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Estado de Minas

Confira 11 questões para entender como a blockchain pode impactar estruturas econômicas e sociais

Em entrevista ao Estado de Minas, a especialista Tatiana Revoredo explica por que a tecnologia deveria ser uma pauta de governos, empresas e cidadãos comuns


postado em 15/02/2020 04:00 / atualizado em 21/02/2020 12:16

A advogada Tatiane Revoredo é referência no Brasil quando o assunto é blockchain(foto: Divulgação)
A advogada Tatiane Revoredo é referência no Brasil quando o assunto é blockchain (foto: Divulgação)
A advogada paulista Tatiana Revoredo, 45 anos, é referência no Brasil quando o assunto é blockchain, a tecnologia por trás da criptomoeda bitcoin que vem revolucionando diferentes áreas da economia, da alimentícia ao de registro de identidades. Especialista em blockchain pela Universidade de Oxford e pelo Instituto de Tevnologia de Massachusetts (MIT), hoje representa no Brasil o Observatório Europeu do Direito das Novas Tecnologias, é membro-fundadora da Oxford Blockchain Foundation e professora no Instituto de Pesquisa e Ensino Insper. 

Tatiana acaba de lançar o livro “Blockchain - Tudo o que você precisa saber” (editora The Global Strategy), uma obra que traz a realidade e o potencial da tecnologia que pode alterar drasticamente as estruturas econômicas e sociais pré-existentes. Na entrevista a seguir, ela defende porque deveria ser uma pauta de governos, empresas e cidadãos comuns. 

1. Quando você iniciou sua jornada no universo blockchain? 

Me interessei há 5 anos, quando me deparei com o assunto em um aplicativo de investimentos onde havia um fórum de discussão sobre Bitcoin. Como gosto muito de escrever, e acabo publicando meus textos na internet, um parlamentar europeu leu um artigo meu sobre regulação de novas tecnologias e sobre economia da web e entrou em contato comigo. Daí, passei a contribuir com estudos sobre o impacto das novas tecnologias, e participar de palestras e eventos, como a primeira conferência global sobre “contratos inteligentes”. Dentre as conquistas em minha trajetória, destaco o convite do Parlamento Europeu para participar de discussões sobre aplicações e regulação Blockchain e de Criptoativos, no In
tercontinental Blockchain Conference, bem como o convite da Câmara dos Deputados do Brasil para falar sobre a tecnologia blockchain na audiência pública referente ao PL 2303/2015.

2. O que é blockchain, o que são criptomoedas e como estão relacionadas?

Em 31 de outubro de 2008, quando Satoshi Nakamoto publicou o artigo “Bitcoin: a Peer-to-Peer Cash System”, ele revelou seu desejo de criar um sistema monetário descentralizado que possibilitasse transferir dinheiro eletrônico (que ele chamou de bitcoin) de uma pessoa para outra, sem intermediários. Quando o primeiro bloco de Bitcoins foi validado em 3 de janeiro de 2009, nasceu a primeira blockchain. Então, quanto à relação entre criptomoedas e blockchain, pode-se dizer que blockchain é a tecnologia subjacente que possibilita que as transações com criptoativos (criptomoedas e tokens) aconteçam.

3. Blockchain vai muito além do investimentos financeiros, não é mesmo?

Após o surgimento da Blockchain Bitcoin, outras blockchains surgiram para possibilitar, não só transações monetárias, mas qualquer tipo de transação de valor - comércio de energia renovável, uma transação imobiliária, a compra e venda de uma obra de arte, etc. A blockchain é, portanto, uma GPT – “General Purpose Technology” (tecnologia de uso geral, na tradução livre para o português), isto é, uma tecnologia de núcleo que têm o potencial de alterar drasticamente as sociedades por meio de seu impacto nas estruturas econômicas e sociais pré-existentes. Outros exemplos de tecnologias de núcleo são o motor a vapor, a eletricidade, automóvel, computador, internet, medicina e inteli
gência artificial. Devido a qualidades como transparência, auditabilidade, imutabilidade e segurança, a tecnologia blockchain trouxe um veículo sem precedentes para transferência de valor, verificação e registro de transações online.

4. Para você quais são os principais impactos positivos para a sociedade?

Em um mundo digital onde tudo é mutável, para mim, os principais impactos estão em estabelecer confiança, manter a verdade com segurança - o que, num ambiente virtual, são qualidades que valem ouro. Como as estruturas Blockchain possibilitam a desintermediação das relações (sem os validadores tradicionais de confiança) e em tempo real, realmente agora podemos pensar em uma economia global.

5. Como está o Brasil em relação a outros mercados? 

Embora haja muitas iniciativas de peso no Brasil, inclusive no setor público, fato é que o foco aqui gira muito em função das discussões sobre criptoativos. Num comparativo com países mais desenvolvidos, a diferença que enxergo são as dificuldades encontradas no Brasil em razão das estruturas de mercado e o ambiente regulatório. Em mercados mais desenvolvidos como Singapura, Coreia do Sul, e Suíça, a vantagem é que esses países se beneficiam, por exemplo, das ferramentas legislativas criadas para trazer vantagens competitivas e mão de obra qualificada, além de incentivo a startups e empresas (que atuam no ecossistema blockchain) para estabelecer operações nesses países, atraindo inovaçã
o e novos negócios.

