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Estado de Minas CRISE SANITÁRIA E ECONÔMICA

Com flexibilização da quarentena, desemprego bate novo recorde

Fechamento de empresas na pandemia pressionou a taxa de desocupação a 14,4%, pior resultado desde 2012; agora, trabalhadores voltam a buscar vagas. São 13,8 milhões na fila no trimestre encerrado em agosto


31/10/2020 04:00 - atualizado 31/10/2020 07:28

(foto: Fotos: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
(foto: Fotos: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)

"Preciso de um emprego para ajudar minha mãe e estou orando para conseguir"

Alice da Cruz Rodrigues, estudante, de 17 anos


O desemprego no Brasil chegou ao seu pior nível dos últimos nove anos. O país convive com 13,8 milhões de pessoas procurando trabalho, representadas numa taxa recorde de desocupação de 14,4% no trimestre encerrado em agosto, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, divulgada nesta sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

É a maior proporção já verificada no histórico do levantamento, iniciado em 2012. Na comparação com o mesmo período de junho a agosto de 2019, houve aumento de 2,6 pontos percentuais. Em Minas Gerais, a taxa estimada pelo IBGE para agosto é de 12,3%, correspondendo a 1,260 milhão de desempregados.

Especialistas em mercado de trabalho consideram que o novo recorde de desempregados no Brasil está associado à flexibilização do isolamento social que o país adotou para conter a proliferação do novo coronavírus, ao fechamento de empresas durante a pandemia e à proximidade do término, anunciado para dezembro pelo governo federal, do auxílio emergencial.

O Brasil já havia registrado taxa recorde de desemprego, de 12,9%, no trimestre de maio a julho. No último trimestre fechado em agosto pela Pnad Contínua, foram perdidos 4,3 milhões de empregos, sob o impacto da crise da saúde e da economia, com o Brasil entrando em recessão no segundo trimestre do ano, e embora o governo aposte na retomada do crescimento neste segundo semestre.

A analista do IBGE Adriana Beringuy destacou, ao apresentar os dados, que o aumento da desocupação no trimestre móvel de junho a agosto se deve ao número maior de pessoas procurando trabalho, à medida que o país gradualmente começa a abandonar as medidas de confinamento adotadas para conter o avanço da COVID-19. “No meio do ano, havia um isolamento maior, com maiores restrições no comércio, e muitas pessoas tinham parado de procurar trabalho por causa desse contexto. Agora, percebemos um maior movimento no mercado de trabalho em relação ao trimestre móvel encerrado em maio”, explica.

A queda da taxa de participação, que saiu no trimestre móvel de março a maio de 56,8% e chegou a 54,7% no trimestre encerrado em agosto, levanta outras razões para o aumento na taxa de desemprego. É o que aponta Mário Rodarte, economista e professor de economia e demografia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “A taxa de desemprego subiu, mas eu me permito discordar de certos analistas que dizem que ocorreria aumento de pessoas procurando trabalho pela redução do nível de isolamento. A taxa de pessoas na força de trabalho caiu, então está diminuindo a quantidade de pessoas procurando trabalho também”, disse o especialista.

O nível de ocupação foi de 46,8%, também o mais baixo da série histórica, com queda de 2,7 pontos percentuais ante o trimestre anterior (49,5%), quando, pela primeira vez na história da pesquisa, o índice ficou abaixo de 50%. No mesmo período, o número de empregados com carteira assinada caiu 6,5%, chegando a 29,1 milhões de pessoas, o menor contingente da série. Trata-se de retração de 2 milhões de pessoas com carteira assinada.

"Tentei por vários sites que divulgam vagas e não consigo. Está muito difícil"

Laís de Sousa Alves Dias, auxiliar de escritório, desempregada


SEM MELHORA 

Na análise setorial da pesquisa por setor de atividade econômica, houve retração do nível de ocupação em quase todos as áreas. “Talvez o setor público, por estar menos afeito a essas mudanças de humores do mercado (financeiro), manteve-se. Mas houve redução muito acentuada no número de trabalhadores com carteira”, destaca Rodarte. A população ocupada da indústria caiu 3,9%, perdendo 427 mil trabalhadores, enquanto comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas tiveram retração de 4,7%, ou menos 754 mil pessoas.

“Tivemos também retração da categoria de empregadores em 10%. Pode ser falência de empresas ou fechamento”, analisa o professor da UFMG. “Uma queda também dos trabalhadores por conta própria, em especial sem CNPJ, que deve ser de muitos trabalhadores que trabalham para o público”, acrescenta Rodarte.

