Em um dia de pânico no mercado financeiro global, o dólar aproximou-se de R$ 4,80, mesmo com o Banco Central (BC) vendendo a moeda norte-americana de suas reservas internacionais. A bolsa de valores brasileira, a B3, caiu 12,17%, chegando a ter os negócios interrompidos durante a manhã, o chamado circuit breaker. O índice Ibovespa, das ações mais negociadas, fechou o dia com recuo de 12,17%, aos 86.067 pontos, retornando aos níveis de dezembro de 2018. Essa foi a maior queda para um único dia desde setembro de 1998, quando a Rússia declarou moratória.
Ainda pela manhã, a B3 chegou a ter as negociações interrompidas por 30 minutos porque o Ibovespa tinha caído mais de 10%. O chamado circuit breaker é um mecanismo acionado quando o índice cai mais que determinado nível. A última vez em que a bolsa tinha tido as negociações interrompidas foi em maio de 2017, após a divulgação de conversas do então presidente Michel Temer com o empresário Joesley Batista, dono da JBS.
Os mercados de todo o planeta, que nas últimas semanas têm atravessado momentos de instabilidade por causa dos receios de uma recessão global provocada pelo coronavírus, enfrentaram um dia de pânico com a disputa de preços entre Arábia Saudita e Rússia em torno do petróleo.
Membro da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), a Arábia Saudita aumentou a produção de petróleo depois que o governo de Vladimir Putin decidiu não aderir a um acordo para reduzir a extração em todo o mundo. O aumento de produção num cenário de queda mundial de demanda por causa do coronavírus fez a cotação do barril de petróleo iniciar o dia com queda de mais de 30%. Por volta das 18h, o barril do tipo Brent era vendido a US$ 33,41, com queda de 26,2%.
Para o Brasil, a queda no barril de petróleo afeta as ações da Petrobras, a maior empresa brasileira capitalizada na bolsa. Os papéis ordinários (com direito a voto em assembleia de acionistas) da companhia fecharam o dia com queda de 29,68%. Os papéis preferenciais (que dão preferência na distribuição de dividendos) caíram 29,7%. Segundo a própria Petrobras, a extração do petróleo na camada pré-sal só é viável quando a cotação do barril está acima de US$ 45.
Consequências A queda nas cotações do barril de petróleo traz outras consequências para a economia brasileira. Caso os preços baixos se mantenham, a companhia repassará a queda do preço internacional para a gasolina e o diesel. Se, por um lado, a queda beneficia os consumidores; por outro, prejudica o setor de etanol, que perde competitividade.
Os preços mais baixos diminuem a arrecadação de royalties do petróleo e a arrecadação de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o principal tributo estadual, num momento em que diversos estados atravessam dificuldades financeiras.
Em polvorosa
Nos Estados Unidos, Wall Street também sofreu ontem seu maior tombo em 11 anos, arrastada pela queda do petróleo e a crise mundial do coronavírus. Segundo resultados provisórios de fechamento, o indicador Dow Jones Industrial Average caiu 7,83% a 23.389,46 pontos, com queda de 2 mil pontos, enquanto o índice tecnológico Nasdaq desabou 7,29% a 7.950,68 unidades e o S&P 500 das principais empresas na bolsa caiu 7,64% a 2.745,34 pontos.
No Brasil, após o circuit breaker, os índices da Bolsa de Valores de São Paulo (B3) permaneceram em queda. O funcionamento já havia começado ontem com baixa de mais de 8%. Na Ásia, as Bolsas da China, seguindo o mau humor generalizado dos mercados financeiros, fecharam em queda. O principal índice acionário do país, o Xangai Composite, teve recuo de 3,01%. Na Europa, os mercados abriram a manhã de ontem com queda generalizada. Tudo sob os mesmos motivos: crise de preços do petróleo e o novo coronavírus.
O que fazer agora?
Rafael Panonko
Economista-chefe da Toro Investimentos
A semana começou agitada nos mercados financeiros. Ontem, assistimos à queda de mais de 10% da bolsa brasileira e ao acionamento do circuit break pela B3 – um mecanismo de proteção que paralisa temporariamente os negócios. O cenário de oscilações não é exclusividade do Brasil. Os mercados mundo afora seguem pessimistas com os impactos do coronavírus na economia mundial e, agora, um possível guerra de preços entre os grandes produtores de petróleo.
A reunião dos membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) com a Rússia sobre a produção de petróleo não caminhou para um acordo, o que desencadeou em um corte nos preços do petróleo na Arábia Saudita, que anunciou também a decisão de aumentar a produção. O preço, que já vinha em queda por conta do novo coronavírus, caiu ainda mais após esse fato, chegando a se desvalorizar mais de 30%, ao preço de 31 dólares o barril.
