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Estado de Minas

Lei não barra flanelinhas nas ruas de BH


postado em 13/07/2011 06:00 / atualizado em 13/07/2011 07:04

Na área hospitalar, guardador que domina um quarteirão inteiro, por ser considerado perigoso, cheira solvente e intimida condutores (foto: Beto Magalhães/EM/D.A Press)
Na área hospitalar, guardador que domina um quarteirão inteiro, por ser considerado perigoso, cheira solvente e intimida condutores (foto: Beto Magalhães/EM/D.A Press)


Eles não deixaram de ser os donos da rua. Pelo contrário. Apesar da expectativa de que as restrições do novo Código de Posturas de Belo Horizonte colocariam freio na ousadia dos flanelinhas, quase um ano depois da regulamentação da nova lei a constatação é de que eles não se intimidaram, lotearam alguns dos principais pontos do Centro da capital e até tabelaram a cobrança. Os cerca de 4,5 mil flanelinhas na cidade, 3 mil clandestinos, continuam desafiando a lei, revisada em 2010. Mais: os coletes de identificação, que chegaram a ser apontados como frágil maneira de diferenciar clandestinos dos ilegais, não são mais fornecidos, por um desentendimento entre a prefeitura e a entidade que diz representar o setor.

Em diferentes pontos da capital, o trocado para o café já tem preço de tabela: o valor pode chegar a R$ 10 ou ser convertido em dano ao carro, para quem se recusa a pagar. As tentativas de combater os achaques são ironizadas. Um clandestino que já foi preso duas vezes se gaba ao dizer que em ambas “voltou no mesmo dia” para a rua.

Segundo a prefeitura, a fiscalização não foi abandonada: de setembro de 2010 até o dia 8, foram 127 operações de fiscalização na Região Centro-Sul, principal alvo dos guardadores, feitas entre a Polícia Militar e agentes municipais. Nessas ações, 332 guardadores ilegais foram detidos. Apesar de o Código de Posturas prever multa de R$ 1,5 mil para aqueles que praticam a atividade ilegalmente no perímetro da Avenida do Contorno e de R$ 500 para os demais, o município não sabe informar quantos dos detidos pagaram o valor.

Há oito anos trabalhando na Região Hospitalar da cidade, o taxista J.C.F., que pede para ter o nome preservado por medo de represálias, conta que há cerca de um ano a atividade dos guardadores na área saiu do limite do bom senso. “A coisa está a cada dia pior. Eles tomaram conta de tudo. E não só cobram dos motoristas, mas fizeram daqui um ponto de drogas”, comenta. O motorista denuncia que muitos convertem o dinheiro que ganham – e não é pouco – em cocaína. “Cheiram pó o dia inteiro. Vendem folha de rotativo a R$ 5 e quem não compra está se arriscando a ter o carro arranhado. Eles ganham bem aqui, tanto é que, depois do ‘expediente’, voltam para casa de táxi”, conta, revoltado.

Nessa terça-feira, o Estado de Minas percorreu várias vias da Região Centro-Sul, onde a atividade ilegal é mais frequente e também onde deveria render multas mais caras. Na Rua dos Tupis, quatro homens tomam conta do quarteirão entre as ruas da Bahia e Espírito Santo. Um deles, mesmo com o crachá de credenciado, revela o esquema a um motorista: “Você deixa seu carro e R$ 12 por dia para eu trocar o rotativo. Se a PM passar, eu troco; se não, você perde a grana. É melhor do que estacionamento”. Na Tamóios, bem em frente à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego, eles também comandam o esquema. A ousadia é tão grande que eles se divertem ao perceber que são fotografados.

Mas os ilegais também metem medo. Na Rua dos Otoni, na Região Hospitalar, entre a Rua Ceará e a Avenida do Brasil, a equipe do EM foi ameaçada por um flanelinha que toma conta da rua sozinho, por ser considerado perigoso. Cheirando tíner, ele aborda motoristas na base da intimidação. Com ele, outros também inalam a droga à luz do dia e bem à vista de um guarda municipal. Embora não tome nenhuma providência contra o achacador, o agente ameaça multar o carro da reportagem parado em um posto desativado. Questionado, diz desconhecer flanelinhas ilegais na região e filosofa ao afirmar que o tíner é um problema social.

 

Cenas dos próximos capítulos

 

Os atritos de motoristas com flanelinhas nas ruas de Belo Horizonte são marcados por uma novela de esperanças frustradas. Desde 9 de abril do ano passado, quando entrou em vigor o novo Código de Posturas de Belo Horizonte, o Estado de Minas vem acompanhando a expectativa de que as mudanças na legislação municipal conseguissem conter a ação dos guardadores. Motoristas que apostavam na política de fiscalização mais intensa tiveram que aguardar até que o assunto fosse regulamentado, o que ocorreu em agosto.

Tiveram o primeiro sinal de que a batalha seria perdida com a constatação de que as alterações na lei toleravam os guardadores “legalizados”. Estes, com apenas uma autorização do poder público e um colete “à prova de fiscalização”, ganhavam permissão para continuar cobrando dos motoristas pelo uso do espaço das ruas, público em tese.

Restava a esperança de que um cerco aos guardadores clandestinos, que são maioria na cidade, reduzisse as frequentes queixas de achaques e ameaças, deixando-as restritas a poucos “maus profissionais”. Porém, dois meses depois da regulamentação do Código, no fim de setembro, o EM informava que nenhuma multa, uma das armas para combater os irregulares, havia sido aplicada na Região Centro-Sul da cidade, a mais vulnerável nesse aspecto.

Em março deste ano, nova reportagem mostrava que decisão do juiz Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, da Turma Recursal Criminal de BH, determinava que a profissão de lavador e guardador de carro poderia ser exercida apenas por profissionais devidamente registrados na Delegacia Regional do Trabalho, a atual Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE), e em locais previamente delimitados pelo município. Os infratores estariam sujeitos a pena de 15 dias a três meses de prisão ou multa.

Era uma nova esperança de combate à clandestinidade. Porém, a constatação de que flanelinhas irregulares seguem atuando diante da própria sede da Superintendência do Trabalho, no Centro de BH, diminui as esperanças dos motoristas de um dia ver respeitado seu direito de ir e vir pela capital sem pagar por isso.

 

 


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