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Estado de Minas Solidariedade

Pretos no Enem: saiba como ajudar a pagar a inscrição de estudantes de baixa renda

Mineiro fará a prova graças ao projeto, que banca a inscrição de pessoas negras em situação de vulnerabilidade socioeconômica


08/06/2020 18:00 - atualizado 08/06/2020 19:11

A ação voluntária Pretos no Enem surgiu na internet e virou uma grande corrente de solidariedade(foto: Pretos no Enem/ Reprodução)
A ação voluntária Pretos no Enem surgiu na internet e virou uma grande corrente de solidariedade (foto: Pretos no Enem/ Reprodução)
Em meio a manifestações antirracistas em todo o mundo, surge no Brasil uma iniciativa espontânea, voluntária e prática para ajudar pessoas negras em situação de vulnerabilidade: Pretos no Enem. Trata-se de uma ação voluntária para pagar inscrição do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de pessoas negras em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Até a manhã desta segunda-feira (8), mais de 20 mil voluntários já tinham se disponibilizado a pagar inscrições.

O projeto nasceu na rede social por meio de uma provocação da jornalista e podcaster cearense Lyara Vidal. “Li uma matéria que falava que 300 mil pessoas não conseguiriam fazer o Enem por não pagar a taxa de inscrição, então me ofereci pra ajudar pagando o boleto de dois pretos ou pretas que me seguissem no Twitter. Digo dois porque é o que cabia no meu orçamento. E falei de pretos e pretas porque estávamos no auge da discussão antirracista, imaginando o que a gente podia fazer pra diminuir o racismo”, contou ao Estado de Minas.

Ela disse que um amigo se ofereceu pra pagar uma inscrição, e outro se ofereceu para pagar outra. Assim, a iniciativa se tornou uma grande corrente. “Quem deu vida de verdade pra essa ação e  a transformou nesse negócio gigante foi o Luan Alencar, que mora em Juazeiro do Norte”, contou. Foi o Luan que conseguiu um grupo de 50 a 60 pessoas que se dispuseram a ajudar.

“Nem todo mundo pode doar, então tem gente doando o tempo: procurando instituições, cursinhos populares e alunos, organizando planilhas de padrinhos, gerenciando redes sociais, cuidando da imprensa, verificando boletos – somos muito cuidadosos com isso. É tudo organizado de forma horizontal. Tem gente de todo lugar do país”, acrescentou a jovem.

Guilherme Miranda, de 19 anos, é de Belo Horizonte e mora Ouro Preto. Ele fez a inscrição com a ajuda do projeto (foto: Arquivo Pessoal )
Guilherme Miranda, de 19 anos, é de Belo Horizonte e mora Ouro Preto. Ele fez a inscrição com a ajuda do projeto (foto: Arquivo Pessoal )
Guilherme Augusto Rosa Miranda, de 19 anos, é natural de Belo Horizonte e mora Ouro Preto (Região Central de Minas). Professor de dança e poeta marginal, ele fará pela segunda vez o Enem, o que só foi possível se beneficiando pelo projeto.

"O valor ardeu um pouco no bolso, pois, com essa pandemia, os trabalhos estão parados e, com isso, ficou difícil de pagar. Esse valor, pra quem é de baixa renda, desestimula, nem todos têm condições de pagar a taxa. Eu mesmo não consegui, mas graças a esse projeto vou estar ocupando uma cadeira para prestar a prova", comentou.

Guilherme conheceu a ação por meio da Rede União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) – entidade que luta contra os cortes e desmontes da educação, pela qual Guilherme representa sua cidade: "Será a segunda vez que irei prestar o Enem. Pretendo cursar história. Escolhi esse curso, pois sempre gostei de saber do passado e, como negro militante, quero contribuir para essa história. Aliás, os negros são a 'raíz' da nossa nação".

"Um projeto como esse estimula pessoas a conquistarem seus sonhos e ocuparem as universidades públicas federais do nosso país", acredita.

