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Estado de Minas

Municípios do Norte de Minas enfrentam consequências da estiagem prolongada

Cerca de 120 mil pessoas são afetadas pela falta d'água na zona rural e dificuldades chegam à área urbana


postado em 09/04/2017 06:00 / atualizado em 09/04/2017 08:53

Helenice Santos Batista, de 42 anos, mãe de dois filhos, caminha cerca de 200 metros de sua casa até a caixa d'água umas 20 vezes por dia(foto: Luiz Ribeiro/EM/DA Press)
Helenice Santos Batista, de 42 anos, mãe de dois filhos, caminha cerca de 200 metros de sua casa até a caixa d'água umas 20 vezes por dia (foto: Luiz Ribeiro/EM/DA Press)
Francisco Sá – O Norte de Minas sofre duramente as consequências de quatro anos seguidos de pouca chuva. Com a repetição em períodos sucessivos, a seca está sendo ainda mais impiedosa com a região, produzindo efeitos devastadores que se mulplicam: lavouras destruídas, centenas de rios e córregos vazios, desemprego e o agravamento da escassez hídrica.


Segundo a Associação dos Municípios da Área Mineira da Sudene (Amams), cerca de 120 mil pessoas (27 mil famílias) são afetadas pela falta d’água na zona rural de 55 municípios norte-mineiros que decretaram estado de emergência por causa da estiagem. Mas, segundo a própria entidade, a população atingida pode dobrar, pois em 15 municípios da região a dificuldade de acesso à água também chegou para aqueles que vivem na área urbana.

Existem lugares onde os moradores são obrigados a consumir água retirada de outro município e transportada em caminhões-pipas. É o caso de Ibiracatu, de 6,1 mil habitantes, onde todas as nascentes e mananciais que abasteciam a população secaram completamente. A água vem da vizinha São João da Ponte, a 50 quilômetros de distância. Assim como Ibiracatu, a principal cidade da região, Montes Claros (384 mil habitantes), também está em situação de emergência, com seus moradores convivendo com o “rodízio” no fornecimento de água.

Francisco Sá, com 23,4 mil habitantes, encontra-se em estado de emergência há mais de dois anos, tempo em que a população da cidade também enfrenta racionamento. O município enfrenta problemas com a falta de água desde janeiro de 2015, em função da queda do volume da barragem do Rio São Domingos. Em agosto daquele ano, mesmo com o racionamento, o reservatório secou. Desde então, o volume da barragem não foi recuperado e, atualmente, está com 9% de sua capacidade, próximo de atingir o volume morto (6%).

A prefeitura continua recorrendo a poços tubulares para o abastecimento da área urbana, onde o racionamento persiste, com a água chegando nas torneiras das casas em dias alternados. A situação é pior na zona rural. Segundo a administração municipal, 2,4 mil moradores de 50 localidades rurais do município estão sendo atendidos com caminhões-pipas. Atualmente, existem oito caminhões-pipas (dois da prefeitura e seis do Exército) rodando nas comunidades rurais.

“Mas, nos próximos meses, quando a situação apertar mais, vamos precisar de pelo menos 15 caminhões-pipas”, afirma o prefeito de Francisco Sá, Mário Oswaldo Casasanta (PMDB). Ele diz que a cidade deverá enfrentar uma situação mais tenebrosa nos próximos meses, pois o período crítico da estiagem (maio a setembro) ainda está por vir. “Tivemos perdas de quase 100% das lavouras. A população rural empobreceu demais. Infelizmente, vejo que neste ano vamos enfrentar a fome no município por causa da seca.”

Mário Oswaldo diz que já fez um pedido de socorro ao governo do estado e espera da Defesa Civil estadual o envio de cestas básicas. Curiosamente, o antigo nome da cidade era Brejo das Almas. O termo brejo é sinônimo de lugar úmido. A cidade também já foi a “capital do alho” e o produto era cultivado nos terrenos onde existia fartura de água. Mas, hoje, as plantações de alho desapareceram com os verdadeiros brejos e quase todos os rios e córregos do município pararam de correr.

As sucessivas estiagens, somadas à degradação ambiental, provocam também a redução da água no lençol freático, problema que se agrava no Norte do estado. O problema é verificado na localidade de Campo Grande, na zona rural de Francisco Sá. As cerca de 20 famílias da comunidade recebiam água encanada em casa, mas as torneiras estão secas há seis meses, quando o poço que abastecia o lugarejo secou completamente.

Os moradores de Campo Grande  (distante 35 quilômetros da área urbana) estão recebendo água de caminhão-pipa da prefeitura uma vez por semana, mas como a quantidade nos tambores nas casas não é suficiente para uma semana, o caminhão-pipa enche uma caixa d’água do antigo sistema de abastecimento do arraial. Os moradores vão até o local, recorrendo ao velho esquema “lata d’água na cabeça”. É o que faz Helenice Santos Batista, de 42 anos, mãe de dois filhos. “Busco água umas 20 vezes por dia.” Ela caminha em torno de 200 metros de sua casa até a caixa d’água reabastecida pelo caminhão-pipa. Helenice conta que também carrega lata d’água na cabeça para a mãe. “Minha mãe é idosa e não aguenta carregar peso”, justifica, acrescentando: “A vida aqui está sendo muito sofrida. Não quero continuar nessa vida não. Ninguém consegue viver sem água”.

Outra moradora de Campo Grande, Erlaine Azevedo Fernandes, de 22, também reclama que está sendo obrigada a carregar um balde d’água na cabeça várias vezes por dia. “É muito complicado viver sem água. Com a falta de água nos banheiros, o pessoal daqui tem que fazer as necessidades no mato”, relata. “Estamos vivendo aqui uma verdadeira calamidade. É uma situação muito precária”, completa.