O especialista ressalta ainda a queda da massa de rendimentos do trabalho na análise anual dos dados da Pnad Contínua, com retração de 5,7%, segundo sua análise. “Isso é indicativo de que a economia anda numa espiral de decrescimento”, comenta Mário Rodarte.

As últimas projeções do governo federal indicam para 2020 contração de 4,7% da produção de bens e serviços medida pelo Produto Interno Bruto (PIB) e crescimento de 3,2% em 2021. O Fundo Monetário Internacional (FMI) estima retração do PIB da América Latina e do Caribe de 8,1% neste ano. “Infelizmente, na minha análise, não estou conseguindo ver cenário de melhora”, lamenta o economista.

"A pandemia fez muita coisa fechar. Não sei como será meu futuro"

Gabriel de Menezes Oliveira, estudante em estágio, 25 anos


DURA REALIDADE

Indicadores do mercado de trabalho no Brasil

Taxa de desocupação
Jun/jul/ago de 2019 11,8%
Mar/abr/mai de 2020 12,9%
Jun/jul/ago de 2020 14,4%

Desempregados
Jun/jul/ago de 2019 12,565 milhões
Mar/abr/mai de 2020 12,710 milhões
Jun/jul/ago de 2020 13,794 milhões

Empregados
Jun/jul/ago de 2019 62,796 milhões
Mar/abr/mai de 2020 57,608 milhões
Jun/jul/ago de 2020 54,293 milhões

Trabalhadores com carteira no setor privado
Jun/jul/ago de 2020 29,067 milhões

Trabalhadores sem carteira no setor privado
Jun/jul/ago de 2020 8,755 milhões

Trabalhadores por conta própria
Jun/jul/ago de 2020 21,521 milhões

Trabalhadores domésticos
Jun/jul/ago de 2020 4,559 milhões

Empregados no setor público
Jun/jul/ago de 2020 11,912 milhões

Fonte: IBGE

Jovens são os mais sacrificados

A dificuldade das pessoas na busca por trabalho se agrava com a falta de oportunidades de recolocção. Houve dispensa de muitos trabalhadores por causa das incertezas impostas pela pandemia da COVID-19. O economista Mário Rodarte, professor da UFMG, acredita que, para os mais recém-chegados ao mercado de trabalho, a tendência é ainda mais sombria. “Os jovens, em especial, são geralmente os mais afetados nesses períodos de crise”, afirmou.

Em Belo Horizonte, não é difícil encontrá-los nas ruas, com carteira de trabalho e currículo nas mãos, em busca de conquistar as poucas vagas disponíveis. A estudante Alice da Cruz Rodrigues, de 17 anos, está há dois meses procurando emprego, já que a mãe também ficou desempregada durante a pandemia. “Lá em casa somos eu, minha mãe e meus dois irmãos mais novos. Então, tenho que trabalhar para o nosso sustento. Preciso de um emprego para ajudar minha mãe a comprar as coisas e estou orando para conseguir ainda este ano”, disse.

A crise econômica também afetou Laís de Sousa Alves Dias, de 21. Ela trabalhava como auxiliar de escritório em um consultório oftalmológico e se lembra de quando foi demitida, em 28 de março. “Dispensaram muitas pessoas por causa do coronavírus porque o paciente ficava muito próximo da gente, então era perigoso”, conta.

Hoje, ela mora com o marido, que também está sem trabalho. Com isso, a dificuldade só aumenta para manter a casa e o curso de administração. “Tentei por vários sites que divulgam as vagas e não consigo. É muito complicado porque o emprego não é só aprendizado. Trabalhar é uma forma de sobrevivência. Se não trabalho, não tenho como pagar as contas. Está bastante difícil”, lamenta Laís.

Na contramão da estatística e com uma pitada de esperança, Gabriel de Menezes Oliveira, de 25, conseguiu estágio na semana passada. Estudante de biblioteconomia na UFMG, ele estava desempregado desde 2016. “Fiquei muito feliz por conseguir esta oportunidade porque complementa a minha renda e me deixa mais tranquilo”, disse o jovem, repleto de incertezas com a previsão de formatura para 2021. “Vou me formar ano que vem e tenho muito medo de não conseguir emprego porque estamos em um momento ruim para todo mundo. A pandemia fez muita coisa fechar. Não sei como será meu futuro”, comenta Gabriel.  


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