As organizações estão agora menos preocupadas com a tecnologia blockchain em si, começam a se concentrar nos modelos de negócios que ela pode inovar. Minha percepção é que, no Brasil, as pessoas estão buscando compreender como blockchain pode impactar seu dia a dia e como essa tecnologia tem mudado a maneira como determinado setor faz negócios.

6. Cite uma aplicação que já podemos observar no dia a dia do cidadão comum?

Como exemplo, hoje, blockchain tem impulsionado a venda de alimentos frescos, promovendo a rastreabilidade e a visibilidade na cadeia de suprimentos alimentícia. Propiciando precisão de dados como fonte do alimento, qualidade, temperatura de trânsito e frescor, aplicações blockchain possibilitam maior tranquilidade e dão mais confiança ao consumidor que agora pode identificar a origem dos alimentos e visualizar seu trajeto desde o plantio até a gôndola do supermercado.
 
7. E o que está para acontecer em curto e longo prazos?

Soluções blockchain de identidade digital estão sendo desenvolvidas onde o usuário poderá controlar não apenas sua identidade, mas também os dados associados a ela, o que é conhecido como identidade autossoberana (Self Sovereign Identity – SSI). Sem um meio de identificarmos uns aos outros e às nossas posses, dificilmente poderíamos construir grandes nações ou criar mercados globais. Isto é, para que uma sociedade e economia prosperem, poucas coisas são tão importantes como a identidade. Cada vez que mais pessoas, dispositivos e dados pessoais associados migram para o mundo on-line, nossas identidades tornam-se o elemento fundamental desse novo ambiente digital. Estamos aprendendo, contudo,
 o que significa “identidade em um mundo digital”. Ainda estamos desenvolvendo políticas e práticas relacionados à identidade digital de forma a identificar indivíduos sem infringir suas liberdades ou causar danos a eles.

8. Quais setores podem ser beneficiados? 

A tecnologia blockchain, conquanto não seja a solução para todas as ineficiências dos processos existentes, mesmo porque não é possível automatizar completamente todas das transações, pode ser um importante diferencial competitivo em diversos setores. Isto porque pode reduzir desperdício e custos, aumentar a transparência e permitir gestão e fluxo de dados mais eficiente, melhorar o processo de pesquisa de informações, trazer mais agilidade em processos, possibilitar maior interoperabilidade entre os sistemas tecnológicos utilizados pelos diferentes participantes em determinada indústria. As estruturas blockchain já têm sido utilizadas por diversas indústrias com sucesso, como cadeia de s
uprimentos, logística, energia, saúde, mercado imobiliário, publicidade, agronegócio, só para citar alguns.

9. Como isso impacta a economia, especialmente a brasileira?

É a aplicação de tecnologia de ponta, somada ao empreendedorismo e abordagens inovadoras na criação de entrega de bens e serviços, que viabiliza o crescimento e a geração de receitas em qualquer país, e no Brasil não é diferente. Por isso, uma agenda para entender e usar este tipo de tecnologia como ferramenta para o crescimento econômico e melhoria do bem-estar dos cidadãos é essencial e urgente. Modelos de negócios que envolvam o gerenciamento de grandes quantidades de informações, transações, e têm alta demanda por segurança, eficiência e transparência serão os mais beneficiados pela tecnologia blockchain.

10. Como a sociedade pode tirar proveito da "popularização" das criptomoedas?

Para responder a esta pergunta, é importante considerarmos que os principais atores mundiais de tecnologia (conhecidos como Big Techs) e os próprios países (como a China), estão promovendo iniciativas de moeda digital. Essas novas iniciativas estão forçando líderes globais em todos os lugares a perguntar qual será o papel do dinheiro digital na próxima década e, em última análise, as mudanças que estão ocorrendo no cenário político e econômico mais amplo irão remodelar o futuro do sistema monetário internacional. Eu acredito que estamos caminhando para uma moeda global, em um futuro não muito distante. E os benefícios econômicos de uma moeda digital universal para a sociedade são sign
ificativos e beneficiariam, sem dúvida, os cidadãos; mas também, beneficiariam os interesses privados que contribuírem para o seu desenvolvimento.

11. Esse é um assunto para qualquer cidadão? 

Blockchains impactarão profundamente as relações de governança, modos de vida, modelos corporativos tradicionais, instituições em escala global e a sociedade como um todo. Por isso, este é um assunto que deve interessar a qualquer cidadão. Muitos obstáculos precisam ser superados para a plena adoção desta nova tecnologia, e como qualquer nova ferramenta, a atitude humana e organizacional representa uma barreira alta, incluindo: padrões (a falta de padronização entre plataformas blockchain tornam as decisões de TI desafiadoras), organização e comportamento humano, confidencialidade, custo de processamento, obstáculos legais, legado de infraestrutura e falta de mão de obra qualificada.




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