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Estado de Minas RECUPERAÇÃO

Coronavírus divide indústria mineira no processo de reação

Enquanto setores ligados ao consumo tiveram que parar totalmente e retomar agora, exportadores e setor de alimentos seguiram operando


postado em 02/06/2020 04:00 / atualizado em 02/06/2020 07:24

A fábrica da Fiat em Betim ficou 48 dias paralisada. Quando o trabalho voltou, os funcionários passaram a cumprir uma série de protocolos preventivos(foto: Leo Lira/Divulgação FCA)
A fábrica da Fiat em Betim ficou 48 dias paralisada. Quando o trabalho voltou, os funcionários passaram a cumprir uma série de protocolos preventivos (foto: Leo Lira/Divulgação FCA)
A indústria enfrenta a pandemia do novo coronavírus dividida. Considerada atividade essencial em Minas Gerais, as empresas e segmentos do setor não passam pela crise da mesma forma. E depois que o pior passar, o desemprego deve provocar uma inevitável queda no consumo, o que significa uma retomada lenta e nada uniforme. A alternativa é se reinventar: adaptar a produção para máscaras e respiradores, e tornar o produto competitivo no mercado interno, além de apostar na crescente importância nas vendas pela internet.

Ao contrário de outros setores, a indústria não parou com a pandemia. Os funcionários de fábricas e plantas continuaram trabalhando, ou voltaram a trabalhar mais cedo, com uma série de restrições sanitárias. O governo de Minas definiu a atividade como essencial enquanto durar o estado de calamidade pública no estado, na Deliberação nº 17, de 22 de março. O texto estabelece que continuem funcionando: indústria de fármacos, cadeia industrial de alimentos, atividades agroindustriais e setores industriais.
 
O governo estadual também considera a indústria como essencial no programa Minas Consciente, que tem como objetivo orientar as decisões das prefeituras sobre a reabertura da economia. Todos os segmentos da indústria que constam no protocolo fazem parte da chamada onda verde, que reúne os setores que não devem ser interrompidos durante a crise de saúde.

Mesmo podendo funcionar, a indústria tem resultados mistos durante a crise do coronavírus. Para a gerente de estudos econômicos da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Daniela Britto, é possível separar os impactos da COVID-19 no setor em dois grupos. Segundo a pesquisadora, as indústrias de transformação sofrem mais com o isolamento social. “Dependem do comércio para vender. O fabricante de veículos precisa das concessionárias abertas. Como o comércio está fechado, houve queda na produção, uso da capacidade instalada e faturamento”, analisa Daniela Britto.

Por outro lado, a pesquisadora aponta que a indústria de exportação – como a mineração e de celulose – não está sendo tão impactada pela pandemia. “Grande parte da produção vai para o mercado asiático, que já saiu da fase mais crítica. A de processamento de alimentos também, que trabalha com um produto de primeira necessidade”, explica. Daniela Brito afirma que no início da pandemia a indústria alimentícia foi muito demandada, ampliando produção e faturamento, porque muitos estocaram comida com medo de desabastecimento.

Diferença


O modo como duas grandes empresas instaladas em Minas passam pela crise mostra a divisão de resultados que o coronavírus está provocando na indústria. A fábrica da Fiat em Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, suspendeu a produção em 23 de março e retomou as atividades em 11 de maio. A empresa usou esse tempo para traçar um plano de medidas sanitárias e capacitação dos funcionários para frear a disseminação do coronavírus nas instalações.
 
A Fiat projeta queda de 40% nas vendas em 2020 em comparação com 2019(foto: Leo Lira/Divulgação FCA)
A Fiat projeta queda de 40% nas vendas em 2020 em comparação com 2019 (foto: Leo Lira/Divulgação FCA)

 
Como por mais de um mês a fábrica não funcionou, o trabalho está voltando aos poucos e a demanda por carros está caindo, a previsão é que as vendas caiam 70% no segundo trimestre deste ano em comparação com o mesmo período de 2019. No ano, a Fiat espera uma queda de 40% em relação ao ano passado.

Já a Pif Paf, indústria de processamento de carnes e alimentos, foi menos afetada pela pandemia. Em Minas Gerais, A empresa tem fábricas em Visconde do Rio Branco, Patrocínio, Leopoldina e Viçosa. Foi preciso adaptar o processo de produção e reforçar as medidas de segurança nas instalações. Com isso, o custo subiu, mas o volume produzido se manteve. A marca também viu os clientes e a distribuição dos alimentos no mercado se modificarem. Fechados, os bares e restaurantes deixaram de ser os principais compradores, mas a demanda continuou.
 
“As pessoas não vão deixar de comer. Estamos direcionando a produção de acordo com a demanda, passando a atender mais mercados. Acreditamos que se mantendo essa situação vamos sair sem muitas cicatrizes dessa crise”, diz o gerente de relações institucionais da Pif Paf, Cláudio Almeida Faria.

Porém, parte do setor não deve continuar sendo poupada por muito tempo. De acordo com Daniela Britto, toda a indústria vai ser impactada pela queda no consumo nos próximos meses, até depois da pior fase da pandemia. O desemprego crescente e a perda de renda fazem as pessoas deixarem de comprar. Com isso, cai a confiança dos empresários, que adiam os investimentos, enquanto não contam com acesso a crédito. “Todos os setores serão impactados, em menor ou maior grau”, conclui.


