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Estado de Minas PROTESTO

Comissão Arquidiocesana questiona exaltação a Deus em exercício militar

Em nota, Comissão Arquidiocesana de Justiça e Paz destaca riscos da mistura do fundamentalismo e do fanatismo religioso com o Estado e as instituições armadas


26/03/2021 17:33 - atualizado 26/03/2021 23:27

Postura de sargento foi considerada uma agressão à premissa de que o Estado brasileiro é laico(foto: Reprodução de Internet)
Postura de sargento foi considerada uma agressão à premissa de que o Estado brasileiro é laico (foto: Reprodução de Internet)

Um vídeo, que viralizou na internet há algumas semanas, em que um sargento, instrutor da Polícia Militar, ao comandar exercício de ordem-unida faz uma pregação, exaltando Deus, gerou protesto da Comissão Arquidiocesana de Justiça e Paz da Arquidiocese de Belo Horizonte, que pediu, por meio de nota, esclarecimentos ao Governador do Estado de Minas Gerais e ao Comando da Polícia Militar de Minas Gerais.

A comissão considerou a prática contrária à proteção dos Direitos Humanos, à liberdade de consciência religiosa e filosófica, aos princípios constitucionais republicanos de laicidade do Estado entre outros direitos individuais, culturais e democráticos expressos na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

 

O fato ocorreu na 11ª Companhia PM, em Montes Claros. O comandante-geral do 11º regimento de Polícia Militar (RPM), coronel Wanderlúcio Ferraz dos Santos, determinou a apuração dos fatos. 

 



“Chegou ao conhecimento deste Comando Regional, por meio de um vídeo postado em redes sociais, a realização de exercícios de ordem-unida, na 103ª Companhia de Ensino e Treinamento, subordinada ao Estado-Maior desta 11ª RPM, supostamente em desacordo com o preconizado nos manuais da PMMG”, diz o pronunciamento do coronel.

 

As primeiras informações da PM de Montes Claros deram conta de que a ação foi de iniciativa e conduzida deliberadamente por um militar pertencente à referida Companhia, sem que tenha sido  planejada ou aquiescida pelo respectivo Comando.

“Reafirmamos que a Polícia Militar ratifica o seu respeito à pluralidade de crenças para a manutenção da democracia e dos direitos individuais e coletivos, e não coaduna com ações que tentam sobrepor a esse princípio constitucional.”

 

O vídeo chega a ser constrangedor para os alunos que estão começando na Polícia Militar. O instrutor está em um pedestal e fala aos policiais. Começa citando a PM, mas, logo em seguida, bradando, fala algumas frases, como numa pregação.

 

A posição da Comissão Arquidiocesana

 

O órgão da Arquidiocese ressalta que a "Academia de Polícia Militar de Minas Gerais é um espaço importante de formação de profissionais em segurança pública e tem como objetivo principal, submetido à Constituição, a proteção de todas as pessoas, independentemente de qualquer diferença que possa existir na diversa sociedade brasileira, observando, portanto, sempre, os princípios constitucionais republicanos do Estado laico brasileiro na formação desses profissionais.

 

Destaca ainda que “é um constrangedor exercício com soldados, comandados por um sargento da corporação militar, onde os exercícios são comandados com permanente referência a um 'deus' responsável pelo fato de estarem todos trabalhando na PM, ao qual todos devem obediência”.

 

A nota deixa clara a indignação com os gritos em que o sargento afirma que a autoridade da Polícia Militar vem desse “deus” e “senhor”.

E afirma: “Este fato contém um enorme perigo e grave violação da Constituição da República".

 

A comissão afirma também que o vídeo mostra uma conhecida técnica de lavagem cerebral, bastante eficaz e perigosa para a democracia e para a necessária observância por parte das forças policiais militares, da lei, da Constituição e da rede hierárquica de comando da instituição policial-militar.

 

Também cobra que seja feita uma investigação sobre a possível existência dessas práticas em outros lugares e momentos, não só no processo de formação dos servidores públicos civis e militares, como na prática diária de suas funções públicas, republicanas, imparciais, laicas e pautadas pelos valores constitucionais da diversidade, democracia, pluralidade e respeito a integridade física e mental de todas as pessoas.

