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Estado de Minas PRESERVAÇÃO

Proteção da Serra do Curral esbarra em resistências do governo de Minas

Denúncia de que tombamento do cartão-postal de BH esbarra em travas na máquina pública foi feita por conselheiros do patrimônio em recente fim de mandato


23/03/2022 04:00 - atualizado 24/03/2022 18:55

Vista da Serra do Curral
Muralha que a população da capital escolheu como ícone da cidade, e que pode ser vista da Praça Sete, no Centro, tem sido afetada por exploração mineral e imobiliária (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)

Símbolo de Belo Horizonte, escolhido pela população, cartão-postal que enche os olhos dos visitantes, e paredão de pedra e vegetação sob constante ameaça. A Serra do Curral, na Região Centro-Sul da capital, demanda maior proteção e é isso que pede, com urgência, um grupo de integrantes do Conselho Estadual do Patrimônio Cultural (Conep). Em Carta Aberta de Denúncia, divulgada ontem, 10 dos 21 conselheiros informam que, embora se esforcem para o tombamento imediato do maciço, encontram forte resistência do governo estadual em suas diversas instâncias.
 
Diz o texto: “Estas resistências têm se configurado desde a deslegitimação do excelente dossiê que subsidia o tombamento até manobras jurídico-administrativas de protelamento do ato.” Os conselheiros esclarecem que, diante dos fatos, “denunciamos a gravidade das distorções promovidas pelo governo de Minas Gerais durante a tramitação do processo de tombamento da Serra do Curral e exigimos, entre outras providências: seja, imediatamente, reconhecido que a Serra do Curral já está em condição de tombamento provisório, conforme reza a legislação brasileira e o entendimento do Superior Tribunal de Justiça”.
 
Com esse argumento, o grupo de signatários defende que sejam suspensos processos de licenciamento que estão sendo conduzidos na serra. “Por essa razão, sejam suspensos todos os processos de licenciamento em curso que poderiam eventualmente afetá-la, direta ou indiretamente, incluindo-se o projeto Taquaril Mineração”.
 
O Conselho Estadual do Patrimônio Cultural é órgão colegiado, deliberativo, subordinado à Secretaria de Estado de Cultura e Turismo (Secult), ao qual compete deliberar sobre diretrizes, políticas e outras medidas correlatas à defesa e preservação do patrimônio cultural de Minas Gerais, como, por exemplo, decidir sobre tombamentos e registros de bens culturais. Na noite de ontem, o secretário estadual de Cultura e Turismo, Leônidas Oliveira, disse que a carta divulgada “não tem validade”, pois o mandato dos conselheiros venceu em 18 de janeiro e está sendo recomposto (período 2022-2024), ainda sem nomeações.

Exploração desenfreada

Para o professor, advogado e especialista em direito urbanístico e patrimônio cultural Daniel Silva Queiroga, um dos signatários da carta, o tombamento da Serra do Curral pelo Município de Belo Horizonte e pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) não é suficiente para protegê-la. “Precisamos do tombamento em âmbito estadual, pois o municipal abrange apenas os limites da capital, e a serra se estende a outros, a exemplo de Nova Lima. É fundamental aprovar o tombamento, mesmo provisório, para garantir a preservação”, afirmou.
 
A arquiteta e urbanista Débora Queiroz, especialista em patrimônio cultural e representante do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB/Minas Gerais) no Conep, destaca a importância paisagística, cultural e ambiental da Serra do Curral. “O tombamento não irá congelar as atividades na região, mas impedir os impactos e a exploração desenfreada que destrói as riquezas naturais”, observou Débora, chamando a atenção para nascentes existentes no maciço, que alimentam ribeirões. Ela destacou a data tão importante de divulgação da carta, quando é comemorado o Dia Mundial da Água.
 
