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Estado de Minas

Ajuda leva meses para chegar às cidades em emergência; em Minas, são 119

Problemas que vão da chuva à seca, passando pela saúde, deixam a vida em estado de emergência em diferentes cidades


postado em 09/04/2017 06:00 / atualizado em 09/04/2017 09:58


Sentada à porta de uma pequena casa, Maria da Conceição Ferreira Marques, de 38 anos, observa as máquinas e homens limpando as ruas do distrito de Nicolândia, em Resplendor, no Vale do Rio Doce, enquanto vigia o feijão cozinhando. O que ela vê são as primeiras ações de reconstrução, quatro meses depois de a comunidade ser arrasada por uma tromba d’água, que, além da destruição, deixou cinco mortos. Mesmo decretando situação de emergência, que teoricamente iria acelerar a reconstrução do lugar, a burocracia atrasa o repasse de recursos e, consequentemente, o início de obras.

(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)

Enquanto aguardam o dinheiro, famílias do distrito pedem socorro. Eles convivem com esgoto a céu aberto, aumento de doenças, falta de moradia, e até mesmo falta de lazer, pois o campo de futebol ficou prejudicado. Em Minas, outros 118 municípios também pediram ajuda dos governos estadual e federal para enfrentar problemas de saúde, estragos da chuva e da seca e que vivem situações parecidas com a enfrentada em Nicolândia.

No estado, foram três os motivos que mudaram a rotina de 119 municípios em 2017 e os colocaram em uma lista à espera de reconhecimento federal da situação de emergência. A principal razão foi o surto de febre amarela, que já tem somente neste ano 1.124 casos notificados, 140 mortes confirmadas e outras 64 em investigação. Por essa razão, 62 municípios foram afetados. Outros 44 sofrem os impactos da seca e da estiagem prolongada este ano e 13 viram a destruição chegar com chuvas intensas. Nessas cidades, as perdas humanas, sociais, econômicas ou ambientais as tornaram incapazes de lidar sozinhas com o tamanho do desafio.

(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)

RANKING De acordo com o balanço do Ministério da Integração Nacional, no Brasil, são 850 municípios com reconhecimento federal por situação de emergência ou calamidade pública. No ranking nacional, Minas ocupa o terceiro lugar em número de cidades que solicitaram apoio federal. Fica atrás da Bahia, que tem 215 municípios em situação de emergência, e do Ceará, com 137.


No caso da pequena Nicolândia, atingida por uma tromba d’água em 19 de novembro, a força da enchente destruiu aproximadamente 90 casas e deixou cinco mortos. Entre as vítimas estava Maria Soares Ferreira, de 58, mãe de Maria da Conceição. Ela estava dentro de casa com o marido, Hermínio Gomes, de 64, que também morreu durante o temporal, quando foi arrastada pela água. O corpo nunca foi encontrado. Outras três pessoas morreram: Hildo Damasceno, de 73, que era cadeirante, Rita de Fátima Rufino, de 42, e o marido dela, Roberto Carlos Rufino, de 46.

Maria da Conceição morava na casa ao lado da mãe. Os dois imóveis foram destruídos. “Hoje, estou morando em uma pequena casa cedida por um amigo, ainda dormindo em um colchão. Sempre ouvimos promessa de refazer as casas, mas nada acontece. Tem só quatro dias que começaram a limpeza das ruas”, desabafa. Além dela, ao menos outras 90 famílias aguardam um novo imóvel.

(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)

A limpeza da rua está sendo feita por um caminhão-pipa. Enquanto joga água, moradores da cidade, com pás e enxadas, puxam a terra vermelha e o barro que há quatro meses se acumula nas vias e calçadas. Tratores também retiraram o entulho que resta no local. Mesmo assim, as ações ainda são insuficientes para restabelecer a situação da comunidade.

Josimar Alves dos Anjos, de 46, é morador da cidade e ajuda na limpeza. Mas convive, desde a tragédia, com o risco de pegar doenças na porta de casa. “O esgoto está a céu aberto, isso vai fazer mal para a nossa saúde. Para você ter uma ideia, nunca tivemos casos de doenças relacionadas ao mosquito Aedes aegypti. Mas, neste ano, quatro moradores da mesma rua que eu tiveram dengue e chikungunya. Tem um monte de carros aqui que podem servir de criadouros para o mosquito”, aponta.