A Prefeitura de Francisco Sá informou que já perfurou um outro poço tubular para atender à comunidade de Campo Grande, mas ainda não conseguiu equipar o poço por causa da demora do processo de licitação.

Destruição O diretor técnico da Associação dos Municípios da Área Mineira da Sudene (Amams), Raphael Cassio Mota, afirma que, neste ano, os efeitos nefastos da seca no Norte do estado estão sendo ainda mais devastadores. “Tivemos três anos seguidos de seca. Depois disso, esperávamos boa quantidade de chuva. Mas a ‘virada das chuvas’ não veio e a situação complicou mais ainda”, afirma.

Segundo Mota, a quantidade pluviométrica registrada no Norte de Minas no ano chuvoso 2016/2017 não chegou a 60% da média histórica da região. O resultado foram as perdas de quase 100% das plantações de milho e feijão, destruição das pastagens, secamento de centenas de rios e córregos e o agravamento da crise hídrica.

Dos 79 municípios em situação de emergência devido à seca, reconhecida pela Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Cedec), 55 estão no Norte de Minas. A Associação de Municípios encaminhou documento ao Ministério da Integração Nacional solicitando ajuda da Defesa Civil nacional.

RAIO-X DA SECA

  • Minas Gerais tem 79 municípios em estado de emergência por causa da seca, quase todos no Norte de Minas e no Vale do Jequitinhonha


Municípios com problemas de abastecimento na área urbana no Norte de Minas:
Bocaiuva, Catuti, Cristália, Francisco Sá, Guaraciama, Ibiracatu, Lontra, Mamonas, Mato Verde, Monte Azul, Montes Claros, Pai Pedro, Pintópolis, Taiobeiras e Urucuia

População atingida pela falta de água na zona rural do Norte de Minas:
120 mil pessoas

Número pode dobrar com a quantidade de pessoas atingidas na área urbana

146 caminhões-pipas em  circulação na região 

Fonte: Cedec e Amams



O drama de uma cidade sem água


Historicamente, repete-se o noticiário de moradores de comunidades rurais do Norte Minas atendidas por caminhões-pipas por causa da seca. Mas, agora, o problema passou a ser enfrentado também por moradores da área urbana, tendo em vista a diminuição do volume ou completo secamento de barragens, rios que abasteciam as cidades. A situação também é agravada pelo secamento de poços tubulares.

De acordo com a Amams, devido à falta de chuvas, 14 cidades do Norte de Minas estão enfrentando dificuldades no abastecimento na área urbana. O flagelo é enfrentado em Ibiracatu. Conforme a prefeitura, os moradores estão sendo atendidos com a água “apanhada” no município vizinho de São João da Ponte (50 quilômetros de distância), também em estado de emergência.

A água é transportada em caminhões-pipa e armazenada no reservatório do sistema de abastecimento da cidade, onde é tratada e enviada para casas, em sistema de rodízio, feito pela Copasa.  “Mas, em lugares mais altos, a água só chega uma vez por semana”, informa o prefeito de Ibiracatu, José Amador Mendes da Silva (PT). “Todos os nossos rios, córregos e nascentes secaram”, relata, acrescentando que a vazão de poços tubulares do município também diminuiu muito.

Barragem do Rio Juramento (Sistema Verde Grande) em Montes Claros está com 36,15% de sua capacidade(foto: Ponciano Neto/Divulgação)
Barragem do Rio Juramento (Sistema Verde Grande) em Montes Claros está com 36,15% de sua capacidade (foto: Ponciano Neto/Divulgação)

O prefeito de Ibiracatu diz que, além da falta d’água, as sucessivas secas arrasaram a economia do município.Segundo ele, o sol forte destruiu 100% das pequenas plantações de milho e feijão, espalhando desemprego e miséria na zona rural. “Com a falta de chuvas, a  produção de espécies nativas, como o pequi e o araticum, caiu 50%. O rebanho bovino diminuiu 70%, pois não tem pasto.”

Com o agravamento da situação, o município passou a enfrentar um rápido crescimento do êxodo rural, com os moradores batendo na porta da prefeitura em busca de ajuda. “Atendo muitas pessoas todos os dias. De cada 10 moradores que recebo, oito pedem emprego, dizendo que se não tiver alguma ajuda da prefeitura vão embora para outro lugar porque não conseguem  viver aqui mais diante desta seca brava”, descreve o chefe do Executivo.

No município de Guaraciama (4,9 mil habitantes), informou a Amams, a prefeitura teve que “arrendar” um poço tubular de uma propriedade particular para captar água para atender a população, pois o manancial onde era feita a captação para o abastecimento da cidade secou.

ALTERNÂNCIA A população de Montes Claros, principal polo do Norte de Minas, enfrenta racionamento desde meados do ano passado. Atualmente, a população recebe água em casa em dias alternados. O “rodízio” é por causa da redução do volume da barragem do Rio Juramento (Sistema Rio Verde), que abastece 70% da cidade. Atualmente, a barragem do Rio Juramento está com 36,15% de sua capacidade. No mesmo período de 2016, o reservatório estava com 59,8% de sua capacidade, informa o técnico em meio ambiente José Ponciano Neto, responsável pela gestão da barragem.

Em nota, a Copasa informou que, além do “rodízio” no abastecimento, vem realizando “campanhas educativas sobre o uso consciente da água. A companhia anuncia o “incremento na oferta de água bruta por meio da perfuração e interligação de 30 poços profundos ao sistema existente”.


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