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Estado de Minas

Empresários defendem engajamento da sociedade para 'mudar o Brasil'

Evento em São Paulo discutiu soluções para mudar o Brasil em diversas áreas, da educação às pesquisas científicas, passando pelas ações de cidadania e pela redução das desigualdades


postado em 28/08/2018 06:00 / atualizado em 28/08/2018 07:42

Os empresários discutiram medidas urgentes para resolver problemas antigos do país(foto: Mario Castello/Divulgacao ()
Os empresários discutiram medidas urgentes para resolver problemas antigos do país (foto: Mario Castello/Divulgacao ()

São Paulo – Um evento com empresários, executivos, representantes do meio acadêmico e científico, além de integrantes de ONGs e do Judiciário, discutiu na manhã dessa segunda-feira (27), em São Paulo, caminhos para estancar e reverter o processo de deterioração do país nas áreas econômica e social, por meio da participação democrática e da apresentação de propostas para colocar as mudanças em prática.

O encontro “Você Muda o Brasil” foi dividido em três painéis e teve a participação de representantes do empresariado, como Pedro Passos (co-fundador da Natura), Rubens Menin (presidente do conselho de administração da MRV), Luiza Trajano (presidente do conselho de administração do Magazine Luiza) e Paulo Kakinoff (presidente da Gol), de nomes ligados à educação, à ciência e à ciência política, além de Luciano Huck (apresentador e empresário) e da ministra Carmén Lúcia (presidente do Supremo Tribunal Federal).

No primeiro painel, “A urgência do futuro”, coordenado por Menin, os participantes alertaram para a necessidade de tirar os diagnósticos do papel e se avançar com medidas práticas para resgatar o país. Para o fundador da MRV, um bom ponto de partida para essas mudanças é reconhecer os problemas, os desafios e o ponto de inflexão pelo qual passam o país e a sociedade.

O empresário contou que, em uma conversa recente com um investidor estrangeiro, ouviu que apenas três países têm como características uma população superior a 200 milhões de habitantes e uma área acima de 8 milhões de metros quadrados. “Estados Unidos e China já foram. Agora é a vez do Brasil. Mas antes temos de tentar entender por que o Brasil não foi até agora.” Uma das respostas, avaliou Menin, foi a omissão do empresariado diante da necessidade de pressionar por mudanças.

Passos, da Natura, detalhou as reformas que deveriam ser colocadas em prática no novo governo, que assume em 1º de janeiro de 2019. Aos cerca de 600 participantes, o empresário, que hoje integra o conselho de administração da companhia, foi direto ao diagnóstico: “A situação é difícil, com um cenário econômico de muita fragilidade. Temos um Executivo sem legitimidade, um Legislativo distante da sociedade e um Judiciário que faz decisões de difícil entendimento para a população. Essa situação causa um desalento muito alarmante.”

A saída para o novo governo, avaliou Passos, é se concentrar na prestação de serviços essenciais, como educação, saúde e segurança, e deixar que a iniciativa privada avance para atender a demanda de outras áreas. “Esses são os principais anseios da sociedade. Mas primeiro será preciso enfrentar a balburdia das contas públicas. O cidadão não vai aceitar ações populistas. Sem reformas, ficaremos fora do jogo. Não teremos alternativas para a população, que vem envelhecendo por questões demográficas e que sabe que hoje não há perspectiva para que seja oferecido um aumento de renda e um bem-estar razoável’, apontou.

Outro tema do painel foi a importância da participação da sociedade na política. A cada quatro anos, disse Mônica Sodré, diretora-executiva da Rede de Ação Política para Sustentabilidade (RAPS), são eleitos 70.488 políticos no país. “O senso comum é que são todos ruins. No entanto, nossa sociedade não se envolve muito nesse tipo de debate para levar agenda de futuro adiante. Precisamos de uma cidadania ativa para mudar esse país”, alertou.

A tecnologia pode ser uma das formas de participar da política, segundo Natalia Mazotte, diretora executiva da Open Knowledge Brasil, que conta com um aplicativo que permite monitorar a prestação de contas da Câmara dos Deputados. Agora, a organização se prepara para lançar uma ferramenta para acompanhar informações dos 100 maiores municípios do país. Será a oportunidade, por exemplo, para receber alertas sobre audiências públicas e aumentar a participação da população nas decisões políticas.

Outro ponto de fragilidade apontado nas discussões foi a falta de apoio às pesquisas. Mayana Zatz, geneticista, explicou que nos Estados Unidos é possível receber uma encomenda de reagentes um dia depois da solicitação. No Brasil, por conta dos trâmites burocráticos, esse processo pode levar seis meses. Com esse tipo de dificuldade burocrática e a falta de investimento público e privado, nos últimos anos muitos profissionais têm deixado o país, o que terá impacto na produção científica do país.