(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)

ALUGUEL SOCIAL A principal reclamação dos moradores é em relação às casas que desabaram. “São 88 casas totalmente destruídas. Dizem que o dinheiro do aluguel social já chegou, mas nada foi repassado”, afirma Valdir Matias, de 58. Cansadas de esperar, famílias deixaram a comunidade onde cresceram. “Somente na minha rua, oito casas estão totalmente abandonadas. Os moradores se mudaram para Vitória e outras cidades da região”, comenta Valdemiro Mariano, de 60.

A diversão também ficou prejudicada. Na comunidade há um campo de futebol usado pelo time do distrito. Porém, com a enchente, o local ficou sem condições de jogo. “Era a diversão da comunidade. Vai começar um campeonato em maio, e estão querendo nos tirar por não ter um local para jogar. Isso é triste. Precisamos de um campo”, cobra Zé Carlos de Oliveira, o Zé Benedito, de 58.

A longa via-sacra


Por meio do decreto de situação de emergência, estados ou municípios podem ter acesso a recursos de apoio emergencial do governo federal em casos de desastres naturais. Mas, para que o Ministério da Integração Nacional possa auxiliá-los, é preciso que o ente federado solicite o reconhecimento à Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (Sedec). No requerimento, a autoridade deverá explicitar as razões do pedido. Na prática, a ajuda inclui socorro e assistência às vítimas, restabelecimento de serviços essenciais e trabalhos de reconstrução.

Mas nem sempre o decreto de emergência significa chegada imediata do socorro. Em Resplendor, por exemplo, o decreto é de novembro, pouco tempo depois de Nicolândia ser arrasada pela tromba d’água. Ainda assim, poucos recursos chegaram à cidade. Apenas R$ 58 mil referentes à limpeza foram liberados, além do aluguel social – autorizado apenas para metade dos moradores que perderam as casas, segundo a prefeitura.

BUROCRACIA Ainda falta o dinheiro para obras nas estradas e pontes e para a reconstrução das moradias. Nada disso tem prazo definido, de acordo com o prefeito Diogo Scarabelli Júnior (PP). “Nosso principal problema se chama burocracia. Tudo se atrasa muito por conta dela. Parece que é proposital.”
Além da situação de emergência, o município enfrenta calamidade financeira desde fevereiro. Tem uma dívida de R$ 4 milhões com o INSS, segundo a prefeitura. Essas situações estão prejudicando o investimento em vários setores da cidade. “Quando deslocamos nossos recursos para determinadas regiões, as outras áreas ficam sem atendimento e nosso recurso é pouco. O impacto, então, é muito grande”, concluiu o prefeito.

Um dos pontos que atrasam a liberação dos recursos, segundo Diogo Júnior, é a aprovação dos projetos. “A gente sabe que tem que ter várias situações ali para não fazer o negócio de qualquer maneira. No entanto, tem situações que parecem ser feitas para atrasar. É uma vírgula que fica fora da linha, eles voltam o projeto e mandam refazer. Então, essas idas e vindas atrasam”, diz.

O Ministério da Integração Nacional informou que Resplendor tem três processos de apoio emergencial em andamento em Brasília. De acordo com a pasta, o recurso para o aluguel social, no valor de R$ 73,5 mil, vai atender a 82 famílias e já está disponível para uso do município. A Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, informou, aguarda apenas o envio pela prefeitura dos dados bancários do cartão de pagamento da Defesa Civil para que a transferência seja feita. Também foi aprovada, segundo o ministério, a reconstrução de quatro pontes e três bueiros. “É importante ressaltar que esse apoio é complementar às ações do estado e do município e não contempla atendimento a emergência ou calamidade pública decorrente de situação financeira”, disse, em nota.

Já a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Cedec) informou que apoia os municípios com materiais de ajuda humanitária, auxilia o Executivo municipal no atendimento emergencial ao desastre e presta auxílio técnico no preenchimento das documentações necessárias para a homologação ou reconhecimento do decreto de situação de emergência ou estado de calamidade pública.


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