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Estado de Minas PROJETO POLÊMICO

Mineração na Serra do Curral no radar internacional

Conselho que assessora a Unesco, Icomos prepara alerta sobre risco de mina à área que integra reserva da biosfera


24/05/2022 04:00 - atualizado 24/05/2022 11:46

Serra do Curral
Flores silvestres na Serra do Curral, que integra a cordilheira considerada reserva da biosfera pela Unesco (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press - 4/5/22)

 

A descaracterização paisagística da Serra do Curral, com o sinal verde para instalação de mais um empreendimento minerário na região, põe em risco o título de Reserva da Biosfera, concedido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) à Serra do Espinhaço, cordilheira da qual o cartão-postal da cidade faz parte. A preocupação foi relatada pelo Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos, na sigla em inglês), órgão legitimado pela própria Unesco.

 

Uma série de características naturais e de biodiversidade foram consideradas para que a Serra do Espinhaço se tornasse uma área prioritária de conservação em 2005. A área se estende do quadrilátero ferrífero, próximo a Belo Horizonte, até o Parque Nacional das Sempre-Vivas, em Diamantina. “Na semana passada, a sede da entidade, em Paris,  protocolou um pedido para que se intervenha na Serra do Curral, um patrimônio que está sob grande ameaça”, conta Leonardo Castriota, vice-presidente do comitê brasileiro do Icomos.

 

Com mais de 40 anos de atividade no país, o conselho atua na supervisão e assessoria à Unesco na conservação e proteção dos sítios patrimônio cultural nacional. "Somos uma rede de especialistas, associada à ONU, que busca o cumprimento da preservação do patrimônio, das normas, e das técnicas para cada tipo de bem do patrimônio”, explica Castriota. “A Serra do Curral tem relevância mundial. Trata-se de um patrimônio da humanidade. Ela está no radar internacional há muito tempo”, afirma Castriota.

 

A entidade pretende lançar um alerta de patrimônio sobre a Serra do Curral, documento técnico que amplia o debate para a esfera internacional. “É uma espécie de denúncia internacional. Nos próximos dias, vamos designar uma comissão de técnicos internacionais para acompanhar esse licenciamento de mineração na Serra”, conta. O primeiro passo, segundo Castriota, é tentar o diálogo com os envolvidos. “Vamos ouvir as partes e fazer as recomendações preliminares. Se nada for efetivado, a análise é complementada pelo alerta”, comentou.

 

Mais do que um cartão-postal da cidade, ele afirma que o complexo da Serra do Curral que atravessa Belo Horizonte, Nova Lima e Sabará, é considerado um marco para a ocupação da região e abriga um rico tesouro natural. “A Serra transcende os limites da sua própria localização, inclusive precisamos colocar o olhar sob outras áreas desse complexo que também estão ameaçadas", afirma.

 

Rica em minério de ferro, a região começou a ser explorada por volta dos anos 1940. Segundo a arquiteta e urbanista Cláudia Pires, conselheira do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB/Seção Minas Gerais), a Serra passou por um processo de “destombamento” na década de 1970. “Foi um longo processo político, coordenado pelo governo militar na época da ditadura, para beneficiar as mineradoras. A Serra era tombada nos dois eixos, BH e Nova Lima, mas teve o perímetro de tombamento modificado por pressão política, deixando a parte de Nova Lima livre para exploração”, conta.

 

Hoje, o espaço é protegido apenas a partir de Belo Horizonte, tendo como eixo central a Avenida Afonso Pena. Essa proteção foi reiterada em 1991, com o tombamento, pela Prefeitura de Belo Horizonte, de toda a porção inserida nos limites da capital.

 

MAIS PESO Para a especialista, a entrada de um órgão de atuação internacional traz ainda mais peso para a discussão. “A Serra está dentro de uma unidade de conservação maior. Olhar para essa dimensão é importante para entender que há fragilidades no processo de licenciamento que precisam ser corrigidas”, declara. Para ela, o tombamento integral pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha), cujo processo teve início em 2018, pode ser a única arma para proteger a região. “Com um marco de preservação regulado pelo governo mineiro, seria possível garantir a integridade de todo o complexo verde e a exploração mineral seria vedada”, pontua.

 

O estudo de tombamento da região está pronto desde 2020, mas, até hoje, não foi aprovado pelo Conselho Estadual do Patrimônio Cultural (Conep). Para ela, “há uma manobra do governo estadual para permitir que a exploração mineral se estabeleça como atividade econômica principal no estado sem qualquer preocupação e, inclusive, em áreas de conflito ambiental, como a Serra do Curral”.

 

O plano da Tamisa inclui a exploração da região da Fazenda Ana da Cruz, na divisa entre Nova Lima e a capital. O terreno está próximo ao Pico Belo Horizonte, ponto mais alto da serra. O processo tem duas etapas: na primeira, espera-se extrair 31 milhões de toneladas de minério de ferro ao longo de 13 anos. Já a segunda fase consiste na lavra de 3 milhões de toneladas de itabirito friável rico, com dois anos de implantação e nove de operação.

 

 

Presidente do Iepha é prima de diretor da Tamisa

 

A presidente do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha), Marília Palhares Machado, nomeada para o cargo no dia 14 pelo governador Romeu Zema (Novo), é prima de primeiro grau do diretor executivo da Taquaril Mineração S/A (Tamisa), Guilherme Augusto Gonçalves Machado. Como presidente do Iepha, Marília assumiu também a Secretaria Executiva do Conselho Estadual de Patrimônio Cultural (Conep), órgão que decidirá sobre o tombamento estadual da Serra do Curral, visto como forma de frear o avanço da mineração no cartão-postal.  Por meio de nota, o governo de Minas  disse que Marília foi convidada a assumir o cargo por seu currículo, experiência e trajetória em defesa do patrimônio histórico.Já a  Tamisa afirma que ela e Guilherme são primos de relação distante e que "não há vedação legal na normativa estadual em relação ao parentesco” 

entre eles. 


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