Na Carta Aberta de Denúncia dos conselheiros estaduais do patrimônio cultural (Conep) à população de Minas Gerais, os autores explicam a necessidade do tombamento, diante da exploração pelas atividades de mineração e imobiliária. “A Serra do Curral é protegida pelos patrimônios municipal de Belo Horizonte e nacional, via Iphan, o que demonstra sua alta importância. No entanto, os dois tombamentos não são suficientes para sua proteção, posto que o primeiro se restringe aos limites do município de Belo Horizonte e o segundo atinge uma área muito restrita da serra. Assim, só o tombamento estadual garantirá a integridade da Serra do Curral, altamente pressionada pela sanha mineradora e imobiliária”, diz o documento.

Termo de compromisso

Os conselheiros enfatizam que devido à importância do maciço, “o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) celebrou, ainda no ano de 2017, Termo de Compromisso com o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha), que passou a ter a responsabilidade de contratar os estudos necessários para a elaboração do dossiê de tombamento da Serra do Curral em âmbito estadual, sendo que o próprio MPMG garantiu recursos para sua execução”.

À época, o Iepha assumiu a obrigação de conferir andamento prioritário à análise do processo de tombamento, submetendo-o à apreciação do Conselho do Patrimônio na primeira reunião ordinária subsequente à conclusão do dossiê. “O estudo foi concluído em 2020 e aprovado pelo Iepha nos primeiros meses de 2021, tendo o MPMG, em maio de 2021, expedido recomendação ao secretário estadual de Cultura, Leônidas Oliveira, para que o submetesse à apreciação do Conep na primeira reunião ordinária do conselho.”
 
O texto diz ainda que, “transcorrido todo o ano de 2021, não houve convocação de reunião do Conep. Face a essa demora, só após forte mobilização social e grande repercussão na mídia foi convocada reunião do conselho para 21 de dezembro de 2021, mas não foi incluído como ponto de pauta a proteção da Serra da Curral, sendo o tema tratado apenas como um informe questionando o dossiê aprovado pelo próprio Iepha e estendendo para mais de seis meses seu exame e até mesmo a propositura de um substitutivo, para que houvesse tempo de estimarem os ‘impactos econômicos’ do ato, procedimento nunca visto em qualquer ato de tombamento”, diz a carta.
 
Durante a reunião, os conselheiros que assinam a carta mantiveram a defesa do tombamento imediato da Serra do Curral, mas, segundo eles, “o encontro terminou de forma abrupta e desrespeitosa a todos, sem ao menos registrar as proposições e votos dos conselheiros”. Assinam a carta: Ângelo Adriano Faria de Assis, Bruno Braz Golgher, Daniel Silva Queiroga, Débora da Costa Queiroz, Flávio de Lemos Carsalade, Juliana Gonzaga Jayme, Luciana Teixeira de Andrade, Marcelina das Graças de Almeida, Maurício José Laguardia Campomori e Rachel de Sousa Vianna.
 
O Estado de Minas entrou em contato com o governo de Minas, mas não obteve posicionamento até o fechameneto desta edição. 


* Estagiária sob supervisão da subeditora Marta Vieira

AS REIVINDICAÇÕES

» Convocação imediata de reunião extraordinária com pauta única referente ao tombamento provisório da Serra do Curral

» Reconhecimento imediato de que a Serra do Curral já está em condição de tombamento provisório, conforme reza a legislação brasileira e o entendimento do Superior Tribunal de Justiça

» Suspensão de todos os processos de licenciamento em curso que poderiam eventualmente afetá-la, direta ou indiretamente, incluindo-se o projeto Taquaril Mineração

» Que a eventual recomposição do conselho seja realizada de forma livre e transparente, com a garantia de autonomia de escolha dos conselheiros pelas entidades que o compõem

» Evitar quaisquer ações de diminuição do poder deliberativo e representativo do Conep, tendo em vista que o conselho é a instância máxima de representatividade da sociedade nos processos de proteção do patrimônio cultural, direito difuso garantido pela Constituição brasileira




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