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Estado de Minas

Sem água, moradores de BH pagam por ar no cano

Com o aumento nos cortes de fornecimento, consumidor tende a ter mais prejuízo com o ar que toma conta da rede vazia e faz girar o hidrômetro, sendo cobrado no fim do mês


postado em 25/02/2015 06:00 / atualizado em 25/02/2015 07:15

Dona de salão no bairro caiçara, Nádia de Menezes vê torneira seca, mas medidor não para de girar(foto: Euler Júnior/EM/D.A Press)
Dona de salão no bairro caiçara, Nádia de Menezes vê torneira seca, mas medidor não para de girar (foto: Euler Júnior/EM/D.A Press)
Da torneira da empresária Nádia Regina Sales de Menezes, de 56 anos, a água praticamente não pinga mais durante o dia desde dezembro. Mas, mesmo com encanamento seco, o ponteiro do hidrômetro da casa onde funciona seu salão de beleza continua a girar e a registrar um consumo inexistente, como testemunhou a equipe do Estado de Minas. “Estou sem água e pagando pelo ar que vai sendo bombeado pelo encanamento da Copasa”, reclama. Como ela, que trabalha na Rua Atalaia, no Bairro Caiçara, Região Noroeste de Belo Horizonte, vários moradores de áreas afetadas por desabastecimento na capital perceberam que, mesmo faltando água para suas atividades, a despesa continua a ser registrada nos medidores devido à passagem de ar. A explicação para isso, segundo laudo do Ministério Público e a avaliação de especialistas, é que, quando o fornecimento é interrompido, a rede de distribuição é preenchida por ar e esse volume é empurrado quando o fornecimento retorna, movimentando o sensor de registro de consumo .

Nesses casos, a recomendação é de que sejam instalados eliminadores de ar para sanar o problema, embora as informações sobre o mecanismo, sua disponibilidade e eficácia sejam escassas. Essa situação pode ser constatada a partir dos próprios números fornecidos pela Copasa: somente em Belo Horizonte, até o mês passado eram quase 590 mil hidrômetros em operação. Porém, em todo o estado, a estatal instalou apenas 502 eliminadores desde 2007.
O pagamento de ar como se fosse água é uma situação que já ocorria quando havia interrupções de fornecimento para reparos nas redes, mas que se agravou com a crise hídrica, por dois motivos principais: os cortes ficaram mais frequentes – apenas nos dois primeiros meses do ano foram duas dezenas somente em BH – e a Copasa foi obrigada a reduzir a pressão de fornecimento, para reduzir perdas com vazamentos. “Com a pressão mais fraca, bairros mais altos e mais afastados acabam ficando sem abastecimento e o ar entra pela tubulação. Quando o fornecimento volta ou a água começa a ser bombeada, o ar é expulso da rede através de caixas d’água vazias e torneiras. O problema é que esse fluxo aciona o hidrômetro como se fosse água”, explica o engenheiro hidráulico e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Nilo de Oliveira Nascimento.

Por vezes a Copasa admitiu neste ano ter reduzido a pressão de sua rede, o que já deixou sem água sobretudo bairros afastados do ponto de fornecimento ou mais altos, como Castelo, Ouro Preto e Bandeirantes (Pampulha), Buritis (Oeste) e Caiçara (Noroeste). Segundo o especialista da UFMG, isso pode ter trazido prejuízo para quem não dispõe do eliminador que impede o ar de movimentar o hidrômetro. Mas, mesmo quem quis instalar o aparelho encontrou desinformação e continua a ter um consumo fantasma registrado. “A pressão da água aqui só melhora à noite e no início da manhã. Estou tendo de acordar mais cedo para me abastecer. Perguntei para um terceirizado da Copasa se podia instalar um eliminador de ar. Ele disse que tinha de ser um da concessionária”, relata o funcionário público Corjesus Estevão Vasconcelos, de 57 anos, também morador do Caiçara.

A polêmica do eliminador de ar já se arrasta por anos. Em 2006, a Copasa e o Ministério Público do estado firmaram um termo de ajustamento de conduta (TAC) no qual a empresa se comprometia a instalar e a vistoriar os eliminadores aferidos por laboratórios das universidades federais de Minas Gerais (UFMG) e de Itajubá (Unifei). Porém, a estatal, mesmo depois do acordo, divulgou comunicados pondo em xeque a eficiência dos mecanismos. O equipamento custa a partir de R$ 200 e sua aquisição, assim como a compra das conexões necessárias, fica a cargo dos clientes. O preço da instalação varia entre R$ 160 e R$ 315, dependendo do encanamento. A estatal cobra também pela vistoria da montagem, retirada ou substituição, em valores que podem variar de R$ 10 a R$ 1 mil, dependendo do caso. De acordo com os laudos recebidos pelo MP, os aparelhos chegam a ter eficiência de até 98% na eliminação de ar nos casos de esvaziamento dos dutos de água. Mas, no caso do ar que vem misturado à água fornecida, a eficácia foi considerada irrisória.

Questionada quanto a informações relativas ao equipamento, a Copasa informou que o laudo que atesta a validade de cada marca deve ser consultado no site do Ministério Público, no qual a informação não foi encontrada ontem. Isso apesar de a Recomendação 10 do Procon Estadual, de 2006, determinar textualmente “que a Copasa, através do seu sítio na internet e do Serviço de Atendimento ao Cliente, disponibilize e divulgue a informação relativa aos fabricantes e modelos de aparelhos registrados (…) que apresentaram o laudo emitido pelo Inmetro atestando que o modelo comercializado não interfere na medição do hidrômetro, como também o laudo emitido pela UFMG ou Unifei atestando a proficiência do aparelho”.

PREJUÍZO

Enquanto a água não volta a ser fornecida com regularidade e a empresária Nádia Menezes continua a pagar pelo ar em seu encanamento, o jeito foi encher com ajuda da vizinha dois barris, que ela usa para cuidar do cabelo das freguesas. “Estou tendo muitos prejuízos. Preciso desmarcar clientes e racionar. E, em vez de minha conta diminuir, parece que está é aumentando”, protesta.

O número de interrupções de fornecimento sob argumento de manutenção também aumentou, como mostrou levantamento do EM com base nos boletins oficiais da empresa. Em quatro anos, houve um crescimento de 118% na quantidade de interrupções do serviço em vários bairros de Belo Horizonte. Em 2011, foram 22, número que mais que dobrou no ano passado, passando a 48, e que tende a ser superado em breve: apenas nos dois primeiros meses de 2015, os cortes em BH comunicados pelo site Copasa Transparente já chegaram a 20.


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