Reação lenta


Com esse cenário econômico, ainda marcado pela incerteza, a Fiemg prevê que a indústria deve demorar a se recuperar da crise: o nível de produtividade pré-pandemia deve ser atingido novamente entre o final de 2021 e o início de 2022. Em pesquisa elaborada em abril, a entidade projeta que a produtividade da indústria deve cair 5,3% em Minas e 4,9% no Brasil este ano. De acordo com projeção, o setor voltaria a crescer em 2021, com alta de 9,5% no estado e 4,3% no país.
 
A recessão de 2015 e 2016, que faz efeito até hoje, é um fator que deve contribuir para a dificuldade da recuperação. Segundo a pesquisa, o Brasil se recuperou em média em 16 trimestres das recessões dos anos 80 e 90. Depois de 20 trimestres desde o auge da última recessão, o país ainda não voltou a crescer consideravelmente.

Diante do cenário difícil, os empresários têm a oportunidade de reinventar os negócios para passar pela crise garantindo algum ganho. De acordo com Daniela Britto, para sobreviver no curto prazo, muitas empresas estão fabricando “produtos de crise”, como máscaras e respiradores. Para o longo prazo, a pesquisadora da Fiemg espera que o mercado interno se fortaleça com a “substituição das importações”. Com o dólar valorizado em relação ao real, entre outros fatores, o país deve importar menos, e o produto nacional deve ter mais espaço no mercado.

Uma realidade que a indústria terá que lidar no mundo pós-pandemia serão os novos hábitos de consumo. Essa é a avaliação do presidente da FCA na América Latina, Antonio Filosa. “Haverá, de um lado, consumidores afetados pela crise econômica que terão que adiar a compra do carro. Mas haverá muitas pessoas que vão se sentir inseguras em meio a multidões e vão preferir, por exemplo, deslocar-se a bordo de um carro próprio”, avalia o executivo.
 
Filosa aposta que as vendas online ganharão ainda mais força durante a retomada, mas ela deve demorar. Para ele, o mercado automotivo brasileiro só voltará ao nível pré-crise em três anos. O presidente da FCA defende que as empresas do segmento tenham acesso a crédito, para enfrentar um cenário até então inédito de redução drástica das receitas.

O gerente de relações institucionais da Pif Paf, Cláudio Almeida Faria, também acredita que as vendas online vão crescer depois que o pior da crise do coronavírus passar e são uma alternativa para as empresas. O executivo acredita que assim como toda a indústria não passa pelo momento da mesma forma, também não vai ser recuperar igualmente.
 
"Vai muito da essencialidade do produto. Mas falar alguma coisa sem ter noção do quanto isso vai durar é complicado”, afirma. Faria pontua que é preciso tomar cuidados com a evolução epidemiológica de cada estado ao se pensar na retomada. “Minas hoje é um dos mais controlados, mas não podemos nos tornar o São Paulo de amanhã”, diz. 
 
Os frigoríficos da Pif Paf reforçaram os cuidados sanitários. Se as medidas antes serviam para proteger o produto, agora protegem também os funcionários(foto: Divulgação/Pif Paf)
Os frigoríficos da Pif Paf reforçaram os cuidados sanitários. Se as medidas antes serviam para proteger o produto, agora protegem também os funcionários (foto: Divulgação/Pif Paf)
 

Segurança


A indústria mineira está funcionando com mudanças para garantir a segurança dos funcionários nas instalações enquanto a pandemia não é controlada, enquanto tenta manter postos de trabalho. Para reativar a planta em Betim, a Fiat organizou uma estrutura de prevenção dentro da fábrica e nos ônibus que transportam os funcionários, que circulam com capacidade reduzida. A equipe administrativa foi colocada em trabalho remoto.
 
A limpeza foi reforçada e câmeras monitoram a temperatura corporal dos colaboradores, que usam máscaras e têm acesso a frascos de álcool em gel, de acordo com a empresa. A efetividade das medidas é constantemente reavaliada. Na frente trabalhista, a Fiat afirma que as demissões “são o último recurso”. A companhia informa que celebrou acordos que flexibilizaram a jornada de trabalho e preservaram entre 80% e 90% dos salários.

A Pif Paf reforçou os cuidados com a proteção dos funcionários, limpeza das instalações e reformulou a lógica de trabalho para prevenir o avanço do coronavírus dentro das indústrias e outras instalações. “Os frigoríficos já têm uma prevenção rigorosa à contaminação. Com proteção dos funcionários e barreiras sanitárias. Isso é projetado para proteger o produto, mas reforçamos todos esses conceitos. É o pior lugar para o vírus se instalar”, explica Cláudio Almeida Faria.
 
Segundo o gerente, os cuidados continuarão sendo tomados depois que o auge da pandemia passar. Além disso, os funcionários de grupo de risco foram afastados e os da parte administrativa estão em home office. A empresa afirma que não demitiu nenhum dos nove mil funcionários durante a crise. Pelo contrário, precisou contratar para suprir falta de pessoal em certas áreas.


*Estagiário sob supervisão do subeditor Marcílio de Moraes


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