
As projeções dos técnicos se baseiam no cenário atual. Do lado da oferta, os níveis dos reservatórios estão em queda, sobretudo no Nordeste, onde atingiram preocupantes 21% da capacidade total (veja quadro). Pelo viés da demanda, o consumo de energia, que vinha em retração por conta da crise econômica, aumentou 1,2% em julho deste ano ante igual mês de 2015. Se essa tendência permanecer, em pleno período seco, o governo não terá como evitar o acionamento das usinas termelétricas de custo elevado.
O sistema de bandeiras tarifárias existe desde 2015 para sinalizar aos consumidores as condições de geração de eletricidade. Quando o quadro hidrológico é favorável, apenas térmicas com custo até R$ 211 por megawatt/hora (MWh) são despachadas (autorizadas a gerar energia para o sistema interligado) e a cor é verde, sem acréscimos na conta. Se for necessário acionar usinas com custo de até R$ 422 por MWh, a bandeira passa a amarela. A vermelha tem duas categorias: R$ 3 adicionais por cada 100 kWh consumidos quando o MWh de energia termelétrica chega a R$ 610; e cobrança extra de R$ 4,50 quando o custo passa desse valor.
O presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales, explicou que cada usina tem um tipo de combustível e é isso que afeta o custo. “As de gás natural são as mais eficientes e mais baratas. As de óleo diesel são mais caras. O sistema precisa de todas para ter segurança, mas elas são acionadas conforme o custo e a necessidade”, disse.
Em 2015, os brasileiros desembolsaram quase R$ 15 bilhões a mais pela energia elétrica só por conta da bandeira vermelha, que permaneceu em vigor quase o ano inteiro, e as tarifas dispararam 50% em média. Sales ressaltou, contudo, que a falta de chuvas foi responsável apenas por 56% do tarifaço. “Erros e decisões de governo e a cobrança de encargos embutidos na Conta de Desenvolvimento Energético também contribuíram”, calculou.
Na opinião de Marco Afonso, especialista em energia da consultoria de infraestrutura CGI, a bandeira amarela deve entrar em setembro. “O nível dos reservatórios está muito baixo no Nordeste e preocupante no Sudeste, que é a região que mais demanda energia no país, sobretudo com consumo industrial, mas também residencial, pois engloba os estados mais populosos. E a incidência de chuvas até o fim do ano é baixa. Além disso, o consumo começou a subir”, justificou.
Riscos
Segundo Afonso, há riscos para 2017. “E não é baixo. Algo em torno de 30%. Mas não falo ameaça de apagão, e sim de redistribuição de energia. Ou seja, de bandeira vermelha e por muito tempo. Deve começar a vigorar em outubro, se não chover, e permanecer por vários meses”, projetou. Ele lembrou que o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD), que é o custo da energia no mercado à vista, está subindo. “Isso aponta estimativa de maior demanda, sem oferta. Hoje, está em R$ 124 o MWh e a projeção é passar para R$ 200. Um aumento de mais de 60% num período curto”, calculou.
A retomada da confiança deve provocar aumento na demanda por energia, no entender de Guilherme Schmidt, especialista do escritório L.O. Baptista-SVMFA. “Há interesse de estrangeiros nos ativos do país e deve se intensificar depois da definição do impeachment. Aí, a perspectiva é de consumo maior de energia, mais produção”, disse. Ele assinalou que só não houve apagão no ano passado porque o país estava em crise e com consumo, sobretudo industrial, muito baixo.
“A bandeira amarela é uma possibilidade no mês que vem. Há uma preocupação com a retomada do crescimento. O país precisa de mais oferta e há projetos atrasados”, pontuou Schmidt. Sales, do Acende Brasil, explicou que o atraso médio para os projetos ficarem prontos é de sete meses na geração e de 14 meses na transmissão, o que retarda o aumento da oferta. “Tamanho atraso só não causou dano maior porque houve arrefecimento da demanda. Agora, a expectativa é de que o país volte a crescer”, disse.
Expansão
A expansão prevista de geração elétrica para este ano, de 7.223 megawatts (MW), é superior ao que foi adicionado de energia nova em anos anteriores, garantiu o Ministério das Minas e Energia. “O Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) aponta que, até agosto, a expansão do sistema totalizou 5,4 mil megawatts (MW) de capacidade instalada de geração e 3.024 km de linhas de transmissão. Em comunicado, o CMSE avaliou que o risco de qualquer deficit de energia em 2016 é igual a 0,0%, para as regiões Sudeste/Centro-Oeste e Nordeste”, disse o ministério.