O investidor deve estar se perguntando: o que fazer agora? Para tentar acalmar os ânimos, compartilho algumas dicas importantes:
1º) Se os seus objetivos são de longo prazo e você não pretende fazer novas compras, porque está olhando as oscilações a todo momento? Isso vai servir apenas para lhe deixar mais preocupado. Acompanhe a bolsa no fechamento da semana, e mexa nas suas posições se as empresas que compõem a sua carteira perderam os fundamentos que justificaram a compra.
2º) Se você já tem uma posição e está querendo comprar mais, tenha calma e muita cautela. Os impactos do momento atual ainda são incertos, portanto, podemos ter novas quedas pela frente. Uma estratégia é começar a comprar aos poucos.
3 º) “Não invisto na bolsa ainda e quero começar”. Enxergo o momento atual como uma excelente oportunidade. Comece montando sua carteira com setores com menor exposição ao cenário externo, exemplo, setor de educação, energia elétrica, bancos dentre outros. Mas lembre-se do que falei anteriormente: a bolsa pode continuar caindo.
FMI pede ação coordenada
Os governos devem aplicar “uma resposta internacional coordenada” para enfrentar o impacto econômico da expansão do novo coronavírus, disse ontem a economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), Gita Gopinath. Muitos países adotaram políticas para alimentar a confiança, enquanto a epidemia gera nervosismo nos mercados e temores de que uma interrupção das redes de fornecimento lastrem a atividade econômica, mas há poucos sinais de uma resposta coordenada.
Devido à grande perturbação das economias, os consumidores e as empresas, Gopinath afirmou que os responsáveis pelas políticas precisarão implementar “medidas importantes dirigidas em matéria fiscal, monetária e para os mercados financeiros para ajudar as famílias e os negócios afetados”.
“É evidente o argumento de que deve haver uma resposta internacional coordenada” para fazer frente à epidemia. Em novembro de 2008, em plena crise financeira mundial, o G20, grupo das nações ricas e emergentes, acordou cortes dos juros e se comprometeu a manter as políticas de estímulo o tempo que fosse necessário para sustentar a economia.
Intervenções no dólar continuam
Brasília – Apesar do discurso de que o dólar é flutuante, o Banco Central (BC) avisou que vai intervir o quanto for necessário para que o mercado de câmbio volte a atuar de forma regular no Brasil. O recado foi dado na manhã de ontem, quando o dólar, que já passou dos R$ 4,50 na semana passada por conta do avanço do novo coronavírus, chegou a R$ 4,75 em função da nova crise do petróleo.
“As intervenções têm sido pontuais, respondendo a eventos e disfuncionalidades específicas, mas podem durar o tempo que for necessário para o retorno do regular funcionamento do mercado de câmbio”, afirmou o diretor de política monetária do BC, Bruno Serra Fernandes, na apresentação que levou como apoio para uma palestra sobre investimentos que foi promovida pela Bloomberg em São Paulo.
A apresentação de Fernandes assegura que a autoridade monetária “diagnosticou as condições necessárias para atuação” diante da crise financeira que foi instalada pelo avanço do coronavírus no mundo e levou o real a uma “tendência de depreciação acelerada, semelhante a períodos de crise aguda”. A depreciação, por sinal, se acentuou na manhã de ontem, depois do fracasso da negociação da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), que derrubou em mais de 30% o preço do barril do petróleo.
“Essa é uma conjuntura que permite ao BCB dispor de todos os seus instrumentos, no volume que entender apropriado, para promover o regular funcionamento do mercado de câmbio”, acrescenta o documento elaborado por Fernandes, acrescentando que a atual posição cambial líquida do BC, de US$ 330 bilhões, é “o maior nível histórico, quando medido em relação ao PIB, em torno de 20%”. “A posição cambial do BCB é um seguro robusto contra choques externos”, garante.
Pouco depois que essa apresentação foi disponibilizada à imprensa pelo Banco Central, a autoridade monetária vendeu R$ 3 bilhões em reservas para tentar regular o câmbio. A venda foi três vezes maior do que o anunciado inicialmente e vem na esteira de uma série de leilões extraordinários de swap cambial. A medida, porém, não teve sucesso em conter a alta do dólar, que segue avançando devido ao temor do mercado em relação ao avanço do coronavírus pelo mundo e, sobretudo, em relação a uma possível guerra de preços do petróleo entre a Arábia Saudita e a Rússia.