No painel “Educação e ética para a transformação do país”, os debatedores citaram uma série de exemplos de como a iniciativa privada e as ONGs têm exercido um papel relevante para melhorar a qualidade do ensino e a gestão das escolas públicas brasileiras. O professor, escritor e filósofo Mario Sérgio Cortella apontou o distanciamento entre a economia e a qualidade de vida dos brasileiros, lembrando que o Brasil está entre as dez maiores economias do mundo, mas no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNAD), órgão da ONUN, o país fica apenas com a 66ª colocação. “Como podemos nos considerar uma das economias mais ricas do mundo?”, provocou.

O terceiro painel teve como tema a “sociedade civil protagonista do desenvolvimento”. Luiza Trajano, que também faz parte do movimento Mulheres do Brasil, foi uma das mais indignadas. A empresária criticou a postura polarizadora nas discussões políticas, entre direita e esquerda. Na sua avaliação, é preciso que a sociedade civil pressione para que prevaleça um outro tipo de política do ganha-ganha, “com todos ganhando, não só um lado”. “Como pode aceitarmos que o Ministério da Saúde tenha sete ministros em quatro anos? Acredito que a participação das pessoas poderá levar às mudanças necessárias”, afirmou a empreendedora.

Poesia e provocação


São Paulo – No palco, ao microfone, a ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), iniciou sua fala com a citação do trecho acima de “O poeta come amendoim”, do escritor paulista Mário de Andrade. No poema, ele defende que a emancipação cultural da nação acontecerá à medida em que o homem se abrasileirar, criar uma identidade nacional.

A citação foi feita diante de uma plateia de cerca de 600 pessoas, a maioria de representantes da iniciativa privada, que participaram do evento “Você muda o Brasil”, promovido por um grupo de empresários e entidades, em um centro empresarial na zona sul de São Paulo na manhã de ontem. O movimento prega a participação da sociedade, ao lado de empresários, na pressão por políticas que melhorem as atuais condições do país.

A ministra foi a convidada especial e encerrou o evento. Ela aproveitou a oportunidade de falar para uma parcela significativa do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro e fazer algumas críticas, provocações e até um desabafo. Por exemplo, ao citar uma conversa que teve um dia antes, quando disse: “O que faço é Direito, não é milagre. O que querem de mim é milagre, às vezes.”

Ao citar Mario de Andrade, a ministra, que deixa a presidência do STF em setembro, alertou para a necessidade de a sociedade pressionar por mudanças nas diferentes esferas de poder, e lembrou que “o Brasil não é Brasília, não é o Supremo”. Citou ainda o parágrafo único do artigo 1º da Constituição de 1988, como quem tenta provocar uma reação entre os presentes: “Todo o poder emana do povo. Nos Estados democráticos, o povo sabe disso há muito tempo. Se der certo, todos damos certo. Se der errado, todos damos errado”.

Ao falar dos 30 anos da Constituição e da oportunidade de participação democrática, a ministra lembrou do tempo em que era estudante de Direito. Para ler decretos secretos durante o período ditatorial, tinha de se esconder no banheiro da faculdade. “Hoje vivemos na democracia, mas só lê quem aprendeu a ler”, afirmou, referindo-se às consequências das desigualdades sociais, como a dificuldade de acesso à educação.

Durante sua apresentação, a presidente do Supremo insistiu em provocar o inconformismo dos ouvintes e o envolvimento não apenas em problemas particulares, mas da sociedade. Por exemplo, quando afirmou que “não adianta ser um cidadão se os outros não conseguem se libertar das más condições”.

Em outro momento da apresentação, Cármen Lúcia alertou para os conflitos entre brasileiros e venezuelanos que deixaram seu país em direção a Roraima. “É uma ilusão achar que vai dar errado para alguém em Pacaraima (RR) e que minha vida vai ser boa só porque eu não tenho conhecimento disso”, alfinetou a ministra.

Ao final, a magistrada citou mais um poeta, dessa vez o português Manuel Alegre.

“Mas há sempre uma candeia
Dentro da própria desgraça
Há sempre alguém que semeia
Canções no vento que passa.
Mesmo na noite mais triste
Em tempo de servidão
Há sempre alguém que resiste
Há sempre alguém que diz não.”


Trecho de Praça da Canção, de Manuel Alegre

“Brasil amado não porque seja minha pátria, 
Pátria é acaso de migrações e do pão-nosso onde Deus der... 
Brasil que eu amo porque é o ritmo no meu braço aventuroso, 
O gosto dos meus descansos, 
O balanço das minhas cantigas amores e danças. 
Brasil que eu sou porque é a minha expressão muito engraçada”

Trecho do poema O poeta come amendoim, de Mario de Andrade


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