
No começo deste mês, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) divulgou em sua conta no Twitter um vídeo em que um suposto produtor mostrava o galpão vazio e afirmava que havia desabastecimento de alimentos no local, responsabilizando a quarentena. No mesmo dia a reportagem do Estado de Minas foi à Ceasa e constatou que o fluxo estava normal. O presidente apagou o vídeo e se desculpou por ter compartilhado as imagens sem a devida checagem. Já o responsável pela gravação responde a inquérito policial.
Nesta quarta-feira (22), o EM mais uma vez visitou a Ceasa e registrou o intenso trabalho dos feirantes no galpão. Segundo eles, alimentos não param de chegar. O difícil é conseguir clientela depois que as medidas de enfrentamento ao coronavírus fecharam escolas, bares e restaurantes.
Alaerte Conceição, de 55 anos, é um dos produtores que têm tentado contornar os impactos da queda nas vendas.Trabalhando na Ceasa desde os 18 anos, ele conta que nunca viu nada comparado à situação atual. Para driblar os prejuízos a solução tem sido baixar o preço do milho, que antes era vendido a R$ 20 e passou a custar cerca de R$ 15. “As vendas caíram demais porque o povo está com muito medo e a maioria está ficando em casa. Para a gente tá sofrido. Hoje mesmo foi fraco. Mas o produtor não desanima, mesmo vendendo mais barato a gente vende”.
Ao contrário do que alguns mais pessimistas projetavam, o fantasma do desabastecimento não assombra os corredores do galpão. Porém, o temor à exposição ao vírus está presente em quem trabalha em um local com grande circulação de pessoas. “Eu falo que um dos lugares mais perigosos de Minas é aqui. Porque tem gente de todas as partes do Brasil. Se for pelo que passa na televisão, a expectativa da gente não é boa. Para você se defender de uma cascavel, de um leão ou de um boi bravo tem como, porque a gente vê eles. Agora, para se defender de um vírus que você não vê, aí fica difícil”, compara Alaerte.
A infraestrutura do lugar acaba dificultando a adoção de práticas que impeçam o contágio pela COVID-19. A reportagem não encontrou no local pias com água e sabão à disposição dos feirantes. Outro problema é que, apesar de obrigatório, ainda é grande a resistência por parte desses frequentadores em usar máscaras. Alaerte era um dos poucos produtores que aderiram ao ítem.
Ciente dos riscos, ele se apega à fé ao afirmar que desconhece casos da doença relatados na Ceasa Minas. “Até hoje eu não ouvi falar que ninguém adoeceu aqui. Acho que Deus ajuda quem trabalha”.
A produtora Maria do Socorro, 46 anos, que há 10 trabalha na Ceasa, também tem amargado prejuízos. Ela conta que, assim como Alaerte, optou por diminuir os preços para não perder a mercadoria, que é muito perecível. “A banana nanica a gente vendia por R$ 35 a R$ 40 e hoje ela está R$ 15 a R$ 20. A prata estava de R$ 40 a R$ 50 e hoje está de R$ 25 a R$ 30. E as despesas são as mesmas, não diminuíram em nada, o transporte, o combustível, tudo com o preço alto”.
Ela conta que nem o preço mais baixo tem atraído a freguesia. “O abastecimento está ótimo. O que está faltando mesmo é comprador. Na verdade, enquanto estiver essa questão de estar todo mundo ficando em casa, nós vamos sofrer as consequências. Se está tudo fechado, restaurantes fechados, escolas fechadas, o nosso prejuízo vai ser grande, porque a gente não vai ter pra quem vender a mercadoria”.
Gilmar Alves, 51, produtor de Barbacena, Região do Campo das Vertentes, acredita que a situação só deve estabilizar com a volta do comércio. “Tivemos uma queda de uns 35% em função dos bares e restaurantes fechados, mas ainda não tivemos perda de produtos. Estamos torcendo para a flexibilização à medida que o pessoal da saúde entender que pode liberar”.
Em nota a assessoria da Ceasa explica que as pias com água e sabão ficam próximas ao plantão do MLP, local onde todos os produtores rurais precisam ir para marcarem suas áreas.
*Estagiária sob supervisão do subeditor Eduardo Murta