoral.

“Falei exatamente quem eu apoio e todo mundo já sabe muito bem: a favor do presidente Bolsonaro. Foi só isso. Um posicionamento político que eles me pediram para dar dentro da empresa. Essa questão aí, de assédio, isso é conversa fiada”, afirmou, negando qualquer tipo de coação. “Inclusive, não estavam todos os funcionários. A empresa não obrigou a ir até o momento da palestra. A empresa deixou livre. Foi quem quis. Se fosse uma forma de assédio, teriam coagido os funcionários a comparecer”, emendou.

Na gravação creditada a Zema, há citação a uma pessoa chamada Aurélio – mesmo nome de um dos filhos de João da Mata Nogueira, fundador da Líder Interiores. “Aurélio, boa-tarde. Gostaria muito de estar aí com vocês no evento que eu já tive a oportunidade de participar no passado. Fico satisfeito de você e todo mundo aí da Líder de Carmo do Cajuru de estarem envolvidos, em um momento tão importante, que é o momento que vai fazer uma diferença muito grande na nossa vida”, ouve-se em trecho do áudio.

A reportagem entrou em contato com a assessoria de Zema, mas não houve retorno até o fechamento desta edição. Segundo a Líder Interiores, o evento ocorreu em espaço mantido pela companhia para proporcionar atividades sociais e esportivas à comunidade. De acordo com a empresa, a palestra de cunho político ocorreu porque o Movimento Brasil Acima de Tudo solicitou o empréstimo do espaço.

“Sendo tal espaço aberto à comunidade, foi franqueada a participação da população civil em geral, incluindo funcionários da companhia e de outras empresas, caso interessados em acompanhar o citado evento. A participação dos funcionários da companhia, assim como de toda a população, ocorreu voluntariamente, sem ingerência ou manifestação de qualquer diretor da empresa”, lê-se em trecho de comunicado enviado ao EM. O grupo afirmou ainda ser contra “qualquer ato que viole as liberdades individuais e o direito de escolha”.

Procurador critica “voto de cabresto”

Na decisão referente a Passos, o juiz Victor Salome explicou ter concedido a liminar pela exclusão do vídeo pró-Bolsonaro em virtude da urgência imposta pelo período eleitoral. “Visto que a simples retirada, por produzir eficácia prospectiva, é insuficiente à reposição do estado anterior, impondo a necessidade de medidas retrospectivas contra a propagação já consumada, para obtenção de resultado prático equivalente”, pontuou, justificando a necessidade de uma retratação.

Geraldo Emediato, o procurador responsável pelo pedido de liminar contra entidades comerciais de Passos, também defendeu a publicação de novo vídeo por parte dos autores das imagens iniciais. “Além de suspender as práticas ilícitas, é importante que chegue aos trabalhadores a retratação dos culpados antes do dia da eleição, para que possamos ter um pleito democrático, como determina a nossa Constituição e outros dispositivos legais. Não há que se admitir em 2022 o voto de cabresto, como era a prática do coronelismo dos anos 1920.”

Na peça pró-Bolsonaro, o presidente da Associação Comercial e Industrial de Passos, Renato Mohallem Santiago, prega abertamente o voto na chapa do PL. "Conscientize seu colaborador da importância da política econômica em vigor no nosso país atualmente", disse. Gilson Madureira, do Sindicato do Comércio Varejista, adota tom semelhante ao defender a reeleição de Bolsonaro. "Você que é nosso colaborador, pense nisso, pense em garantir o seu emprego para 2023."

Todos são investigados por ter cometido atos que configuram assédio eleitoral conta seus trabalhadores. Além disso, a Justiça Eleitoral e o MPMG foram oficiados do caso. Os empresários foram procurados pelo EM, mas nenhum dos três quis se pronunciar.

Prefeituras 

Segundo Elaine Nassif, o MPT de Minas já recebeu queixas vindas de oito cidades sobre suposto uso da estrutura das prefeituras para tentar convencer servidores a votarem em algum candidato. Para ela, casos de coação eleitoral, tanto na esfera pública quanto no âmbito privado, representam riscos à democracia. “O Ministério Público, em todos os seus ramos, é o único órgão da República encarregado de zelar pelo regime democrático. [A democracia é] uma expressão da cidadania que não pode, de forma alguma, utilizar das relações de trabalho”, defendeu.

De acordo com a procuradora, acusados de coação, se tiverem as informações contra si provadas, podem ser enquadrados em diversos tipos de crimes – comuns e eleitorais. O número de assediadores, segundo ela, é maior do que o de denúncias. Isso, porque, em alguns locais, pode haver mais de um operador instando funcionários a fazerem determinada opção eleitoral. “[É um] movimento  completamente constrangedor e absolutamente ilícito”, protesta.

Alerta em Montes Claros

Ministério Público do Trabalho (MPT) enviou à Prefeitura de Montes Claros e ao secretário de Desenvolvimento Social do município, Aurindo Ribeiro, recomendação para que os agentes públicos não façam intimidação ou constrangimento dos servidores públicos para votarem em determinado candidato. O documento foi expedido depois que Ribeiro foi denunciado ao Ministério Público de Minas Gerais e ao MPT por possível prática de assédio eleitoral. Circularam nas redes sociais áudios de reunião, na qual o secretário pede o empenho de servidores em um candidato a presidente apoiado pelo município. Nos áudios, Aurindo não cita candidato. Mas afirma: “De agora até o dia 30, tem serviço nosso todo dia. Mas temos que fazer política, sem prejuízo para o serviço. São dois projetos de governo diferentes. (Existe) um (que) não tem nada com Montes Claros (...). O outro tem tudo a ver”. Ribeiro nega que tenha cometido assédio. O procurador do município, Otávio Batista Rocha, também. “Até agora, não nos chegaram informações de que o secretário tenha coagido alguém ou perseguido algum adversário político”, afirmou Batista Rocha. (Luiz Ribeiro)
 


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