São milhares de histórias de jovens pretos que não têm condições financeiras de arcar nem mesmo com a inscrição do Enem. Lyara conta que o projeto recebeu, além de muitos relatos parecidos com o de Guilherme, depoimentos de mães-solo que precisavam dessa força porque não podiam tirar o dinheiro da pensão do filho para fazer a inscrição.

"Também recebemos muitas pessoas mais velhas que queriam muito uma oportunidade para ingressar no ensino superior para mudar de vida, principalmente, neste momento em que tantas pessoas perderam o emprego", afirma.

Enem e pandemia

As inscrições para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020 foram abertas no mês passado em meio a uma série de pedidos de adiamento.

Isso devido às dificuldades que os jovens devem encontrar no exame deste ano, principalmente, considerando as disparidades que podem se tornar ainda maiores entre estudantes de escolas públicas e particulares.

No mês passado, o Ministério da Educação (MEC) e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) informaram o adiamento das provas.

A avaliação, prevista para novembro, deve ser realizada em 30 ou 60 dias após a data divulgada no edital, e ser aplicada em dezembro deste ano ou em janeiro de 2021.

 

Lyara acredito que o não cancelamento vai atrapalhar bastante os estudantes. "O cenário é muito complicado. Temos escolas rurais que dependem do transporte rural; pessoas que estão esperando auxílio emergencial do governo federal até agora e não estão conseguindo, por exemplo, ter acesso à internet; pessoas que estão ilhadas sem nenhum meio de comunicação e que só usavam computador na escola. Essa ainda é a realidade de muitos brasileiros", afirma.

Ela pontua que esses estudantes vão estar em desvantagem se comparados aos alunos que têm um computador em casa, internet de alta velocidade e dinheiro para pagar cursinho on-line. 

"Já é uma vantagem ter tempo de estudar diante a pandemia. Muitos jovens estão correndo para cima e para baixo entregando comida por aplicativo. Muitos trabalham o dia todo", acrescenta. "Mas a gente esta tentando dar uma força e colocar pelo menos um preto na faculdade. Se conseguirmos colocar um, vamos ficar muito felizes." 


Alexandre Braga, membro da Comissão de Ações Afirmativas e Inclusão da Universidade Federal de Minas Gerais e presidente da União de negros e negras pela igualdade (Unegro-MG) exalta a iniciativa: “Tem ocorrido uma série de ações, e essa vem fortalecer a luta por mais negros e negras nos espaços de poder. Essa iniciativa pode aumentar o número de negros na disputa do Enem”.

Como faço para participar do Pretos no Enem

Voluntário

1 - Os voluntários preenchem um formulário, onde informam a quantidade de boletos com que poderão arcar;

2 - Preenchido o formulário, seus nomes vão para uma planilha, onde é feito o controle de quantas inscrições estão com promessa de serem pagas;

3 - Quando alguém envia o boleto solicitando a ajuda no pagamento, é selecionado o nome de um voluntário, que efetua a quitação e manda o comprovante.

Beneficiário

1 - Basta mandar uma mensagem para @pretosnoenem (Instagram)

2 - Com o boleto em mãos, o grupo entra em contato com algum dos voluntários, que pagará a inscrição. Posteriormente, é enviado ao beneficiado o comprovante do pagamento


Pretos e pardos na UFMG

De acordo com dados divulgados pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em 2018, entre os 32 mil alunos matriculados, 14 mil (43%) se autodeclararam negros: 11 mil pardos e 2,7 mil pretos.

Alexandre Braga afirma que não há dúvida de que as ações de cotas fizeram com que o número de pessoas pretas e pardas evoluísse nas universidades federais. Porém, ainda não é suficiente.

"Não temos dúvida de que os programas de ações afirmativas evoluíram e aumentaram o número de negros nas universidades. Mas, como é autodeclaração, muitos estudantes se declaram de acordo com a forma que acham melhor. Então, há vários processos judiciais analisando essas autodeclarações. Mas, se andar no campo da saúde, do direito, dos cursos mais elitizados da UFMG, você não vê, negros", afirma.


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