 

 

A nota na íntegra

 

A Comissão Arquidiocesana de Justiça e Paz da Arquidiocese de Belo Horizonte, tomou conhecimento de uma possível prática contrária à proteção dos Direitos Humanos, à liberdade de consciência religiosa e filosófica, aos princípios constitucionais republicanos de laicidade do Estado entre outros direitos individuais, culturais e democráticos expressos na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

A Academia de Polícia Militar de Minas Gerais é um espaço importante de formação de profissionais em segurança pública e tem como objetivo principal, submetido à Constituição, a proteção de todas as pessoas, independentemente de qualquer diferença que possa existir na diversa sociedade brasileira, observando, portanto, sempre, os princípios constitucionais republicanos do Estado laico brasileiro na formação desses profissionais.

Um vídeo, amplamente divulgado em redes sociais, apresenta um constrangedor exercício com soldados, comandados por um sargento da Corporação policial militar, onde os exercícios são comandados com permanente referência a um “deus” responsável pelo fato de estarem todos trabalhando na Polícia Militar, ao qual todos devem obediência.

Aos gritos, o sargento afirma que a autoridade da Polícia Militar vem desse “deus” e “senhor”. Este fato contém um enorme perigo e grave violação da Constituição da República. Expliquemos.

O vídeo mostra a conhecida técnica de lavagem cerebral, bastante eficaz e perigosa para a democracia e para a necessária observância por parte das forças policiais militares, da lei, da Constituição e da rede hierárquica de comando da instituição policial-militar.

A técnica consiste na referência repetida, em situação de pressão psicológica, a uma autoridade superior, vazia de conteúdo. Não há referência a valores morais e éticos, mas apenas uma repetida e insistente referencia a um “deus” com autoridade inquestionável e que é bom.

Esse exercício repetido de maneira exaustiva cria uma espécie de “caixa vazia” na cabeça das pessoas vitimadas por esse processo. Propositalmente ausente de valores éticos e morais, esse “deus” do qual emana a autoridade da Polícia ou qualquer força armada, pode a qualquer momento preencher esse vazio, essa “caixa vazia” mental, com ordens que não serão questionadas.

O problema central é que, nessa ausência e impossibilidade de questionamento, aquele que se identificar como a vontade desse “deus”, aquele que tenha uma falsa “legitimidade” para falar em nome desse “deus”, pode, quando menos se esperar, efetivar comandos, que claramente serão superiores aos comandos da hierarquia policial militar que por sua vez está subordinada às leis e à Constituição, e ao Comando civil da autoridade republicana, no caso o governador, eleito pelo povo e também subordinado à lei e a Constituição e à vontade popular, vontade esta que produz as leis e a Constituição em uma democracia constitucional.

A existência dessa “caixa vazia” mental expressa por um “deus” que está no comando da Polícia, é, portanto, de enorme gravidade.

As consequências do fundamentalismo e fanatismo religioso, misturados com o poder do Estado e suas instituições armadas, nunca gerou nada diferente do que violência, totalitarismo e destruição.

A Comissão Arquidiocesana de Justiça e Paz vem, portanto, por meio desta, pedir esclarecimentos ao Governador do Estado de Minas Gerais, ao Comando da Polícia Militar de Minas Gerais, e mostra sua grande preocupação com fato divulgado, chamando atenção de toda a sociedade mineira e dos órgãos constitucionais municipais, estaduais e federais responsáveis pela proteção da democracia, sobre o ocorrido, esperando que seja um caso isolado, que, entretanto, caracteriza desvio de função e logo improbidade administrativa.

A correta apuração e esclarecimento de grave fato deve impedir que isso se repita na administração civil e militar nos três níveis de nossa federação.

É fundamental que ocorra uma investigação sobre a possível existência dessas práticas em outros lugares e momentos, não só no processo de formação dos servidores públicos civis e militares, como na prática diária de suas funções públicas, republicanas, imparciais, laicas e pautadas pelos valores constitucionais da diversidade, democracia, pluralidade e respeito à integridade física e mental de todas as pessoas.

 

Professor Doutor José Luiz Quadros de Magalhães

Presidente da Comissão Arquidiocesana de Justiça e Paz

 

Professor Doutor Marciano Seabra de Godoy

Presidente da Academia de Juristas Católicos Humanistas

 

Professor Doutor Robson Sávio

Presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos

 

 


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